14 Dezembro 2020
"Ao longo dos anos "preto e branco juntos" tornou-se o slogan de um novo projeto político e espiritual, síntese daquele sonho de fraternidade pregado por King nos anos de sua curta vida. Mas é preciso lembrar que toda essa grande história nasceu da tenacidade política e determinação espiritual de uma mulher afro-americana que se chamava Rosa Louise Parks", escreve o sociólogo italiano Paolo Naso, da Comissão de Estudos da Federação das Igrejas Evangélicas na Itália e professor da Universidade de Roma “La Sapienza”, em artigo publicado por Riforma, publicação das Igrejas evangélicas batista, metodista e valdense italianas, 11-12-2020. A tradução é de Luisa Rabolini.
Foi em 1 ° de dezembro, 65 anos atrás, quando Rosa Louise Parks, uma costureira negra que morava em Montgomery, Alabama, foi presa por não ter cedido seu assento no ônibus a um passageiro branco. Um gesto consciente e intencional que desencadeou uma ação popular de boicote à companhia de transporte que aplicava as rígidas regras de segregação entre brancos e afro-americanos. Um gesto inspirado na fé que também se tornou um poderoso sermão sobre a injustiça, os direitos humanos e a libertação do pecado do racismo. As normas estadunidenses daqueles anos eram muito precisas: o negro tinha que subir pela porta da frente do veículo, mostrar a passagem ao motorista, sair e depois subir pela porta de trás e sentar-se, se houvesse lugar, nas últimas filas. O ônibus era apenas uma metáfora para a segregação; nos estados do sul tudo era segregado: escolas, locais de trabalho, lugares nos hospitais, cemitérios e até igrejas. Brancos nas igrejas dos brancos, negros naquelas dos negros nascidas já no século 18 após uma proibição escandalosa.
Rosa Parks (Foto: Store norske leksikon, licença creative commons).
Embora admitidos a participar do culto, na verdade, os afro-americanos eram proibidos de acessar a Santa Ceia - a Eucaristia - junto com os brancos. Indignados, muitos negros abandonaram as igrejas de seus senhores e fundaram suas comunidades cristãs, nas quais eram finalmente livres e iguais. Já no início dos anos 1900, esses lugares se tornaram uma excepcional escola de dignidade e direitos humanos: o evangelho que estava sendo pregado era uma mensagem de libertação; os principais textos de referência da teologia dos afro-americanos eram os do Êxodo e da promessa de uma terra a alcançar, pela qual o povo de Israel havia se posto em caminho no deserto. Uma reconstrução edulcorada e falsificada de Rosa Parks a descreve como uma mulher cansada e exausta no final de um longo dia de trabalho que, em 1 ° de dezembro de 1955, não conseguiu se dobrar às leis de segregação.
Não é isso; ela era uma mulher treinada nas técnicas da não-violência, ela havia estudado cuidadosamente todos os detalhes de seu ato de desobediência às leis injustas do racismo americano daqueles anos.
Rosa Parks (Foto: Wikimedia Commons).
Na época, Martin Luther King ainda era um jovem pastor batista no início de sua carreira e, assim que chegou a Montgomery, encontrou um movimento já pronto para se solidarizar com Rosa Parks e dar importância política ao seu gesto. King não foi o inspirador nem o iniciador daquele movimento, mas rapidamente se tornou seu porta-voz mais autorizado e eficaz. No início, as igrejas brancas ficaram olhando aquela onda crescente que partiu de Montgomery e que em poucos anos teria varrido o segregacionismo - mas não o racismo que ainda hoje é o demônio com o qual a consciência do país é obrigada a se confrontar todos os dias. Só anos depois as igrejas brancas entenderam que o movimento pelos direitos civis não tinha uma alma apenas política, mas com suas lutas e suas vítimas, testemunhava uma comunidade que estava tentando redimir sua alma. Ao longo dos anos "preto e branco juntos" tornou-se o slogan de um novo projeto político e espiritual, síntese daquele sonho de fraternidade pregado por King nos anos de sua curta vida. Mas é preciso lembrar que toda essa grande história nasceu da tenacidade política e determinação espiritual de uma mulher afro-americana que se chamava Rosa Louise Parks.
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A tenacidade e a fé de Rosa Parks - Instituto Humanitas Unisinos - IHU