22 Junho 2018
Em 2015, Francisco disse a um grupo de vítimas: “Prometo a vocês que seguiremos o caminho da verdade”.
A reportagem é de Luis Badilla, publicada em Il Sismografo, 21-06-2018. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Até poucos anos atrás, parecia não só impossível, mas também impensável que o papa tomasse a decisão de “suspender” as faculdades e as prerrogativas de um cardeal por estar sob processo. E mais: podia ser ainda mais fantasioso e quase delirante imaginar que esse processo pudesse envolver comportamentos sexuais impróprios, com menores de idade ou adultos.
Porém, ao longo de cinco anos, de 2013 a 2018, isso aconteceu antes com o purpurado da Escócia, Keith Michael Patrick O’Brien, falecido em 19 de março passado (80 anos), e agora com o emérito de Washington, Theodore Edgar McCarrick (88 anos).
Isso demonstra ou ao menos enfatiza aos olhos nem sempre muito atentos da opinião pública, incluindo aquela existente dentro da Igreja, que, querendo, nos casos necessários, existem os mecanismos, os recursos e as pistas eclesiais e institucionais – além dos princípios jurídicos – para reagir prontamente por parte das máximas hierarquias.
Nesses dois casos, muito dolorosos para os católicos, também se pode observar com satisfação, algo que não acontece na grande maioria das situações de abuso na Igreja, que também se reagiu com transparência diligente, sem ocultar ou manipular nada, dando à imprensa apenas a mínima informação necessária.
Ao mesmo tempo, esses dois casos também podem ajudar a entender como é grave ou, melhor, gravíssima a questão dos abusos sexuais na Igreja. O fato de acusações dessa natureza dizerem respeito e envolverem dois purpurados, chamados por definição para fazer parte do corpo eleito daqueles que devem garantir à Igreja de Cristo a sucessão de Pedro, torna tudo ainda mais inquietante e doloroso.
Na bela entrevista que o Papa Francisco concedeu a Philip Pullella, da Reuters, divulgada amplamente nessa quarta-feira, 20, falando sobre a Igreja no Chile, o Santo Padre disse:
“Eu não gosto de falar disto agora, mas devo dizer. Vão às estatísticas. A grande maioria dos abusos ocorre no âmbito familiar e nos bairros, os vizinhos, as famílias, depois nas academias, nas piscinas, nas escolas e também na Igreja, mas alguns podem dizer que (os padres) são poucos, mas, mesmo que fosse um só, seria trágico porque esse padre tem o dever de levar essa pessoa a Deus e destruiu o caminho para chegar a Deus. Nisso, não me importam as estatísticas, é um drama geral que a sociedade deve olhar mais, assim como para o modo como gere esse problema. Vamos para a Igreja. Isso eclodiu, claramente, nos tempos de Boston, digamos assim. Não se geria bem. Nós sabemos que as pessoas eram transferidas daqui para lá, porque não havia a consciência da gravidade disso. Mas a Igreja despertou, e a lição que eu aprendi não é original. São João Paulo II a havia aprendido com os cardeais dos Estados Unidos no caso de Boston. Bento XVI a havia aprendido com os bispos da Irlanda. Eu tive que tomar uma decisão. Como foi a questão no Chile? Eu estudei as coisas, as denúncias, com as informações que havia aqui. Fiz com que estudassem, me ajudaram, e procedi de acordo com isso.”
Em 27 de setembro de 2015, na Filadélfia, ao se encontrar com um grupo de vítimas de abusos, o papa disse:
“Meus queridos irmãos e irmãs em Cristo! Agradeço por esta oportunidade de encontrar vocês: sinto-me abençoado pela presença de vocês. Obrigado por terem vindo aqui hoje. As palavras não conseguem expressar plenamente a minha tristeza pelos abusos que vocês sofreram. Vocês são filhos preciosos de Deus, que sempre deveriam esperar a nossa proteção, o nosso cuidado e o nosso amor. Lamento profundamente que a inocência de vocês foi violada por aqueles em quem confiavam. Em alguns casos, a confiança foi traída por membros da própria família de vocês; em outros casos, por padres que têm a responsabilidade sagrada do cuidado das almas. Em todas as circunstâncias, a traição foi uma terrível violação da dignidade humana. Quanto àqueles que foram abusados por um membro do clero, lamento profundamente todas as vezes em que vocês ou suas famílias se pronunciaram para denunciar os abusos, mas não foram escutados ou acreditados. Saibam que o Santo Padre escuta e acredita em vocês. Lamento profundamente que alguns bispos falharam na sua responsabilidade de proteger os menores. É muito perturbador saber que, em alguns casos, os próprios bispos foram os abusadores. Comprometo-me a seguir o caminho da verdade, aonde quer que ele possa levar. O clero e os bispos terão de prestar contas das suas ações, quando abusem ou deixem de proteger os menores.”
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Do caso O’Brien ao de McCarrick, dois cardeais de João Paulo II ''suspensos'' pelo Papa Francisco - Instituto Humanitas Unisinos - IHU