11 Abril 2022
Quem, como as agências humanitárias, está acostumado por necessidade a ter que planejar e olhar além da situação estritamente atual, já fez algumas contas e começou a cruzar causas e efeitos. Porque a guerra na Ucrânia já não é apenas a crise de hoje, mas ainda mais a de amanhã e de depois de amanhã. E não é apenas a guerra de uma região, mas de todas aquelas, o Sul do mundo na liderança, que por diferentes razões sofrerão as consequências.
A reportagem é de Paolo M. Alfieri, publicada por Avvenire, 10-04-2022. A tradução é de Luisa Rabolini.
Observamos os rostos apavorados das crianças ucranianas na TV, as acolhemos em nossas escolas, levamos a elas os brinquedos de nossas crianças. Faríamos o mesmo com as crianças que não vemos, as crianças da África, do Oriente Médio, aquelas que, devido à invasão russa, assistem impotentes ao aumento dos preços dos grãos? Ou pensaremos - e a distinção já está explicitamente em ato em algumas capitais, como na Budapeste de Orbán - que apenas os ucranianos são os "verdadeiros" refugiados? E que assim poderemos continuar a erguer fronteiras, quando a fome - ou os conflitos que a própria fome desencadeia - obrigarão milhões de outras pessoas a partir, a buscar entre nós um refúgio?
Segundo a UNICEF, a interrupção das exportações de trigo ucraniano e russo já está provocando consequências no frágil estado nutricional das crianças em regiões como o Norte de África e o Médio Oriente, que importam a grande maioria dos seus fornecimentos de Moscou e Kiev. No mercado internacional, as matérias-primas essenciais, trigo, óleos comestíveis, mas também combustíveis, sofreram aumentos históricos que prejudicam a oferta.
Acima de tudo, Egito, Líbano, Líbia, Sudão, Síria e Iêmen estão em risco. Mas a crise está destinada a repercutir também na África subsaariana, já que a maioria dos países da região depende da ajuda de agências humanitárias, que por sua vez se veem forçadas pelos altos preços a não conseguir atender a todas as necessidades. A FAO acaba de anunciar a destinação de 1,79 bilhões de euros - graças sobretudo ao empenho da União Europeia - para mitigar a crise alimentar prevista para este ano no Sahel. Países já afetados por conflitos internos, terrorismo, golpes de estado - Burkina Faso, Camarões, Chade, Mali, Mauritânia, Níger e Nigéria - viram a insegurança alimentar quadruplicar em relação a 2019, que hoje envolve 40 milhões de pessoas. Primeiro a pandemia de Covid-19, depois a seca e o aumento dos preços dos alimentos alimentaram a espiral negativa.
Os preços dos alimentos, segundo a FAO, atingiram os "níveis mais altos já verificados" em março, impulsionados pela crise ucraniana, especialmente no que diz respeito aos cereais (+ 17,1%) e óleos comestíveis (23,2%), mas todos os setores, incluindo carne, leite e queijos, tiveram um aumento. A especulação também desempenha seu papel, é claro, mas não se pode ignorar que é sobretudo a guerra que empurra os preços para cima. É por isso que aqueles que olham para a Ucrânia pensando que, afinal, aquele conflito é circunscrito, fariam bem em não dirigir o olhar para o dedo, mas para observar finalmente a Lua.
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As crianças da África e do Oriente Médio pagam os preços recordes pelo alimento - Instituto Humanitas Unisinos - IHU