05 Mai 2020
“Superar o sindicalismo clássico, ainda fortemente presente em nossos países, dando passagem a um ecossindicalismo em chave territorial, que não anteponha algumas lutas sobre outras, já que só assim poderá gerar alternativas reais através da convergência entre diferentes sujeitos de transformação”, defende Andrés Kogan Valderrama, sociólogo, em artigo publicado por OPLAS, 03-05-2020. A tradução é do Cepat.
Após uma nova comemoração do Dia Internacional das Trabalhadoras e Trabalhadores no mundo, neste 1º de maio, em um contexto atual de emergência sociossanitária e de crise civilizacional, é importante repensar o sindicalismo atual, que em muitos casos ainda mantém uma visão produtivista, centrada na contradição capital-trabalho, que invisibiliza outras lutas provenientes de movimentos críticos ao extrativismo, andocentrismo e colonialismo imperante.
Um sindicalismo clássico, herdeiro da revolução industrial e do movimento operário europeu, que se consolidou nos países ocidentais, durante o século XX, graças à reivindicação de direitos sociais e econômicos dos trabalhadores, sustentado por visões de esquerda eurocêntricas, antropocêntricas e patriarcais, que embora tenham problematizado os processos de exploração e de acumulação capitalista, não ultrapassaram os limites de um projeto moderno fundado na conquista de milhões de indígenas, mulheres e da própria Mãe Terra.
Embora seja correto que as lutas de organizações operárias foram fundamentais para democratizar o sistema produtivo e assim garantir certos direitos para as e os trabalhadores em todo o mundo, com o surgimento do capitalismo financeiro, o movimento sindical sofreu uma forte fragmentação, como resultado de políticas neoliberais que retiraram a centralidade do trabalho como fonte de integração social, resultando em mero emprego e abrindo passagem a uma sociedade do consumo.
Isso somado a uma forte burocratização de muitos sindicatos, tanto no mundo capitalista como nos chamados socialismos reais, que conformaram estruturas verticais, hierárquicas e clientelistas, nas quais a partidocracia e visões estadocêntricas não fizeram outra coisa a não ser limitar sua democracia interna e sua autonomia em gerar processos de transformação que sejam capazes de integrar novas demandas, como as provenientes do feminismo, ecologismo e anticolonialismo.
Conforme o que foi destacado antes, parece-nos que o enfraquecimento do sindicalismo no mundo não apenas responde ao surgimento de um capitalismo financeiro e de novas formas de exploração e flexibilidade trabalhista, hoje em dia, em pleno processo de digitalização, através do chamado teletrabalho, como também suas próprias estruturas patriarcais e coloniais são incapazes de ir além de uma visão economicista do mundo.
A falida experiência dos novos progressismos latino-americanos, em que muitos deles nasceram de importantes processos constituintes para a região (Venezuela, Equador e Bolívia), não responde somente a um marco imperialista, dominado ainda pelos Estados Unidos, mas, ao contrário, por caudilhismos autoritários, sustentados muitas vezes por um sindicalismo clássico que não é capaz de enxergar para além das lentes de uma esquerda classista que ainda acredita estar acima da vida, ao aprofundar o extrativismo patriarcal nos territórios.
Daí não ser motivo para surpresa que o sindicalismo clássico continue usando termos impostos pelas elites governantes, como são o progresso, o desenvolvimento, a luta contra a pobreza, o cuidado com o meio ambiente, a equidade de gênero e, no melhor dos casos, apenas tematizem noções estruturais, muito mais amplas, como são a plurinacionalidade, o bem viver, a soberania alimentar, a justiça ambiental, que provêm de um pluriverso de experiências democráticas no mundo, que vão muito além do tradicional discurso de classe de esquerda.
Uma tematização a partir do mundo sindical clássico, assim como dos governos denominados de esquerda ou progressistas, que ainda não querem entender que a luta das mulheres, camponeses, indígenas, negros, dissidências sexuais, loucos, é algo transversal e também está conectada com os processos de acumulação capitalista. Em consequência, a transversalidade de lutas deve primar acima do discurso reducionista de classe tradicional, que ainda não concebe o corpo como território, por ser herdeiro da lógica industrial.
Em síntese, se faz necessário superar o sindicalismo clássico, ainda fortemente presente em nossos países, dando passagem a um ecossindicalismo em chave territorial, que não anteponha algumas lutas sobre outras, já que só assim poderá gerar alternativas reais através da convergência entre diferentes sujeitos de transformação.
Não é por acaso que ainda persista um discurso sindical que sustenta colonialmente a ideia do 1º de maio como Dia Internacional das Trabalhadoras e Trabalhadores, em nível internacional, sendo que, embora responda a uma homenagem aos mártires de Chicago de 1886, deixa de fora outras experiências de luta fora do Norte Global.
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Rumo a um ecossindicalismo em chave territorial - Instituto Humanitas Unisinos - IHU