08 Novembro 2023
“Israel tem todo o direito de se defender. A questão está no como. E, por este caminho, geração após geração de crianças israelenses continuarão crescendo no medo. Enquanto seus irmãos palestinos crescerão no ódio”, escreve Manuel Castells, sociólogo espanhol, em artigo publicado por La Vanguardia, 04-11-2023. A tradução é do Cepat.
O medo e o ódio são as emoções humanas mais potentes. Estão unidas porque se retroalimentam. Quando se sente medo, o outro deixa de existir em si e se torna uma ameaça da qual é preciso se proteger e, se possível, destruir para estar seguro. A história da humanidade é marcada pela violência, enraizada no medo e alimentada pelo ódio.
Cada novo episódio dessa eterna tensão valida o sentimento e justifica a violência nas mentes dos sujeitos do conflito. Por isso, o conflito palestino-israelense persiste há 74 anos sem vias aparentes de solução. É claro que as estratégias geopolíticas de diversos atores agravam as contradições e as tornam cada vez mais insolúveis.
O sentimento de culpa dos vencedores da Segunda Guerra Mundial, e mais ainda dos perdedores, diante do horror de um Holocausto do qual foram vítimas seis milhões de judeus e pessoas estigmatizadas pelo nazismo (Franquismo-Divisão Azul, na Espanha) levou a uma solução neocolonial. Houve a expulsão dos árabes das terras que habitaram durante dois milênios para dar lugar aos judeus, que precisavam de uma pátria.
E quando os países árabes perderam a primeira guerra, não integraram os refugiados (os palestinos são o povo mais instruído e menos islamista entre os árabes), mas, ao contrário, foram mantidos em campos de refugiados onde cresceu o ódio. Desse modo, gestou-se o medo dos israelenses de que fossem lançados ao mar, conforme rezava a ideologia oficial de diversas ditaduras árabes.
Israel, com o apoio dos Estados Unidos, que se firmou um aliado permanente como guardião de nosso petróleo, tornou-se um país desenvolvido, com eleições, tecnologicamente avançado, potência militar, tolerando uma minoria árabe israelense como cidadãos de segunda classe. Israel agravou a sua própria situação ao bloquear a única solução possível: dois Estados que coexistam, garantidos pela comunidade internacional.
E a abertura de Rabin foi abortada pelos serviços de segurança israelenses, imbuídos pelo fascismo teocrático de uma parte dos políticos. Os mesmos serviços que estimularam o desenvolvimento do Hamas para dividir e enfraquecer o movimento palestino. Inclusive, com o financiamento, como informa Nicholas Kristof, no jornal New York Times, referindo-se a um recente pagamento de 1 bilhão de dólares de Netanyahu para o Hamas, através do Qatar.
Por isso, António Guterres apelou à compreensão, não à justificação, do ataque do Hamas como expressão do ódio acumulado nessa colônia de confinamento chamada Gaza, onde gerações cresceram em condições infra-humanas. Assim como fez o Papa.
Israel tem todo o direito de se defender. A questão está no como. E, por este caminho, geração após geração de crianças israelenses continuarão crescendo no medo. Enquanto seus irmãos palestinos crescerão no ódio. Tomara que a conferência de paz proposta por Pedro Sánchez incorpore organizações defensoras da paz, como a Comunidade de Santo Egídio. Para que surja o sentimento antídoto contra o medo e o ódio: a esperança.
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Medo e ódio. Artigo de Manuel Castells - Instituto Humanitas Unisinos - IHU