29 Novembro 2019
O cardeal arcebispo de Viena, Christoph Schönborn, contou sobre o confronto verbal que teve com o ex-secretário de Estado do Vaticano, Angelo Sodano, agora reitor do colégio cardinalício, em relação aos abusos sexuais contra menores.
A reportagem foi publicada por Askanews, 28-11-2019. A tradução é de Luisa Rabolini.
O episódio é conhecido, mas sempre foi cercado por uma áurea de confidencialidade. E, em vez disso, em uma palestra da Universidade de Viena, o cardeal revelou os detalhes do caso.
Schönborn entrou em contato com as vítimas de pedofilia em 1995, depois que seu antecessor, o cardeal Hans Hermann Groer, foi acusado de abusos. Nos três anos seguintes à sua nomeação, ele lembrou, ouviu seus testemunhos, e foi "traumático descobrir quanto o abuso sexual do clero está relacionado ao sacramento da Reconciliação e descobrir que muitas vezes começa no confessionário". No final, ele chegou à conclusão de que o que as vítimas haviam lhe dito era verdade. Em março de 1998, Schönborn e outros três bispos austríacos declararam publicamente que haviam chegado à "certeza moral" de que as acusações contra Groer estavam "substancialmente" corretas. Alguns meses depois, durante a visita periódica "ad limina" a Roma, os bispos austríacos criticaram a maneira como a Igreja havia (mal)recebido as denúncias contra Groer, no relatório preparado para o Papa, mas um bispo, Kurt Krenn, de Sankt Poelten, um firme defensor de Groer, acusou seus colegas bispos de mentir e ter montado uma armadilha.
"Eu experimentei a mesma situação na minha controvérsia com o cardeal Sodano, que literalmente disse na minha cara: ‘Vítimas? Isso que o que você diz!‘”
Era 2010, em pleno pontificado Ratzinger. Sodano, por ocasião das cerimônias da Páscoa, tomou a palavra na Praça de São Pedro para afirmar que as informações sobre os abusos sexuais contra menores perpetradas por padres pedófilos eram apenas "uma conversa". Em uma entrevista privada com alguns jornalistas, depois publicada, Schönborn expressou sua perplexidade com o que definiu de "ofensa pesada para as vítimas". Em junho, Schönborn foi convocado por Bento XVI, seu mentor no passado, e teve que expressar ao papa seu "descontentamento" com as interpretações dadas a algumas de suas declarações a respeito de Sodano, em uma audiência a portas fechadas à qual se juntaram posteriormente o próprio Sodano e seu sucessor como o Secretário de Estado, Tarcisio Bertone.
"Algumas pessoas no Vaticano mentiram", disse agora Schönborn. Eles humilharam as vítimas para proteger a Igreja, "mas a Igreja é melhor servida quando a verdade é revelada. 'A verdade vos libertará'".
Numa conferência de 50 minutos, contada no Tablet por Christa Pongratz-Lippitt, o arcebispo de Viena disse que depois de ouvir por mais de vinte anos as vítimas de padres abusadores, ele chegou à conclusão de que abuso sexual e espiritual - "mas principalmente o abuso do poder clerical "- é "uma enorme realidade" na Igreja católica.
Quanto a Bento XVI, ele preparou "um diagnóstico que não quero criticar, mas só quero corrigir apontando alguns números. Bento é da opinião de que o abuso sexual clerical tem sua origem no movimento de 1968. Os números da Áustria mostram uma imagem totalmente diferente". Em particular, na Áustria, 60% dos casos foram cometidos entre 1940 e 1969. O número caiu para 29% entre 1970 e 1979 e para meros 0,9% desde 2000. O fato de o a maioria dos abusos ocorridos antes do Concílio Vaticano II faz pensar, ressaltou Schönborn, que apontou o dedo para o sistema fechado que existia na Igreja antes do Concílio: "Nos sistemas fechados, o abuso ocorre com muito mais frequência do que nos abertos".
Nota de IHU On-Line:
Il Sismografo reproduz nota publicada em 28-06-2010:
Inédita declaração do Vaticano sobre a audiência concedida ao arcebispo de Viena. O Pontífice reitera que só cabe a ele mover críticas aos cardeais. Também participaram do encontro o secretário de Estado Tarcisio Bertone e seu antecessor Angelo Sodano, duramente atacado pelo prelado austríaco.
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Abusos da igreja, a denúncia de Schönborn: Sodano não acreditou em mim - Instituto Humanitas Unisinos - IHU