09 Abril 2019
O Papa Francisco não podia ter dado um presente maior para todos, no caminho de toda a comunidade eclesial rumo ao Sínodo sobre os jovens, em Roma de 3 a 28 de outubro. Com este extraordinário livro-entrevista “Deus é jovem” (Ed. Planeta), o pontífice argentino, mais uma vez, tenta aquecer os corações de todos – mas precisamente de todos, dentro e fora da Igreja – em relação às gerações mais jovens. Em relação aos jovens, justamente.
O comentário é do teólogo e padre italiano Armando Matteo, professor de teologia fundamental da Pontifícia Universidade Urbaniana, publicado no sítio Settimana News, 03-04-2018. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Não por acaso, pensamos, o lançamento mundial do livro ocorreu durante a Reunião pré-sinodal dos jovens, realizada em Roma de 19 a 24 de março e que concluiu com a entrega nas mãos de Francisco de um Documento, que reúne as expectativas, os sonhos, as dificuldades, as dúvidas e as perguntas das novas gerações, a partir das quais começa a discussão dos bispos de outubro.
Para melhor situar esse segundo livro do papa – depois do muito bem-sucedido “Deus é misericórdia” – parece-nos oportuno relatar aqui uma passagem do discurso com o qual ele inaugurou justamente a Reunião pré-sinodal que acabamos de mencionar.
Naquele discurso, o Papa Francisco recordou que a comunidade eclesial hoje, mais do que nunca, precisa de um “renovado dinamismo juvenil”, e, precisamente para esse fim, é urgente que ela se ponha “à escuta de todos os jovens, sem excluir ninguém. E isso não para fazer política. Não por uma artificial ‘jovem-filia’, não, mas porque precisamos entender melhor o que Deus e a história estão nos pedindo. Se vocês [jovens] faltarem, falta-nos uma parte do acesso a Deus”.
Esse livro-entrevista realiza exatamente esse desejo, profundamente. O entrevistador, Thomas Leoncini, é precisamente um jovem e, nas suas perguntas afiadas, ressoa toda a beleza e toda a inquietação da geração a que ele pertence.
Indo mais diretamente a “Deus é jovem”, o texto começa com uma tocante introdução de Leoncini, na qual ele relembra o projeto bergogliano de uma extraordinária revolução da ternura. Depois, seguem-se três capítulos: o primeiro dedicado aos “Jovens profetas e velhos sonhadores”; o segundo se concentra “Neste mundo”; o terceiro, por fim, toca no assunto de “Ensinar é aprender”.
Cada leitor e cada leitora encontrará nas páginas dessa entrevista as passagens mais adequadas para a sua vida ou para a sua reflexão pessoal sobre o universo das novas gerações. No entanto, continua sendo central a imagem poderosa que o próprio título evoca: “Deus é jovem”. Queremos dedicar-lhe uma atenção especial.
Na página 67 [na edição em português], a certa altura, o Papa Francisco cita um trecho do texto bíblico do Apocalipse, no qual está escrito:
“Aquele que estava sentado no trono disse: Eis que faço novas todas as coisas”. Depois, fortemente inspirado, acrescenta: “Deus é Aquele que sempre renova, porque Ele é sempre novo: Deus é jovem! Deus é o Eterno que não tem tempo, mas é capaz de renovar, rejuvenescer-se continuamente e rejuvenescer tudo. As características mais peculiares dos jovens também são Suas. Ele é jovem porque ‘faz todas as coisas novas’ e ama a novidade; porque se encanta e ama o êxtase; porque sabe sonhar e deseja os nossos sonhos; porque é forte e entusiasmado; porque constrói relacionamentos e nos pede para fazer o mesmo, é social. Penso na imagem de um jovem e vejo que ele também tem a possibilidade de ser ‘eterno’, empenhando toda a sua pureza, sua criatividade, sua coragem, sua energia.”
Quão precioso agora é trazer à tona tal afinidade eletiva que liga Deus e os jovens! E é isso mesmo. De fato, os jovens são iuvenes (de iuvare/ajudar) justamente porque têm força, têm faro para a novidade, têm prontidão de espírito, têm – diz ainda o Papa Francisco no texto – asas, têm espírito profético, têm criatividade. Têm e são potência.
