15 Junho 2022
A reportagem é de José Manuel Vidal, publicada por Religión Digital, 15-06-2022.
Em seu ciclo de catequese sobre os idosos, o Papa Francisco aproveita o relato de Marcos sobre a cura da sogra de Pedro para convidar a comunidade cristã a visitar “muitos, juntos e muitas vezes” os idosos, que “muitas vezes estão sozinhos”. Bergoglio, que saudou o povo reunido na Praça São Pedro, sentado no papamóvel, também reconhece que "quando você envelhece, você não comanda mais seu corpo", porque "o vigor do corpo falha e nos abandona, embora nosso coração não deixe de desejar”. E o Papa traz sua própria experiência a esse respeito: “Temos que ouvir o corpo e aceitar os limites. Pessoal, eu também tenho que andar com a bengala”.
Por isso, o Papa denuncia, mais uma vez, que “esta cultura do descartável tenta marginalizar os idosos , como se fossem um peso, que é melhor esconder; Isso é uma traição à própria humanidade, é uma coisa terrível.” E lembre-se que “quanto mais os idosos se relacionarem com os jovens, mais esperança haverá para a humanidade”.
Na saudação em italiano, o Papa recordou, mais uma vez, a Ucrânia martirizada: "Por favor, não esqueçamos o povo martirizado da Ucrânia na guerra. Não nos acostumemos a viver como se a guerra fosse uma coisa distante. Nossa memória, o nosso carinho, as nossas orações, a nossa ajuda estão sempre perto deste povo que tanto sofre e que sofre um autêntico martírio".
Queridos irmãos e irmãs, bom dia!
Ouvimos a história simples e comovente da cura da sogra de Simão – que ainda não se chamava Pedro – na versão do evangelho de Marcos. O breve episódio é narrado com ligeiras mas sugestivas variações também nos outros dois evangelhos sinóticos. "A sogra de Simão estava de cama com febre", escreve Marcos. Não sabemos se era uma doença leve, mas na velhice até uma simples febre pode ser perigosa. Quando você é velho, você não governa mais seu corpo. É preciso aprender a escolher o que fazer e o que não fazer. O vigor do corpo falha e nos abandona, embora nosso coração não deixe de desejar. Por isso é preciso aprender a purificar o desejo: ser paciente, escolher o que pedir ao corpo, à vida. Temos que ouvir o corpo e aceitar os limites. Todos, até eu tenho que andar com a bengala.
A doença pesa sobre os idosos de uma maneira diferente e nova do que quando se é jovem ou adulto. É como um golpe duro que vem em um momento já difícil. A doença do idoso parece apressar a morte e, de qualquer forma, encurtar aquele tempo de vida que já consideramos curto. Insinua-se a dúvida de que não nos recuperaremos, que "esta vez será a última vez que adoecerei...".
Não é possível sonhar com esperança num futuro que parece inexistente. Um famoso escritor italiano, Ítalo Calvino, notou a amargura dos idosos que sofrem mais com a saudade das coisas velhas do que com a chegada do novo. Mas a cena evangélica que ouvimos nos ajuda a ter esperança e já nos oferece uma primeira lição: Jesus não visita sozinho aquela velha doente, ele vai com os discípulos.
É a comunidade cristã que deve cuidar dos idosos: parentes e amigos. A visita aos idosos deve ser feita por muitos, juntos e com frequência. Nunca devemos esquecer estas três linhas do Evangelho. Especialmente hoje que o número de idosos cresceu consideravelmente, há muitos idosos e poucos jovens, por causa do inverno demográfico. Devemos sentir a responsabilidade de visitar os idosos que muitas vezes estão sozinhos e apresentá-los ao Senhor com a nossa oração. O próprio Jesus nos ensinará a amá-los. “Uma sociedade é verdadeiramente acolhedora da vida quando reconhece que ela é valiosa também na velhice, na deficiência, na doença grave e mesmo quando ela está morrendo” (Mensagem à Pontifícia Academia para a Vida, 19 de fevereiro de 2014).
