“Anos de violência do padre Rupnik”. Quinze testemunhas no novo dossiê

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23 Fevereiro 2023

Um volumoso dossiê de 150 páginas com os relatos de "violência psicológica, abuso de consciência, abuso no âmbito sexual e afetivo, abuso espiritual" cometido ao longo de trinta e três anos, de 1985 a 2018, contra numerosas mulheres, freiras e não só, acerta em cheio o padre Marko Rupnik, um mosaicista jesuíta conhecido em todo o mundo.

A reportagem é de Iacopo Scaramuzzi, publicada por La Repubblica, 21-02-2023. A tradução é de Luisa Rabolini.

A recolher as novas denúncias, da boca de quinze novas testemunhas, foi a própria Companhia de Jesus, que, apurou o La Repubblica, decidiu contextualmente reforçar as sanções já em vigor contra o religioso: não poderá mais exercer atividade artística nem sair de Roma sem autorização dos superiores. Um processo canônico não é excluído.

Rupnik já havia sofrido sanções, mas o assunto tinha ficado sigiloso até dezembro passado. Em 2015, ele abusou sexualmente de uma mulher e posteriormente a absolveu no confessionário: a chamada "absolvição do cúmplice", um crime que, segundo o direito canônico, leva à excomunhão.

A sanção, apurada pela Congregação para a Doutrina da Fé em maio de 2020, foi revogada no mesmo mês pelo dicastério vaticano, depois que Rupnik reconheceu o crime e - como revelou o Papa em recente entrevista à Associated Press - pagou uma indenização à vítima. No entanto, os jesuítas decidiram manter algumas medidas restritivas contra ele, como a proibição de confessar e de acompanhar exercícios espirituais.

Entretanto, em 2021, surgiram novos abusos que Rupnik cometeu quando ainda estava na Eslovênia, na década de 1990, em uma comunidade de freiras. A Companhia de Jesus fez uma investigação e recomendou à Doutrina da fé a realização de um processo criminal, derrogante da prescrição, mas o dicastério vaticano, liderado por outro jesuíta, o cardeal Luis Ladaria, decidiu em outubro passado não continuar. “Pessoalmente, fiquei desapontado porque isso criou um impasse”, conta agora ao La Repubblica o responsável das casas jesuítas em Roma, padre Johan Verschueren, superior hierárquico do padre Rupnik.

No dia 2 de dezembro, Verschueren divulgou a notificação das restrições impostas ao esloveno. Rupnik estava no exterior naqueles dias, quando voltou a Roma, o superior o convocou. É a ruptura. No dia 19 de dezembro, Verschueren convida online quem quiser fazer denúncia para entrar em contato com uma equipe montada na Cúria generalícia.

Desde então, 15 pessoas se apresentaram, dois homens e treze mulheres, que forneceram novos testemunhos e denúncias sobre os abusos cometidos por Rupnik no acompanhamento espiritual e na atividade artística. "Testemunhos credíveis", explica o Padre Verschueren. Também chegaram dois depoimentos em defesa de Rupnik. O pe. Rupnik, convidado a se explicar, "não quis ou não pôde" apresentar sua versão.

Agora ele terá a oportunidade de "dar sua versão dos acontecimentos". As freiras de Ljubljana, contatadas, não quiseram voltar a testemunhar. Os jesuítas não vão encaminhar o dossiê para a Doutrina da Fé, porque não há novos crimes "sacramentais" como a absolvição no confessionário. As eventuais denúncias penais dependem das vítimas, do sistema jurídico de seus países e dos respectivos prazos de prescrição.

Mas novas sanções são impostas: Rupnik está proibido de "atividades ministeriais, atividades públicas, viagens para fora da região Lazio, mas também atividades artísticas". Depois será aberto um procedimento interno que poderá ter diversas consequências disciplinares: desde um percurso de psicoterapia para Rupnik até à possibilidade de indenização das vítimas, desde o afastamento do Centro Aletti, a comunidade-ateliê que o jesuíta esloveno fundou em Roma nos anos de João Paulo II e onde ainda vive, até uma vida isolada de oração e penitência. Até a hipótese de um verdadeiro processo canônico e o afastamento da vida religiosa.

“Muito depende de como o padre Rupnik reagirá a esses novos testemunhos”, explica Verschueren: se assumirá suas responsabilidades ou permanecerá “no caminho da negação”.

Os jesuítas também estudaram algumas das conferências que Rupnik proferiu anos atrás sobre a sexualidade: "Não há heresias, mas elementos que podem legitimar transgressões ou ações que não são corretas". Para o padre Verschueren, "a primeira coisa será garantir que não haja absolutamente nenhuma nova vítima".

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