25 Janeiro 2024
Para o grande rabino da França, muito atento às relações judaico-cristãs, o diálogo entre as duas religiões é um pouco como uma relação conjugal, “a ser mantida sempre viva”.
A entrevista com Haïm Korsia é de Héloïse de Neuville, publicada por La Croix, 23-01-2024. A tradução é de Luisa Rabolini.
Quais são as expectativas dos judeus em relação aos cristãos hoje?
Esperamos a continuação e o aprofundamento do impulso profético do Concílio Vaticano II. Esse legado deve ser mantido vivo. Dois exemplos recentes mostram esse caminho: em fevereiro de 2021, houve um apelo extraordinário da Conferência Episcopal francesa contra o antissemitismo, com base na afirmação: “Lutar juntos contra o antissemitismo e o antijudaísmo é a base de toda fraternidade real”.
Em maio de 2023, os bispos da França publicaram um manual para “desconstruir o antijudaísmo cristão”, que listava vários mitos na origem da hostilidade cristã para com os judeus. Isso nunca havia sido feito pela instituição. Prova o quão necessário é sempre desconstruir e reconstruir, porque cada época apresenta novos desafios. A fraternidade é uma luta permanente, válida tanto dentro do cristianismo como do judaísmo, dado que os preconceitos também prosperam aqui.
Que tipo de preconceito persistente você observa entre os cristãos?
Vou lhe contar uma anedota recente que me foi contada pelo Arcebispo de Marselha. O card. Jean Marc Aveline tinha ido à Córsega para proferir uma conferência sobre as relações judaico-cristãs. No fim, uma senhorinha local se aproxima dele e diz: “Jesus era judeu, ok. José também, certamente também os Apóstolos. Mas Nossa Senhora, como é possível?!”. Depois de 7 de outubro, houve de parte das comunidades cristãs, dos testemunhos de participação na dor, alguns maravilhosos, e outros absolutamente insuportáveis. Houve relativizações, posições pró-palestinos em vez de simplesmente ser pró-paz. Houve reações mostrando que a ligação entre os judeus e o Estado de Israel continua difícil de ser compreendida por alguns. Em Estrasburgo, o silêncio de algumas instituições protestantes, depois do 7 de outubro, foi desconfortável para os judeus.
Quais são os ensinamentos do Vaticano II a serem cultivados?
Teologicamente, o Vaticano II estabeleceu definitivamente que a aliança que Deus concluiu com Israel é irrevogável e nunca será negada. Em outras palavras, de acordo com o dogma da Igreja católica, Deus não substituiu a sua antiga aliança por uma nova aliança. Ele manteve a primeira, e começou uma segunda. A Igreja, dessa forma, abandonou a teoria da substituição, segundo a qual Israel teria sido substituído pelo mundo cristão. É fundamental continuar a ensinar isso, porque o judaísmo, ou seja, nós, precisamos do cristianismo pela sua mensagem mais aberta, mas lembrando que tem suas raízes no judaísmo: o cristianismo é filho do judaísmo.
E nós, judeus, portanto, sempre temos a nossa missão no mundo. A Igreja católica encontrou uma maneira de acabar com o ensinamento do desprezo e passar ao ensinamento da estima, para usar a fórmula luminosa de Jules Isaac. É preciso manter essa relação viva, como faria um casal. Afinal, agora somos convidados a dialogar continuamente, sem por isso cair numa forma de sincretismo.
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“A fraternidade é uma luta permanente”. Entrevista com Haïm Korsia - Instituto Humanitas Unisinos - IHU