28 Março 2023
"Esse milenar mosteiro das Grutas, declarado Patrimônio Mundial da UNESCO, é um lugar onde se invoca a paz e se pede o fim da guerra, mas tornou-se uma desculpa para assédios e verdadeiras perseguições por parte de Zelensky. Assim, essa igreja - que não é "pró-russa", torna-se uma igreja mártir ao lado de uma igreja greco-católica e de uma igreja autônoma ucraniana, ambas exultantes. Assim, o ecumenismo foi derrotado e deve ser listado entre os escombros desta guerra", escreve o monge e teólogo italiano Enzo Bianchi, fundador da Comunidade de Bose, em artigo publicado por La Repubblica, 27-03-2023. A tradução de Luisa Rabolini.
Enquanto um silêncio vergonhoso reina sobre as lutas religiosas em todos os jornais do Ocidente, talvez porque parecem insignificantes em comparação com o drama da guerra russo-ucraniana, está se operando uma terrível perseguição contra a igreja ortodoxa tradicional, em comunhão com o Patriarcado de Moscou, pelo governo Zelensky na Ucrânia.
O vínculo canônico de uma Igreja ao próprio patriarca é um vínculo sério, do qual dependem sua autenticidade e legitimidade canônica. Nenhuma Igreja pode separar-se e proclamar-se autônoma ou autocéfala sem o consentimento das outras Igrejas ortodoxas, caso contrário resultaria cismática. Infelizmente persiste no mundo ortodoxo a antiga tentação da relação sinfônica com a autoridade política, que sempre se revela como sujeição.
Com o desaparecimento da URSS e o surgimento dos estados que antes faziam parte dela (Estônia, Letônia, Lituânia, Ucrânia, Bielorrússia... ) os governos que reivindicam e pretendem consolidar uma autonomia política de Moscou, gostariam que também os cristãos ortodoxos em comunhão com o patriarcado de Moscou se separassem dele e constituíssem igrejas nacionais autocéfalas.
Já no passado táticas políticas foram implementadas para promover tal processo. Houve uma primeira tentativa na Ucrânia nesse sentido com a criação de um patriarcado ucraniano por Filaret, aliás, com poucos seguidores e não reconhecido pelas igrejas; então em 2018 o Patriarca Ecumênico Bartolomeu com um tomo reconheceu a nova Igreja Ortodoxa da Ucrânia liderada pelo primaz Epifanij. Isso resultou na ruptura da comunhão entre Moscou e Constantinopla e apenas as igrejas grega e aquela de Alexandria seguiram Constantinopla no reconhecimento. Agora, no coração da ortodoxia ucraniana está a Grande Lavra das Grutas, o lugar mais sagrado, a fonte de fé e da vida espiritual, sede do Metropolita, de um mosteiro que abriga trezentos monges e mais de quatrocentos estudantes de teologia.
Zelensky, depois de tê-los intimados a deixar a Lavra, agora quer expulsá-los até o final do mês, enquanto já concedeu parte daquelas estruturas para a nova igreja nacional ucraniana. Os monges são acusados de serem colaboracionistas e espiões a favor da Rússia. No entanto, o primaz Onufrij, um homem de paz, já em 2019 proclamou a independência administrativa de Moscou e condenou a guerra de Putin.
Esse milenar mosteiro das Grutas, declarado Patrimônio Mundial da UNESCO, é um lugar onde se invoca a paz e se pede o fim da guerra, mas tornou-se uma desculpa para assédios e verdadeiras perseguições por parte de Zelensky. Assim, essa igreja - que não é "pró-russa", torna-se uma igreja mártir ao lado de uma igreja greco-católica e de uma igreja autônoma ucraniana, ambas exultantes.
Assim, o ecumenismo foi derrotado e deve ser listado entre os escombros desta guerra.
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A derrota do ecumenismo. Artigo de Enzo Bianchi - Instituto Humanitas Unisinos - IHU