Uma sociedade, portanto, que não faça todo o possível para valorizá-los se autocondena ao suicídio. E esse é o ponto de maior denúncia do livro: a nossa sociedade é de adultos que se esqueceram de que as potencialidades quase “divinas” do mundo juvenil são potencialidades com prazo, com vencimento, e que cabe às gerações já presentes criar as condições para que elas entrem o mais rápido possível em ação pelo bem de todos.
E, em vez disso, denuncia o Papa Francisco, “os adultos muitas vezes são cruéis e isolam toda essa força dos jovens” (p. 38). No já citado discurso inaugural da Reunião pré-sinodal, o pontífice esclareceu ainda mais tal “crueldade” adulta:
“Parece-me que estamos cercados por uma cultura que, se, por um lado, idolatra a juventude tentando não a deixando passar nunca, por outro, exclui muitos jovens de serem protagonistas. É a filosofia da maquiagem. As pessoas crescem e tentam se maquiar para parecerem mais jovens, mas não deixam os jovens crescerem.”
Precisamente para sair desse terrível beco sem saída no qual a sociedade adulta de hoje parece ter caído, para o Papa Francisco, é preciso a já citada revolução da ternura que consegue reunir os jovens e a outra geração hoje objeto de escassez: a geração dos idosos.
Mais uma passagem do livro. Estamos nas páginas 40-41:
“Penso que maneira forte de nos salvar seja o diálogo, o diálogo dos jovens com os idosos: uma interação entre velhos e jovens, inclusive ignorando, temporariamente, os adultos. (...) Existe uma passagem na Bíblia (Joel 3, 1) que diz: ‘Vossos anciãos terão sonhos e vossos jovens terão visões’. Mas nossa sociedade descarta ambos, descarta os jovens do mesmo modo que descarta os velhos. No entanto, a salvação dos idosos é dar aos jovens a memória. Isso torna os velhos verdadeiros sonhadores de futuro, enquanto a salvação dos jovens é pegar essas lições, esses sonhos, e levá-los adiante com a profecia. (...) Os velhos sonhadores e os jovens profetas são o caminho da salvação desta nossa sociedade desenraizada: duas gerações de descartados podem salvar a todos. Tudo isso está ligado ao que chamo de revolução da ternura.”
A esse projeto ideal de salvação, o pontífice sempre acompanha um apelo concreto – e, desta vez, dirigido justamente aos adultos que detêm as rédeas da sociedade – para que se encontra o mais rápido possível o modo de assegurar verdadeiras oportunidades de trabalho, de emprego, aos jovens. Por uma questão de dignidade, por uma questão de justiça, por uma questão de humanidade.
No livro, também não faltam palavras fortes para os homens e para as mulheres da Igreja, chamados a se “revestirem” somente do amor de Cristo e do próximo, a verdadeira força evangelizadora de todos os tempos e para todas as gerações. Assim afirma o papa nas páginas 36-37:
“Estou fortemente convencido da importância da sobriedade na vida da Igreja: os homens e mulheres da Igreja deveriam revestir-se somente daquilo que pode servir para a experiência da fé e de amor ao povo de Deus e despojar-se do supérfluo. É melhor ter os bolsos vazios, porque o diabo sempre habita em bolsos cheios; na verdade, se ele entra em nossa vida, passa pelo bolso.”
É verdade, permanece um pouco no pano de fundo das temáticas abordadas a questão da dificuldade de crer que hoje também distingue o mundo juvenil, que, justamente, custa simplesmente a imaginar um futuro para as próprias potencialidades e alguma potencialidade para o próprio futuro.
Além disso, o verdadeiro centro de atenção de Francisco são os jovens e, a eles, recorrendo de mãos cheias à sua experiência pessoal e ao grande tesouro do seu coração de pastor, ele dirige palavras de sabedoria, de encorajamento e de infinita ternura.
O que permanece, como eco profundo da leitura desse livro, é precisamente o fato muito evidente de que os jovens estão no coração de Francisco. E é exatamente essa a aposta verdadeira do Sínodo de outubro: renovar um amor e um interesse verdadeiros e sinceros pelos jovens. Dentro e fora da Igreja.
Afinal, só o amor pelos jovens – não pela juventude – salvará o mundo!
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Francisco: ''Deus é jovem'' - Instituto Humanitas Unisinos - IHU