06 Dezembro 2022
Líderes religiosos participaram recentemente da ocupação ilegal de um posto de gasolina em Paris para protestar contra as políticas da TotalEnergies na África. Eles devem se envolver em atos de desobediência civil?
O comentário é da jornalista francesa Isabelle de Gaulmyn, publicado por La Croix International, 02-12-2022. A tradução é de Wagner Fernandes de Azevedo.
“Livrai-nos da Total”... “Corações quentes, não oleodutos”... Um grupo de ativistas bloqueou um posto de gasolina em Paris na semana passada para protestar contra o projeto petrolífero da empresa multinacional TotalEnergies em Uganda e na Tanzânia.
Ativistas? Sim, mas de um tipo particular. Eles incluíam um rabino, um bispo católico emérito, um ministro protestante, um imã e um monge budista. Alguns pertencem ao GreenFaith, movimento ecológico internacional religioso, enquanto outros estão associados ao ramo “inter-religioso” da Extinction Rebellion (XR-Sp), outro movimento internacional que luta contra as mudanças climáticas.
Autoridades religiosas que promovem a desobediência civil? Qual é o próximo? Estará vendo homens de batinas e golas romanas jogando sopa em pinturas de museus ou bloqueando entradas de rodovias?
Para os responsáveis por esta manifestação, não há dúvida: a batalha pelo planeta é também uma batalha espiritual. Até mesmo o Papa Francisco diz isso na sua encíclica Laudato si': sobre o cuidado da casa comum. A transição que estamos sendo chamados a fazer não é apenas uma questão de ciência e economia, mas também de cultura e valores. Não é por acaso que o vocabulário dos ecologistas se apropria tanto do vocabulário religioso (conversão, salvamento do planeta, apocalipse, etc.).
Para dizer a verdade, essa “mistura de gêneros” é incomum apenas na França. No mundo anglo-saxão, os líderes religiosos há muito estão envolvidos nesses tipos de “acontecimentos”. E, inversamente, não é um palavrão para um ambientalista dos EUA convocar forças espirituais, enquanto os ambientalistas franceses continuam preocupados em mantê-lo secular. Em Nova York, as pessoas viram rabinos ocuparem ilegalmente as instalações do fundo de pensão BlackRock antes de serem impiedosamente removidos pela polícia! Também na Grã-Bretanha, vemos bispos anglicanos apoiando as causas defendidas pelo GreenFaith.
Afinal, a Bíblia está cheia de figuras “desobedientes”. Isaías andava nu e descalço, Jeremias que usava uma canga... Sem contar todas aquelas pessoas de nosso tempo que seguiram esta tradição bíblica; pessoas como Martin Luther King, Gandhi, Rosa Parks e outros. Nesse sentido, o radicalismo também faz parte da tradição cristã. Porém, para os cristãos tem um limite: a desobediência é sempre pacífica. Não se trata, portanto, de recorrer à violência.
Mas é relevante, em uma democracia onde todos podem se expressar, realizar ações fora da lei? Não seria razoável usar as possibilidades oferecidas pelo sistema político para agir? Sem dúvida. No entanto, por um lado, essas figuras e movimentos religiosos também se envolvem em formas mais clássicas de defesa política. Por outro lado, a desobediência é o último recurso quando esgotadas todas as possibilidades de discussão, como é o caso dos protestos contra a TotalEnergies.
O fato é que o radicalismo pelo qual esses grupos religiosos optam é divisor. Um ataque unilateral a uma grande empresa tem a desvantagem de destacar o “Grande Mal” sem deixar muito espaço para nuances. Corre o risco de agrupar todos os funcionários da Total, ferindo e reforçando antagonismos. Sem dúvida, não devemos parar na desobediência, mas usar essa desobediência como instrumento de discussão.
No Evangelho de Marcos, vemos a mulher com hemorragia tocar as vestes de Jesus, mesmo estando impura. De acordo com a lei de Levítico, ela não tem o direito de tocar em um homem. Mas Jesus não se ofende. Em vez disso, ele torna pública sua ação, forçando os presentes a mudar seu ponto de vista. A transgressão não pode ter a última palavra. É apenas o começo do diálogo.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Extinction Rebellion, uma ação espiritual? - Instituto Humanitas Unisinos - IHU