20 Outubro 2020
O Conselho Curador do Seminário Teológico Batista do Sul (SBTS), nos Estados Unidos, decidiu não remover de prédios do campus os nomes de fundadores, como pediam setores da igreja, sob o argumento de que esses patriarcas mantinham escravos. Numa decisão salomônica, o Conselho anunciou, a título de reparação, a constituição de um fundo de 5 milhões de dólares que arcará com bolsas de estudo para estudantes afro-americanos.
A reportagem é de Edelberto Behs, jornalista.
Para o ano acadêmico de 2022-2023, o Seminário reservará 1 milhão de dólares, a cada três anos, de fundos para o Programa Garland Offutt, nome que homenageia o primeiro negro formado pela SBTS, até que a meta dos 5 milhões de dólares seja alcançada.
“Esperamos ajudar no desenvolvimento de pastores, teólogos, acadêmicos e líderes afro-americanos por meio desta nova iniciativa história”, declarou o presidente do Seminário, R. Albert Mohler Jr. Esses recursos serão adicionais aos atuais programas de bolsa de estudo e auxílio estudantil, informou Jeff Robinson, do Sothern News.
Em 2018, a instituição apresentou o “Relatório sobre escravidão e racismo na história do Seminário Teológico Batista do Sul”, documento histórico que pesquisou o passado e detalhou o uso de escravos pelo presidente fundador da instituição, James P. Boyce, e dos membros do corpo docente John Broadus, Basil Manly Jr. e William Williams. Os quatro fundaram o seminário em 1859, em Greenville. Ao todo, 51 escravos trabalhavam para eles.
O relatório concluiu que todos os fundadores do seminário eram donos de escravos e apoiaram a Confederação durante a Guerra Civil Americana. Até a década 1940, o SBTS corroborou ativamente a segregação e a desigualdade racial.
“A história do Southern Baptist Theological Seminary está entrelaçada com a história da escravidão americana e o compromisso com a supremacia branca que a sustentava. A escravidão deixou sua marca no seminário da mesma forma que deixou na nação americana como um todo”, concluiu o relatório.
“Não vamos apagar a nossa história em nenhum aspecto ou deixar nossa história sem solução. Estamos tentando fazer o que é certo para uma instituição cristã”, declarou o presidente do SBTS em comunicado emitido na segunda-feira, 12 de outubro.
Em outro trecho, afirmou: “Devemos ser claro em nossa mágoa e horror diante do racismo e supremacia racial. Isso faz parte do peso da história. Devemos ser claros ao abraçarmos o legado inestimável que nos foi deixado por aqueles que fundaram esta instituição e se sacrificaram para que ela sobrevivesse – que definiram nossas convicções e estabeleceram as bases para a fidelidade teológica”.
Mohler reportou-se a figuras bíblicas como o rei Davi e Moisés, que tiveram seus pecados registrados no Antigo Testamento, mas também foram considerados justos, apesar de suas falhas. “Certamente, esse é o padrão de honra que devemos ver ao longo da história, e especialmente na história da Igreja”, assinalou.
A Igreja, começando com os apóstolos, prosseguiu, “foi dirigida por pastores, ensinada por pregadores e alimentada com o sangue dos mártires. Cada um desses seres humanos é, como crente em Cristo, santo e pecador. Nossa tarefa é honrar os santos sem perdoar, esconder ou negar o pecador. Não fizemos isso bem no passado. Devemos fazer melhor no presente e ser mais fiéis no futuro”.
O pastor batista negro, Dwight McKissic, que fez campanha pela remoção dos nomes dos prédios no campus e encontrou-se com Mohler momentos antes da reunião do Conselho Curador da instituição, aplaudiu a medida adotada pela SBTS. “Certamente representa um fruto digno de arrependimento. Fala com o passado e o futuro. Tiramos o chapéu ao Dr. Mohler e ao Conselho de curadores por esta decisão histórica que é um passo em direção à cura”.
Em seu blog, McKissic afirmara, antes da reunião do Conselho, que “existe uma ortodoxia dentro de mim que não permitirá a defesa de uma ideia que não seja biblicamente fundamentada. Honrar aqueles que desonraram a Imago Dei em outros por lucro, simplesmente não é uma coisa honrosa de se fazer ou continuar a fazer”.
O pastor sênior da Primeira Igreja Batista de Garrettsville e curador do SBTS, David Gray, declarou que o tratamento dado pelo Conselho a uma questão tão difícil é exemplar. “O que aconteceu hoje é uma demonstração da graça de Deus, quando homens definitivamente falhos fizeram algo muito bom para começar este seminário. Mas eles também fizeram algumas coisas que eram muito ruins. Assim é a natureza humana. Todos nós pecamos e carecemos da glória de Deus. Mas Deus faz uso até dos pecadores”, disse.
McKissic propôs a construção de um memorial para homenagear os escravos que “realmente contribuíram muito para o financiamento inicial do SBTS em virtude da riqueza que forneceram a Boyce, Broadus, Manly e Williams, com seu trabalho gratuito involuntário”. Seria um agradecimento visível “aos escravos que nunca foram reconhecidos por sua gigantesca contribuição financeira para a escola”, defendeu.
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Seminário batista introduz bolsa de estudos para afro-americanos como medida reparatória - Instituto Humanitas Unisinos - IHU