07 Setembro 2024
Os mais fortes, os mais resistentes ou talvez os mais sortudos permaneceram à tona. Durante três dias e três noites, agarrados ao pequeno casco virado, à deriva no Estreito da Sicília, entre a Líbia e Lampedusa.
A reportagem é de Laura Anello, publicada por La Stampa, 06-09-2024. A tradução é de Luisa Rabolini.
Sete, todos homens, foram os sobreviventes de um barco que tinha vinte e oito migrantes a bordo, incluindo três crianças e algumas mulheres. São vinte e um, vinte e um corpos que se perderam, vinte e um corpos que deslizaram e foram engolidos pelo mar quando o casco virou. Ainda estão procurando por eles, procuraram até tarde da noite, com barcos de patrulha e uma aeronave, mas tudo o que resta deles no momento são as histórias dos sete sobreviventes resgatados pela Guarda Costeira que os interceptou por acaso em águas italianas, dez milhas a sudoeste de Lampedusa.
Os centros de resgate da Líbia, de Malta e da Tunísia também foram alertados. Um a um, os colocaram no inflável amarelo de resgate marítimo e, de lá, os levaram para um local seguro, o píer Favaloro de Lampedusa, que voltou a se encher de lágrimas. Alguns haviam perdido suas roupas, um homem foi transportado em uma cadeira de rodas. “Estão exaustos, em estado de choque, traumatizados, alguns deles com hipotermia devido à longa permanência na água, estão tenho dificuldade para falar”, disseram os socorristas do 118 e da policlínica da ilha que os examinaram e trataram. Mas vão sobreviver, apesar de que durante três dias não beberam nem comeram.
Estão agora no centro de acolhimento de Imbriacola, contando sua história para a equipe de assistência da Cruz Vermelha. “Partimos de Sabratah, na Líbia, em 1º de setembro”, contaram com um fio de voz, “mas depois de apenas um dia de navegação o barco virou e perdemos nossos celulares. Vimos nossos companheiros de viagem desaparecerem no mar sem poder fazer nada, sem poder chamar ninguém. Até mesmo três crianças”.
A promotoria pública de Agrigento, que abriu mais uma investigação sobre mais uma tragédia, delegou a apuração dos fatos ao esquadrão móvel da sede da polícia de Agrigento. Será necessário descobrir quem são os desaparecidos, todos sírios e sudaneses, se há alguma relação de parentela com os sobreviventes e, acima de tudo, por que o barco virou, se pelas condições do mar ou por uma manobra errada.
E nessa ilha suspensa entre a África e a Europa, que já viu de tudo - desembarques, massacres, resgates, promessas, revoltas - os holofotes, que haviam se apagado depois de um verão de relativa tranquilidade, estão mais uma vez acesos.
Logo após o resgate dos sete sírios, o mesmo barco de patrulha da Guarda Costeira resgatou um barco de seis metros com dezenove egípcios, líbios, sírios e sudaneses a
bordo, também vindo de Sabratah. Na trágica roleta russa, eles conseguiram, contam ter pago 5.500 euros pela travessia até a Sicília. O mesmo valor, presumivelmente, pago por aqueles que foram engolidos pelo Mediterrâneo.
“Houve uma queda significativa nas chegadas de migrantes”, conta o prefeito de Lampedusa e Linosa, Filippo Mannino, ”e está claro que as políticas do governo estão funcionando. Mas é necessário que a Europa cuide daquilo que se fala há tanto tempo, ou seja, os canais humanitários para que essas pessoas possam viajar e chegar em segurança”.
Rosario Valastro, presidente da Cruz Vermelha Italiana, fez eco a ele: “Estamos atônitos diante de mais uma tragédia na costa de Lampedusa. A humanidade dos voluntários da Cruz Vermelha está dando conforto àqueles que, após momentos terríveis, chegaram às nossas costas. Com muita frequência, a viagem da esperança que leva mulheres, homens e crianças a fazer uma travessia em busca de uma vida digna é tragicamente interrompida”.
Como contraponto aos resgates da Guarda Costeira, ao rugido das aeronaves em busca dos desaparecidos, há a parada forçada do navio Sea Watch, obrigado pelas autoridades italianas a permanecer parado por vinte dias no porto de Civitavecchia. Punido por ter resgatado 289 pessoas sem ter recebido permissão das autoridades líbias, “quando”, protesta a ONG alemã, “o direito internacional não estipula que seja necessário receber autorização para poder socorrer pessoas em perigo no mar”. Mais uma vez estamos diante de uma ação que visa a atrapalhar os navios que realmente assumem a função que os próprios Estados ignoram: salvar pessoas e garantir o respeito aos direitos humanos fundamentais”.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Cemitério Mediterrâneo - Instituto Humanitas Unisinos - IHU