31 Janeiro 2020
“A economia de plataforma somente resulta estelar nos resultados econômicos para seus proprietários e na linguagem sofisticada de escola de negócios que utilizam abundantemente para se justificar”, escreve Josep Burgaya, doutor em História Contemporânea pela Universidade Autônoma de Barcelona e diretor do Instituto Catalão de Economia Verde, em artigo publicado por Economistas Frente a la Crisis, 26-01-2020. A tradução é do Cepat.
A irrupção do mundo digital na economia gerou um grande número de fantasias futuristas, por trás das quais, se analisarmos bem, geralmente existem formas de exploração extrema dos trabalhadores, revestidas de terminologias pretensiosas e vocação de modernidade.
Toda cidade que pretende ter um lugar no futuro deve criar um “ecossistema empreendedor” no qual a combinação de conhecimento tecnológico, desejo de impulsionar novos negócios e instrumentos de financiamento permitam colocar em marcha startups. Quer dizer, empresas que inicialmente não são nada, mas que têm grandes ambições de terminar senão competindo com as grandes tecnológicas do Vale do Silício, ao menos fazer o barulho suficiente e criar expectativas para que algumas destas as acabem comprando, o que, de fato, fazem muitas vezes. Algo como jogar na loteria.
No narcisista mundo da inovação tecnológica, as empresas que conseguem além de flutuar, levantar voo e ultrapassar uma avaliação de 1 bilhão de dólares são chamadas de “unicórnios”. Um animal mitológico inexistente e muito difícil de ver. De fato, a esta altura, se avalia o grau de desenvolvimento da “nova economia” digital pelo número existente de empresas dessa categoria.
São no mundo hoje 430, tendo dobrado em dois anos, e a maior parte, 211, estão nos Estados Unidos. Na China, há uma centena, na Europa, cinquenta e poucas, e na Espanha até recentemente apenas a madrilena Cabify. Justamente nesses dias foi muito comemorado pelos crédulos da religião tecnológica ter alcançado a segunda com a barcelonesa Glovo, que é mais conhecida pelos conflitos decorrentes de sua precariedade trabalhista do que pela tecnologia que fornece.
A Glovo nasceu há apenas quatro anos, com um capital inicial de 100.000 euros para organizar a entrega em domicílio de alimentos e todo tipo de coisas que poderíamos pedir, especialmente à noite e de madrugada. Apareceu brincando com a ideia da falsa “economia colaborativa”, quando ainda não se sabia que isso significava trabalhar em ocupações muito difíceis e com falsos autônomos mal remunerados.
É a típica empresa de plataforma que tudo o que tem é um software que permite colocar em contato os desejos imediatos de receber algo em casa com a necessidade de ganhar a vida, seja com o que for, de um grande número de jovens, muitos deles bem preparados, que não têm outras oportunidades de emprego em cidades tão avançadas como Barcelona. É difícil associar os esforçados “riders” que trabalham duro nas grandes cidades com os trabalhadores qualificados de empresas tecnológicas de referência. De fato, não o são.
A economia de plataforma somente resulta estelar nos resultados econômicos para seus proprietários e na linguagem sofisticada de escola de negócios que utilizam abundantemente para se justificar. Trabalhadores extremamente precários, mal remunerados e claramente pré-tecnológicos colocados para trabalhar em condições lamentáveis pelos novos “negreiros” da economia atual, que - até onde chegamos! -, muitas vezes, são colocados como exemplo de empreendedorismo e inovação, quando, de fato, sua atividade deveria ser adequadamente regulada do ponto de vista trabalhista, quando não claramente proibida por atentar contra a decência.
Cabe dizer, além disso, que muitas dessas empresas obtêm uma sobrevalorização em um mercado em que grandes investidores institucionais se esforçam para encontrar oportunidades de negócios. Foi exatamente o que aconteceu no final do século passado com a bolha das empresas chamadas “ponto.com”, infladas a partir do que não eram mais do que expectativas de negócio na fase inicial. Seu furo foi épico. Mas se existe algo que acostumamos a reiterar nessa vida, é a paspalhice. Seja neste digital ou no analógico.
O Instituto Humanitas Unisinos – IHU promove o XIX Simpósio Internacional IHU. Homo Digitalis. A escalada da algoritmização da vida, a ser realizado nos dias 19 a 21 de outubro de 2020, no Campus Unisinos Porto Alegre.
XIX Simpósio Internacional IHU. Homo Digitalis. A escalada da algoritmização da vida.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Unicórnios. Artigo de Josep Burgaya - Instituto Humanitas Unisinos - IHU