Jesus, ao ver a velha doente, toma-a pela mão e a cura, colocando-a de pé novamente. Jesus, com este gesto terno de amor, dá a primeira lição aos discípulos: a salvação é anunciada, ou melhor, comunicada através do cuidado daquele doente; e a fé daquela mulher brilha em gratidão pela ternura de Deus que se curvou diante dela. Volto a um tema que tenho repetido: Essa cultura do descarte tenta marginalizar os idosos, como se fossem um peso, que é melhor esconder. Isso é uma traição à própria humanidade. É algo terrível. Os velhos têm muito a nos dar: a sabedoria da vida. As crianças devem ser ensinadas a ir ver seus avós. O diálogo entre jovens e idosos é fundamental para a sociedade e a Igreja. Sem esse diálogo, uma sociedade cresce sem sabedoria e sem raízes.
Se a primeira lição foi dada por Jesus, a segunda nos é dada pela velha, que “levantou-se e começou a servi-los”. Também como anciãos, pode-se, de fato, servir à comunidade. É bom que os anciãos ainda cultivem a responsabilidade de servir, vencendo a tentação de se afastar. O Senhor não os descarta, pelo contrário, lhes dá novamente a força para servir. E gosto de salientar que não há ênfase especial na história por parte dos evangelistas: é a normalidade do seguimento, que os discípulos aprenderão, em todo o seu significado, ao longo do caminho de formação que viverão na escola de Jesus. Os anciãos que permanecem disponíveis para cura, consolação, intercessão por seus irmãos e irmãs – sejam discípulos, sejam centuriões, pessoas acossadas por espíritos malignos, pessoas descartadas… -, são talvez o maior testemunho da pureza dessa gratidão que acompanha a fé.
Se os idosos, em vez de serem descartados e retirados do cenário dos acontecimentos que marcam a vida da comunidade, fossem colocados no centro das atenções coletivas, seriam estimulados a exercer o valioso ministério de gratidão a Deus, que ninguém esquecido. A gratidão dos idosos pelos dons recebidos por Deus em suas vidas, como nos ensina a sogra de Pedro, devolve à comunidade a alegria da convivência e confere à fé dos discípulos o traço essencial de seu destino.
Mas devemos entender bem que o espírito de intercessão e de serviço, que Jesus prescreve a todos os seus discípulos, não é apenas uma coisa para as mulheres: nas palavras e nos gestos de Jesus não há vestígio dessa limitação. O serviço evangélico de gratidão pela ternura de Deus não está escrito de forma alguma na gramática do senhor e da serva. No entanto, isso não significa que as mulheres, sobre a gratidão e sobre a ternura da fé, possam ensinar aos homens coisas mais difíceis de entender. A sogra de Pedro, antes da chegada dos apóstolos, no caminho da continuação de Jesus, também lhes mostrou o caminho. E a doçura especial de Jesus, que “tocou sua mão” e “curvou-se suavemente” diante dela, deixou claro, desde o início, a sua especial sensibilidade para com os fracos e os doentes, que o Filho de Deus certamente aprendera com a sua Mãe. Por favor, tentemos aproximar os velhos dos jovens, para lhes transmitir a sabedoria da vida. Quanto mais os idosos se relacionarem com os jovens, mais esperançoso será o futuro da humanidade.
No final da tradicional audiência das quartas-feiras, na Praça São Pedro, em Roma, o Papa Francisco disse:
“Por favor, não esqueçamos o povo atormentado da Ucrânia em guerra. Não nos acostumemos a viver como se a guerra fosse uma coisa distante. A nossa recordação, o nosso afeto, a nossa oração e a nossa ajuda vão sempre para este povo que tanto sofre e que está levando avante um verdadeiro martírio”.
Também no domingo passado, o Papa fez o seguinte apelo:
“Sempre vivo em meu coração é o pensamento para o povo da Ucrânia, afligido pela guerra. O tempo que passa não esfrie nossa dor e nossa preocupação com aquelas pessoas atormentadas. Por favor, não nos acostumemos a esta trágica realidade! Tenhamo-la sempre em nossos corações. Rezemos e lutemos pela paz”.
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Papa: “Os idosos têm que ouvir o corpo e aceitar os limites. Pessoal, eu também tenho que andar com bengala” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU