02 Março 2021
Será lançado nesta semana o novo livro-entrevista de Marco Pozza com o Papa Francisco. O livro dedica-se aos vícios e às virtudes.
A reportagem é publicada por Religión Digital, 28-02-2021. A tradução é de Wagner Fernandes de Azevedo.
O jornal italiano Corriere della Sera antecipou extratos do novo livro-entrevista do padre Marco Pozza com o Papa dedicado aos vícios e às virtudes: “As crises de fé revelam a necessidade de entrar cada vez mais na profundidade do mistério de Deus”. O dilúvio bíblico é o que nos arriscamos a ver “se seguirmos pelo mesmo caminho”.
“Dei vizzi e delle virtù” (Ed. Rizzoli, “Dos vícios e das virtudes”, em tradução livre) é o título do novo livro-entrevista do padre Marco Pozza com o Papa Francisco que estará à venda a partir de 02 de março. O capelão do presídio de Pádua falou com o Pontífice para um programa de televisão que será transmitido pelo canal italiano Nove e que se desenvolve em sete episódios dedicados à comparação entre os vícios e as virtudes. O conteúdo do livro foi antecipado hoje pelo jornal Corriere della Sera.
O fio da reflexão segue a representação das sete virtudes e os vícios opostos que Giotto pintou na Capela Scrovegni: justiça/injustiça; fortaleza/inconstância, temperança/ira, prudência/estultícia, fé/infidelidade, esperança/desespero, caridade/inveja. Francisco diz: “há pessoas virtuosas, pessoas viciosas, mas a maioria é uma mescla de virtudes e vícios. Alguns são bons em uma virtude, mas têm algumas fraquezas. Porque todos somos vulneráveis. E devemos levar a sério esta vulnerabilidade existencial. É importante saber, como guia de nosso caminho, de nossa vida”.
“A ira destrói”, explica o Papa no livro. “A ira é uma tormenta cujo propósito é destruir. Pensa no bullying entre os jovens. O assédio na escola hoje em dia é terrível. Está muito presente nas escolas. Inclusive os menores têm a capacidade de destruir o outro. O bullying surge quando, em vez de buscar a própria identidade, menospreza-se e ataca a identidade dos demais. E quando nos grupos de jovens, na escola, nos bairros há episódios de agressão, de assédio, vemos a pobreza da identidade dos que agridem. A única maneira de “se curar” do bullying é compartilhar, conviver, dialogar, escutar os demais, levar-se tempo porque é o tempo o que faz a relação. Cada um de nós tem algo bom a dar ao outro, cada um necessita receber algo bom do outro”.
Francisco fala então da ira de Deus, que “é contra a injustiça, contra Satanás. Dirige-se contra o mal, não o que vem da fraqueza humana, mas o mal de inspiração satânica: a corrupção gerada pelo Satanás, detrás da qual vão homens individuais, mulheres individuais, sociedades inteiras. A ira de Deus pretende fazer justiça, “limpar”. O dilúvio é o resultado da ira de Deus, diz a Bíblia. É uma figura da ira de Deus, que segundo a Bíblia viu muitas coisas ruins e decide acabar com a humanidade’.
O Papa explica que a narração bíblica, segundo os exegetas e biblistas, “é um relato mítico. Porém o mito é uma forma de conhecimento”. Enquanto que para os arqueólogos “o dilúvio é um relato histórico porque encontraram rastros de uma inundação em suas escavações”. Uma grande inundação, talvez devido ao aumento da temperatura e o desgelo dos glaciais: o que ocorrerá agora se seguirmos pelo mesmo caminho. Deus desatou sua ira, porém viu um homem justo, o tomou e o salvou. A história de Noé mostra que a ira de Deus também é salvadora”.
Francisco fala então da prudência. “Para alguns, a prudência seria uma virtude pura, sem contaminação. É como se fosse um entorno esterilizado. A prudência, no entanto, é a virtude do governo. Não se pode governar sem prudência, pelo contrário. Quem governa sem prudência governa mal e faz coisas más, toma decisões más, que destroem o povo, sempre. A prudência no governo nem sempre é equilíbrio. Às vezes a prudência deve ser desequilibrada, para todas decisões que produzam mudanças. Porém a prudência é uma virtude essencial para os que governam: os homens são apaixonados, e faz falta algo que nos diga “pare, esfrie e pense”. Não é tão fácil ter prudência. Faz muita falta reflexão, muita oração, porém sobretudo faz falta empatia. O asséptico, digamos o que nunca se suja, o que se lava com o desinfetante, não é a verdadeira pessoa prudente. A prudência depende da simpatia, da empatia, pelas situações, as pessoas, o mundo, os problemas (...)”.
Significativo, entre os extratos do livro antecipado pelo Corriere della Sera, é também o dedicado às dúvidas que podem acompanhar a vida dos que creem.
“Pode a fé crescer de mãos dadas com a dúvida?”, pergunta-se o Papa Francisco. “Isso ocorre porque somos humanos, e a fé é um dom tão grande que, quando a recebemos, não podemos acreditar. Será algo possível? O diabo coloca dúvidas, depois a vida, as tragédias: por que Deus permite isso? Mas uma fé sem dúvidas não funciona. Pense em Santa Teresinha do Menino Jesus: você acha que ela não tinha dúvidas? Leia o fim de sua vida. Ela conta que, nos piores momentos de sua doença, pediu para levar água benta ao seu leito, para pegar a vela abençoada a fim de afastar o inimigo. O problema é quando você não tem paciência. Jesus homem, no Monte das Oliveiras, estava feliz? ‘Por me abandonaste?’. Pensar em ser abandonado por Deus é uma experiência de fé que muitos santos tiveram e também muitas pessoas hoje, que se sentem abandonadas por Deus, mas não perdem a fé. Eles guardam o dom: neste momento não sinto nada, mas guardo o dom da fé. Ao cristão que nunca passou por esses estados de espírito falta algo, porque isso significa que ele se contenta. As crises de fé não são fracassos contra a fé. Pelo contrário, revelam a necessidade e o desejo de entrar cada vez mais profundamente no mistério de Deus. Uma fé sem essas provações me faz duvidar de que seja uma fé verdadeira”.
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“O dilúvio ocorrerá agora, se seguirmos pelo mesmo caminho”, afirma o Papa Francisco em novo livro - Instituto Humanitas Unisinos - IHU