Zamagni: “A paz ainda é possível. O Papa pode atuar como mediador”

Foto: Vatican Media

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27 Setembro 2022

 

“A paz ainda é possível e o Papa poderia atuar como mediador por ser super partes”.

 

Desde que, é claro, "os beligerantes concordem em dar-lhe esse papel" e que "a Ortodoxia, com o chefe da Igreja da Rússia, Kirill, não contrarie, como já foi feito, o que foi estabelecido por seu antecessor no Congresso de Istambul: não coloque a religião nas mãos da política". O professor Stefano Zamagni, economista e presidente da Pontifícia Academia das Ciências Sociais, é uma das poucas vozes a imaginar uma negociação entre Moscou e Kiev.

 

Ele o faz em um ensaio de 18 páginas publicado pela revista Paradoxa e antecipado pelo jornal Avvenire, no qual explica que "o mundo ocidental podia prever o que estava para acontecer, mas pensou que Putin poderia continuar com seus objetivos expansionistas: primeiro a Geórgia, depois a Crimeia, o Donbass... sem disparar um tiro”.

 

A entrevista com Stefano Zamagni é de Alessia Grossi, publicada por Il Fatto Quotidiano, 23-09-2022.

 

Eis a entrevista.

 

Professor Zamagni, o que aconteceu nas últimas horas?

 

Confirmou-se o que escrevi: se não houver negociação, o risco é que a guerra se transforme em uma guerra de desgaste e estas têm dois desfechos, ou terminam como conflito congelado, ou como paz negociada. Sou pela paz negociada. Putin acelerou tudo isso porque o risco nuclear não é mais potencial, mas concreto e assimétrico: uma guerra nuclear acaba com o Ocidente.

 

Em seus sete pontos pela paz há também uma concessão territorial a Moscou. Por que Kiev deveria aceitar?

 

No terceiro ponto, digo: deixemos à Rússia o controle de fato da Crimeia, que já tem, por alguns anos e após uma ação direcionada de tipo socioeconômico, vamos à mesa para resolver a questão definitivamente. Por outro lado, o ponto sete é qualificativo: vamos criar um fundo multilateral para a reconstrução ao qual Moscou também contribui. Destruiu, deve reconstruir.

 

Que culpas tem o Ocidente?

 

O erro de nós ocidentais é sermos superficiais. Pensamos no regime alheio de acordo com o nosso ponto de vista. Era preciso entender que sob Putin havia esse magma que mais cedo ou mais tarde explodiria. A superficialidade se paga.

 

Você é a favor de uma renovação das instituições internacionais.

 

É a grande responsabilidade do Ocidente. As instituições internacionais nasceram em Bretton Woods em 1944 para proteger e fortalecer os interesses ocidentais. Depois veio a Guerra Fria. Será possível que o Fundo Monetário Internacional e o Banco Mundial tenham a filosofia de 1944?

 

Imagina a criação de duas novas agências.

 

Sim, para as migrações e para o meio ambiente. Alguém inteligente diria, há aquela do comércio, por que não a dos fluxos migratórios?

 

Sim, por quê?

 

Porque, por um lado, há a ignorância cultural, muitos falam mas não sabem nada, enquanto outros têm interesses em jogo para manter o status quo, como para as regras das Finanças ou as da Bolsa de Amsterdã, que especula sobre o aumento do preço do gás. O erro é pensar que se é bom para o Ocidente, é bom para todos.

 

Em sua opinião, as bases de uma negociação, se apresentadas de maneira adequada e geridas com sabedoria em nível diplomático, podem ser aceitas por ambas as partes. O que o leva a acreditar nisso?

 

O ser humano, por mais perverso que seja, sempre guarda em si um resto de razoabilidade e de adesão ao bem comum, por menor que seja.

 

Putin também?

 

Putin também. Mas é preciso encontrar pessoas, não políticos, super partes como mediadores.

 

Então não o presidente turco Erdogan?

 

Não. Só uma criança pode pensar isso. O mediador não deve ter nenhum interesse em jogo, mas uma posição ideal forte.

 

A diplomacia do Vaticano alcançou ou está prestes a alcançar resultados para a paz?

 

A diplomacia vaticana está fazendo tudo o que lhe permitem fazer, porque, para ir nessa direção, é preciso que as potências dominantes, Rússia, Estados Unidos, China... aceitem o mediador. Até agora esse ato de aceitação não ocorreu, caso contrário teria sido capaz de desempenhar o papel.

 

A sua intervenção é compartilhada pela Conferência Episcopal e pela Santa Sé?

 

Não.

 

Reflete a linha do Vaticano?

 

Basta rever os discursos que o Papa vem fazendo desde fevereiro passado: ele pede uma solução negociada.

 

Não entra em detalhes, toca nos aspectos teológico-religiosos. Quando Kirill diz 'esta não é uma guerra física, mas metafísica', até um tolo entende o que ele quer dizer: para eles esta é uma guerra ideológica e o Papa está muito preocupado.

 

Que resultado eleitoral aproximaria a Itália a uma mediação pela paz?

 

Só Deus sabe, a situação é confusa... Na Itália, há o vício da previsão, mas as pesquisas são falaciosas. Estamos às vésperas de uma grande mudança na política de hobbesiana, que prevê que, para a paz e a ordem, é necessária a força militar, para aquela dos grandes valores, como a paz.

 

 

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