30 Novembro 2017
"Decrescimento não é sinônimo de “crescimento negativo” ou “recessão”. Por exemplo, quando se troca as lâmpadas incandescentes por lâmpadas de LED, há uma diminuição do gasto de energia, sem perda de acesso de qualidade à energia elétrica. O decrescimento é compatível com qualquer tipo de organização social que se propõe a reduzir a entropia" escreve José Eustáquio Diniz Alves, doutor em demografia e professor titular do mestrado e doutorado em População, Território e Estatísticas Públicas da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE, em artigo publicado por EcoDebate, 29-11-2017.
“Acreditar que o crescimento econômico exponencial pode continuar infinitamente num mundo finito é coisa de louco ou de economista” Kenneth Boulding (1910-1993)
O desenvolvimento econômico chegou a uma encruzilhada e a ideia de um desenvolvimento sustentável virou um oximoro. Desde que a humanidade ultrapassou a capacidade de carga do Planeta o crescimento da produção de bens e serviços, quando contabilizado as agressões ao meio ambiente, virou um “crescimento deseconômico”, como mostrou Herman Daly. Nenhuma indústria seria lucrativa se tivesse de pagar pelo capital natural.
O progresso humano ocorreu de forma lenta na maior parte da história, mas adquiriu uma dimensão exponencial nas últimas sete décadas, com a aceleração das atividades antrópicas do pós-guerra. Incentivada pela busca frenética do lucro na economia capitalista, pelo petróleo barato e pelo desenvolvimento tecnológico, a expansão da produção de bens e serviços contribuiu para uma melhoria significativa na qualidade de vida de bilhões de pessoas. Houve redução da miséria e dos níveis de pobreza, assim como a melhoria dos indicadores de saúde, de educação e de bem-estar.
Porém, o crescimento econômico ocorreu com base no uso insustentável de recursos não-renováveis, na redução da biodiversidade, na concentração de dióxido de carbono na atmosfera e na acidificação dos oceanos, além de ter gerado fossos cada vez maiores entre ricos e pobres. Com o aprofundamento do processo de globalização, avistam-se graves crises ambientais e sociais, enquanto a trajetória da própria economia também apresenta sinais de exaustão do modelo hegemônico.
A ciência já determinou de forma incontestável que várias fronteiras ecológicas globais estão sendo ultrapassadas, abrindo a probabilidade de transformações bruscas e incontroláveis na esfera planetária se não houver mudanças significativas e urgentes na trajetória da nossa civilização. O atual momento histórico, marcado por profundas crises ecológicas, econômicas e sociais, exige repensar essa situação à luz dos limites sendo impostos pela própria natureza.
Celso Furtado, no livro, “O mito do desenvolvimento econômico”, de 1974, pergunta o que acontecerá se o desenvolvimento econômico se universalizar e responde de forma clara: “se tal acontecesse, a pressão sobre os recursos não renováveis e a poluição do meio ambiente seriam de tal ordem (ou alternativamente, o custo do controle da poluição seria tão elevado) que o sistema econômico mundial entraria necessariamente em colapso” (Furtado,1974, p. 19).
Furtado tinha razão, pois nos últimos 50 anos a Pegada Ecológica ultrapassou a Biocapacidade do Planeta e a humanidade já utiliza cerca de 1,7 planeta para manter o seu padrão de vida. O progresso humano ocorre às custas do regresso ambiental. Mas sem ECOlogia não há ECOnomia.
Portanto, o mundo precisa diminuir as atividades antrópicas para caber dentro da capacidade de carga do Planeta. Ou dito de outra forma: precisa reduzir a pegada ecológica para caber na biocapacidade do Planeta. Ou ainda: precisa reduzir as atividades demoeconômicas para não ultrapassar as fronteiras planetárias.
Decrescimento não é sinônimo de “crescimento negativo” ou “recessão”. Por exemplo, quando se troca as lâmpadas incandescentes por lâmpadas de LED, há uma diminuição do gasto de energia, sem perda de acesso de qualidade à energia elétrica. O decrescimento é compatível com qualquer tipo de organização social que se propõe a reduzir a ENTROPIA.
É possível haver decrescimento das atividades mais poluidores e degradadoras do meio ambiente, gerando emprego e renda e sem travar o desenvolvimento tecnológico, caso se altere o padrão de produção e consumo, conforme mostram os exemplos abaixo:
1) Dieta Vegetariana: a mudança de uma dieta cárnea para uma dieta vegetariana (ou vegana) pode reduzir a pegada ecológica, pois a pecuária é uma atividade muito poluidora, que provoca desmatamento e emite grande quantidade de gás metano;
2) Mudança da matriz energética: o fim do uso dos combustíveis fósseis (grandes emissores de CO2) e o uso de 100% de energias renováveis pode gerar empregos e renda ao mesmo tempo que se reduz a pegada energética;
3) Transição da indústria automobilística: do motor a combustão para o motor elétrico e o surgimento do carro autônomo e compartilhado. A produção de automóveis particulares pode cair, reduzindo os engarrafamentos e aumentando a satisfação dos consumidores.
O sistema de produção e consumo hegemônico (capitalista ou socialista) não consegue ser, ao mesmo tempo, economicamente inclusivo, socialmente justo e ambientalmente sustentável. Por isto é pouco provável que a continuidade do crescimento das atividades antrópicas mantenha de pé as três bases do tripé da sustentabilidade, que na verdade se transformou em um trilema. De fato, só o decrescimento demoeconômico poderá garantir o equilíbrio homeostático da economia e do ambiente. Para aprofundar nessa discussão, vejam as referências abaixo:
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O trilema da sustentabilidade e o decrescimento demoeconômico - Instituto Humanitas Unisinos - IHU