08 Mai 2019
O mais restrito Censo desde 1878 contribuirá para o aprofundamento da desigualdade, violência e miséria.
A reportagem é de Antônio C. Alkmim, publicada por CartaCapital, 08-05-2019.
Vivemos dias dos mais tristes para o IBGE em seus quase 83 anos de existência.
Nem a ditadura militar ousou tanto.
Demissão do diretor de Pesquisa. Quebra da autonomia técnica. Intervenção externa. Corte drástico do orçamento do Censo. Redução de um questionário fundamental para o diagnóstico social e demográfico do país e planejado há dois anos pelo corpo técnico. Proposta de redução inexplicável da amostra. Indicação de um diretor de Pesquisa de fora da Instituição, combinada com a emergência de um personagem que viveu no lusco-fusco técnico e de poder há mais de 30 anos no Instituto e que se presta a assumir a diretoria de Informática, ao mesmo tempo em que passa a deter o controle operacional da pesquisa.
Resumindo, violação incondicional do que dita a missão do Instituto: “Retratar o Brasil com informações necessárias ao conhecimento de sua realidade e ao exercício da cidadania.”
Coisa para o Ministério Público e para o TCU.
O Censo proposto pelo governo Bolsonaro, que já manifestou pessoalmente seu descontentamento e desprezo pelo IBGE, assim como o ministro Guedes, coloca-se no quadro da destruição do país.
Um presidente que chafurda na sua total ignorância conceitual e metodológica a respeito do substantivo denominado desemprego.
Um ministro mercador e tresloucado que, na posse da presidente, propôs vender prédios para fazer o Censo e afirmou que as mudanças propostas para a realização da pesquisa obedecem ao mesmo critério da democratização da telefonia celular para prostitutas.
É a mesma lógica que vem sendo observada na condução da política nacional na área da educação com os cortes orçamentários, na cultura, no meio ambiente, na agricultura agrotóxica, na previdência social, na venda dos ativos nacionais, nas relações internacionais, na fissura ideológica, astrológica e militar provocada por um inexplicável guru, radicado nos EUA, no massacre contra segmentos sociais como mulheres, negros, índios, homossexuais, idosos, trabalhadores desempregados, desalentados, precarizados, nas favelas, que vivem neste momento sob sistemáticas chuvas de tiros difusos de metralhadora, nas áreas dominadas pelas milícias, com seu poder incontido, na corrupção ativa, que passou a ser novamente posta para baixo do tapete.
Um quadro aterrorizador, mas coerente, promovido por uma elite predatória, promotora do caos.
Fazer o Microcenso, como o proposto pela presidente do IBGE, Suzana Cordeiro, será o mais restrito e pior Censo desde 1878, quando foi realizado, ainda no império, e pela primeira vez.
Não se trata tão somente de contrariar as rígidas orientações e práticas do Sistema Estatístico Internacional, seguidas até aqui, nem o ritual de planejamento e testes até o momento executado pelos envolvidos diretamente no Censo, mas, principalmente, jogar o país em um apagão estatístico, na mais profunda escuridão da desinformação, em um mundo onde a informação vale mais do que a moeda. E o Não Censo ajudará a aprofundar as condições de um país indigente, miserável, injusto, desigual, violento, antidemocrático.
Cego.
Destituído da sua enorme vocação e potencial para o desenvolvimento econômico, social e cultural.
Se a sociedade não se der conta do que está acontecendo neste momento, não veremos e não teremos país nenhum.
E a responsabilidade será de todos nós.
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As mudanças propostas para o Censo jogarão o país em um apagão - Instituto Humanitas Unisinos - IHU