18 Agosto 2021
Escutar permite “aquele caminhar juntos ao qual somos chamados como Igreja”. Mas se deve fazer isso não só em relação a si mesmos, mas também em relação aos outros “que a vida nos faz encontrar”.
A reportagem é de Marina Corradi, publicada em Avvenire, 17-08-2021. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Em primeiro lugar, Agostinho: “Noli foras ire, in te ipsum redi, in interiore homine habitat veritas” (Não saias de ti, entra novamente em ti, é no interior do homem que habita a verdade). Chamado a falar no 79º Curso de Estudos Cristãos em Assis, sobre o tema “Sínodo, juntos para caminhar juntos”, o professor Eugenio Borgna, psiquiatra e professor emérito, não podia deixar de partir da advertência agostiniana, que, desde a adolescência até os 90 anos de idade hoje, lhe é caro.
Borgna poderia ser chamado de um maratonista da “escuta”, depois de 40 anos no hospital psiquiátrico feminino de Novara. Um fluxo infinito de palavras, de silêncios desesperados, de olhares, de fragmentos vivos de dor. Quanto Eugenio Borgna “escutou”!
Professor, ainda é possível anunciar Agostinho em um momento tão distraído?
É possível e necessário. Como entender algo dos outros, daquele caminhar juntos ao qual somos chamados como Igreja, se não estivermos em constante escuta de nós mesmos e daqueles que a vida nos faz encontrar, particularmente dos mais frágeis e, enfim, de Deus?
E como se aprende a escutar?
Pôr-se à escuta é se libertar dos próprios pensamentos, saber se colocar entre parênteses. Passar do “ouvir” ao “escutar”, que é outra coisa e muito mais, é construir pontes. A escuta é precisamente isto: uma tensão ao outro. Aquela atenção ao próximo que, dizia Simone Weil, já é oração.
Não seria revolucionário, no labirinto da web, no burburinho das redes sociais digitais ou entre os comentários dos DJs na rádio, ouvir ressoar “Noli foras ire, in te ipsum redi...”?
Talvez. Mas às vezes eu me pergunto se o domínio das mídias e da web é realmente totalizante. Pois às vezes eu sou convidado para ir às escolas, e as perguntas dos adolescentes muitas vezes me surpreendem, de tão afiadas e profundas que são. De um colégio em Novara ao Parini em Milão, eu fico admirado com o surgimento de perguntas que muitos adultos custariam a responder. É como se eu entrevisse o crescimento de uma nova geração que busca e não encontra, porque os adultos se calam. Uma humanidade silenciosa, adolescente, sem mestres.
Em Assis, você falou de escuta ao próximo. Penso na miséria de milhares de migrantes que desembarcam na Itália ou se afogam ao tentar chegar até ela. No entanto, isso parece nos deixar cada vez mais indiferentes, quando não hostis. A escuta autêntica não requer também identificação?
Certamente. E é estranho, já há em nós quase um preconceito fatal: no máximo, reconhecemos a pobreza material dessas pessoas, a sua fome, mas é como se não soubéssemos que cada refugiado da Síria ou do Afeganistão é uma pessoa com a sua interioridade, alguém que perdeu a casa, talvez abandonou os filhos, ou um órfão dilacerado.
Há quase dois anos, a Covid nos atingiu como uma bomba: a surpreendente descoberta de que mesmo entre nós, e mesmo jovens, era possível morrer em poucas horas. Os caixões de Bérgamo nos caminhões do Exército foram uma bofetada inesquecível para os italianos. Houve em nós uma espécie de conversão e quanto tempo ela durou?
Nas primeiras semanas, aqueles caixões inacreditáveis e dilacerantes de Bérgamo e aquilo que acontecia nos hospitais, por algum tempo, creio eu, criaram entre nós uma “comunidade de destino”. Embora talvez assustados ao nos cruzarmos com alguém pela rua, todos nos sentimos, por algum tempo, no mesmo barco. Na terceira, na quarta onda, é claro, há cansaço. No entanto, aquele primeiro sentimento comum, aquele “estar juntos” que sentimos, mesmo que breve, testemunha que a humanidade no fundo de nós não está petrificada.
Você escreveu no seu último livro, “In dialogo con la solitudine” [Em diálogo com a solidão] (Ed. Einaudi), que não há escuta sem solidão. O que isso quer dizer?
Naturalmente, eu falava de solidão não no sentido de isolamento, de fechamento ao outro, mas daquela solidão desejada e escolhida que se torna capacidade de nos colocarmos à parte e de dar lugar ao Mistério. É essa “bela solidão” que muda o nosso olhar: e finalmente dissolve o nosso egoísmo em generosidade e escuta do outro.
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Ser Igreja: é preciso saber passar do “ouvir” para o “escutar” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU