06 Setembro 2022
"A única maneira de amar os inimigos - opressores do povo - é ser contra o seu projeto de vida", escreve Marcos Sassatelli, frade dominicano, doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP) e professor aposentado de Filosofia da UFG.
“Vocês ouviram o que foi dito: ‘Ame seu próximo e odeie seu inimigo’. Eu, porém, lhes digo: Amem seus inimigos e orem por aqueles que os perseguem, para que vocês sejam filhos/as de seu Pai que está no céu. Porque ele faz nascer o sol sobre maus e bons, e faz chover sobre justos e injustos” (Mt 5,43-45).
O amor que Jesus de Nazaré nos pede é um amor sem limites, é um amor que não exclui ninguém, é um amor radical.
Ora, se Jesus nos pede para amar os nossos inimigos, quer dizer que existem inimigos e que nós temos inimigos. Enquanto seguidores e seguidoras de Jesus, perguntemo-nos: quais são os nossos inimigos? A resposta é clara: são todos aqueles/as que com sua maneira de agir e pensar sustentam e reproduzem um projeto de sociedade e de mundo (a Irmã Mãe Terra Nossa Casa Comum) estruturalmente iníquo, perverso, injusto, desumano, antiético e anticristão: o Anti-Reino de Deus.
No meio político - sobretudo político-partidário - costuma-se dizer: “os políticos que pensam diferentemente de nós devem ser tratados como adversários e não como inimigos”. Não é bem assim! Essa afirmação precisa ser esclarecida. Vejamos!
Como seres humanos temos fundamentalmente dois projetos de vida para nós mesmos e para o mundo: um projeto humano natural (e natural humano) que humaniza naturalizando (e naturaliza humanizando), e um projeto desumano antinatural (e antinatural desumano) que desumaniza desnaturalizando (e desnaturaliza desumanizando). É o projeto ético e o projeto antiético, que - à luz da fé - é também projeto cristão ou projeto anticristão: o Reino de Deus ou o Anti-Reino de Deus.
Os/as que nos comprometemos com o primeiro projeto somos objetivamente inimigos/as dos/as que se comprometem com o segundo projeto. Entre nós podemos ter diferenças e divergências quanto aos passos a serem dados e aos meios a serem utilizados para fazer acontecer o projeto na história do ser humano e do mundo. Porém, por termos o mesmo projeto, somos adversários e não inimigos.
Concretamente, os/as que nos comprometemos com o Projeto Social (sócio-econômico-político-ecológico-cultural-religioso) Popular (projeto fraterno, comunitário e socialista) somos objetivamente inimigos/as dos/as que se comprometem com o Projeto Capitalista Neoliberal. Não há possibilidade de aliança (que é comunhão de projetos), mas somente de acordos pontuais em casos muito especiais e, às vezes, por motivos opostos.
Exemplificando, entre os/as que estão comprometidos/as com Projeto Capitalista Neoliberal e que, portanto, são nossos inimigos e inimigas - temos:
· Os que se apresentam como pessoas de bem e - com a maior frieza e indiferença - defendem e apoiam o trabalho escravo doméstico, rural e empresarial. · Os que - adoradores do deus dinheiro (o deus capital) - de maneira cruel e perversa, exploram os trabalhadores/as com salários miseráveis. No mundo - conforme foi amplamente divulgado - temos atualmente 828 milhões de pessoas passando fome; destas, mais de 33 milhões somente no Brasil. As 8 pessoas mais ricas do mundo possuem tantos bens quanto a metade da população mais pobre (3,6 bilhões de pessoas). As 5 pessoas mais ricas do Brasil têm um patrimônio igual à renda da metade da população mais pobre. Na grande Goiânia, o número de pessoas em situação de pobreza extrema é atualmente de mais de 500 mil pessoas. Quanta desigualdade, injustiça, fome, miséria, falta de moradia, de trabalho e de condições de vida digna para a maioria do povo! É o pecado social ou estrutural institucionalizado e legalizado!
· Os magistrados - juízes e desembargadores - que, com a maior insensibilidade e o maior descaramento, aumentam seus próprios salários, recebendo - muitos deles - mais de R$ 100.000 por mês. Como podemos confiar na justiça desses magistrados?
Todas essas pessoas e outras não são somente nossos adversários, mas nossos inimigos. Apesar disso, como seres humanos e, sobretudo, como cristãos e cristãs (radicalmente seres humanos) devemos amá-las, orar a Deus por elas e pedir por sua conversão (como aconteceu com Zaqueu no encontro com Jesus). Lembremos: a única maneira de amar os inimigos - opressores do povo - é ser contra o seu projeto de vida.
Por fim, nas próximas eleições, antes de votar perguntemo-nos: dentro daquilo que “as condições objetivas nos permitem hoje”, quais são os partidos e os candidatos/as realmente comprometidos/as com o Projeto Popular? Votemos nesses partidos e nesses candidatos/as!
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Amem seus inimigos! - Instituto Humanitas Unisinos - IHU