25 Junho 2024
“É mais fácil rir juntos do que sozinhos: a alegria abre ao compartilhamento e é o melhor antídoto contra o egoísmo e o individualismo. Rir também ajuda a quebrar as barreiras sociais, a criar conexões entre as pessoas. Permite-nos expressar emoções e pensamentos, ajudando a construir uma cultura partilhada e a criar espaços de liberdade" (14 de junho).
A reportagem é de Fabio Colagrande, publicada por L'Osservatore Romano, 20-06-2024. A tradução é de Luisa Rabolini.
“Nós, comediantes, sempre fomos filhos de um Deus menor. Portanto, que o Papa reconheça a utilidade da leveza é algo absolutamente inesperado. Sempre foi para mim, mas acredito que também para meus outros colegas". Passaram-se alguns dias desde a audiência de Francisco com os representantes do mundo do humor, que aconteceu no dia 14 de junho no Vaticano. Pela primeira vez na história da Igreja, o Pontífice acolheu no Palácio Apostólico mais de cem comediantes da Europa, América e Ásia, ressaltando que o seu talento “é um dom precioso” e que “a diversão lúdica e o riso são fundamentais para a vida humana." Ao telefone de Turim, sua cidade, Luciana “Lucianina” Littizzetto — atriz, apresentadora de rádio e televisão e escritora — no grupo italiano de comediantes presentes no Vaticano, comenta com sincera emoção aquele dia. “Nós, artistas, costumamos nos encontrar nos enterros... Mas desta vez estávamos nesse lugar maravilhoso, nessas salas decoradas por essa arte espetacular, nessa realidade eterna, imóvel. Estar ali, com a nossa ‘fanfarronice’, foi algo maravilhoso."
Foi também uma boa espera: a audiência começou às oito e meia da manhã porque o Papa deveria partir imediatamente depois para o G7. “Fizemos uma longa caminhada antes de chegar e já chegou a hora", explica. “Não é um problema para mim, que sou meio freira e acordo muito cedo! Mas a ideia de estar nesse lugar maravilhoso ao amanhecer, isso também foi algo único”, acrescenta. “E também estávamos todos muito emocionados por estar num lugar que não é o nosso. Não havia palco, não havia cortinas, não havia bastidores, só havia beleza".
Luciana Littizzetto não esperava esse reconhecimento por parte do Papa do papel daqueles que fazer rir. “A leveza – explica – é sempre considerada um pouco como estupidez, mas é muito útil para digerir a vida cotidiana, para lê-la de uma perspectiva inusitada. O que o comediante faz? Redimensiona, restabelece as proporções. Também ameniza um pouco os conflitos, tira sarro. E nesta realidade alguém que possa te dizer: ‘olha, tudo é relativo’, na minha opinião é útil”. "Acredito que Francisco queria nos agradecer justamente por isso”, conclui. “Além disso o riso é livre e a liberdade é um valor enorme hoje em dia."
O Papa recordou o papel dos humoristas na denúncia dos excessos de poder e em evidenciar os abusos.
Para Luciana Littizzetto, essa é uma tarefa que está ligada à escolha da linguagem. “Os comediantes devem se fazer ouvir, como também os sacerdotes. Então eles têm que falar a linguagem das pessoas e ajudá-las a entender as coisas." Se os sacerdotes “ajudam a reconhecer os valores não negociáveis", segundo a comediante, aos operadores de entretenimento cabe a missão de "evidenciar as incongruências do que nos acontece" para anular "esse contágio do ódio bestial. O ódio – afirma – é insuportável. Da mesma forma o mal-estar, as reclamações. Quanto mais você se lamenta e mais você se lamentará. Então é fundamental tentar desviar a atenção de tudo esse mal humor para vislumbrar pequenas faíscas de positividade, epifanias de beleza ou mesmo apenas a risada libertadora."
Francisco acrescentou que os comediantes ajudam a "quebrar as barreiras sociais", contribuem para criar solidariedade entre as pessoas. “Estou convencida de que o nosso trabalho é um antídoto para o peso deste mundo cheio de conflitos", explica Littizzetto. “Tinha a minha vizinha do casa, Dona Marisa, que infelizmente faleceu há alguns anos, que quando lhe perguntava como estava ela respondia: “Damos um jeito!”. E eu adorava! Porque nem sempre está tudo bem, mas você dá um jeito de alguma forma, certo?”. “Acredito que os comediantes – acrescenta – ajudam a relaxar um pouco para se revigorar e talvez até buscar um sentido", como recordou Francisco. “E, além disso, nos permitem uma forma de intimidade”, comenta a atriz.
“Gosto do Papa quando no final do Angelus diz: ‘Bom domingo e bom almoço!’. É ótimo, porque é uma coisa normal, mas também é um valor. Além disso, a oração de São Thomas More que li no final da audiência fala exatamente isto: “dê-me uma boa digestão e algo para digerir! Até as pequenas coisas do cotidiano ficam mais leves."
Aquela leitura pública da Oração do Bom Humor, conta Littizzetto, foi fora do programa. Quando o Papa Francisco, falando de improviso, destacou que os comediantes deveriam conhecer o texto, o Cardeal José Tolentino de Mendonça teve a ideia de pedir para a recitar em público justamente a ela, no final da cerimônia. “Eu também não esperava isso”, comenta. “Eu estava lá refletindo sobre as palavras do Papa e pensando em como é cansativo o seu trabalho, quantas mãos ele tem que apertar, infundido esperança, quando o cardeal chega e me pergunta se posso ler a oração."
“Fiquei com um nó na garganta. Imediatamente olhei para o tamanho das letras porque não tinha levado meus óculos!”. “E então li a oração tentando comunicar a minha emoção em nome de todos os meus colegas que a teriam lido como eu."
Luciana Littizzetto teve dois filhos adotivos com seu companheiro que já estão crescidos, a garota tem 29 anos e o rapaz 27. Pergunto-lhe se compartilhou com eles a emoção da audiência com o Papa “Cresceram numa comunidade maravilhosa perto de Pavia - explica-me - dirigida por uma consagrada e por um diácono e, portanto, tiveram uma educação religiosa como a minha. Por isso ficaram com um pouco de inveja do meu encontro com o Papa, gostariam de ter ido junto, mas não dava para levar a comitiva inteira! Mas no domingo estiveram aqui para almoçar e quiseram saber tudo em detalhes e ficaram felizes."
O telefonema chega ao fim. Pergunto a Littizzetto o que ela teria gostado de dizer ao Papa, para se despedir no final da audiência. “Eu teria perguntado quais eram seus sonhos quando criança, o que ele queria ser quando crescesse, porque ele me parece uma pessoa extremamente sensível. E depois eu o teria agradecido por este dia que nunca esquecerei." Nada mais? “Gostaria de dizer-lhe que prestasse atenção às freiras, porque são uma riqueza infinita. São mulheres e por isso ‘não desistem’, são sensíveis, generosas e devem ser mais reconhecidas nos seus talentos e no que podem fazer na Igreja”.