09 Novembro 2017
Desde o dia 16 de outubro, está nas livrarias [italianas] o novo livro de Marco Vergottini, teólogo ambrosiano e sócio da Ação Católica, Il cristiano testimone. Congedo dalla teologia del laicato [O cristão testemunha. Despedida da teologia do laicato, em tradução livre].
A entrevista foi publicada por revista da Azione Cattolica Ambrosiana, de novembro de 2017. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
O texto consiste em uma verdadeira pesquisa, que afunda as suas origens no interesse do próprio autor pela figura do leigo, amadurecida na Ação Católica em Milão. O livro apresenta na abertura um prefácio do bispo de Novara, Dom Franco Giulio Brambilla, que abre a contribuição assim: “A obra de Marco Vergottini, que temos em mãos, apresenta-se na veste de uma quaestio disputata sobre um dos temas que mais marcaram a eclesiologia do Vaticano II e foi retomado várias vezes na teologia seguinte. O leigo, de fato, foi o convidado de pedra para um profundo repensamento da doutrina do Concílio sobre a Igreja, embora seja bem-sabido que as discussões mais candentes ocorreram sobre a relação entre primado e episcopado. No pós-conselho, o leitmotiv foi ‘acelerar a hora dos leigos’, um slogan tão retoricamente proclamado quanto praticamente pouco explorado”.
Falamos sobre isso com o autor.
“O meu primeiro estudo sobre a bibliografia dos leigos apareceu em uma coletânea de contribuições intitulada Laicità e vocazione dei laici nella Chiesa e nel mondo [Laicidade e vocação dos leigos na Igreja e no mundo, em tradução livre], publicada há 30 anos, editada pelo Centro de Estudos da Ação Católica de Milão, coordenado por Antonietta Cargnel.”
“O Pe. Franco Giulio capta pontualmente o ‘coração’ da proposta. A minha intenção é justamente focar a figura do fiel leigo – categoria à qual a Ação Católica, durante os seus 150 anos de história, dedicou com paixão a sua reflexão teológica e o seu apostolado. Basta pensar na contribuição de Giuseppe Lazzati, Vittorio Bachelet, Alberto Monticone, Paola Bignardi, para citar apenas alguns nomes.”
“Pois bem, a minha solicitação – um pouco provocativa – é que, talvez, os muitos estudos sobre o laicato privilegiaram o quarto capítulo da Lumen gentium, dedicado aos fiéis leigos, e o decreto sobre o apostolado dos leigos (Apostolicam actuositatem), pondo um pouco na surdina o capítulo II da Lumen gentium, em que se foca a realidade da Igreja como povo de Deus. Nesse sentido, tentei mostrar como a noção de cristão é mais radical e densa do que a de leigo.”
A sua proposta provoca positivamente a Ação Católica, que desde sempre, desde antes do Concílio, insistiu fortemente na figura do leigo e na sua índole secular.
Se repassarmos a monumental produção literária do cardeal Martini, debatemo-nos com um uso, no fim das contas, comedido e contido da expressão “leigos”, para indicar os fiéis cristãos comuns. O que, por si só, é um sinal de uma escolha intencional, nada acidental. Em uma intervenção de 1969, o padre Martini fazia-se uma dupla interrogação: “O que significa dizer ser cristão? O que significa testemunhar Cristo no mundo de hoje?”, instituindo uma perspicaz correspondência entre cristão e testemunha (agora em C. M. Martini, Cristiani coraggiosi. Laici testimoni nel mondo di oggi. Milão: In Dialogo, 2016, p. 35). Em suma, se poderia concluir que o leigo nada mais é do que o “cristão testemunha”.
Voltemos ao Vaticano II. Como você justifica o fato de que a categoria de “leigo” pode ser traduzida na de “cristão testemunha”, se é verdade que, no Concílio, o termo “leigo” retorna em nada menos do que 14 dos 16 textos promulgados?
No meu livro, eu tento mostrar que o efetivo incremento da perspectiva do Vaticano II sobre o assunto não deve ser encontrado no capítulo IV da Lumen gentium, onde a “secularidade” é apresentada como uma nota qualificativa do fiel leigo (uma abordagem que, de fato, constitui uma retomada mitigada das teses da tradicional “teologia do laicato”), nem no decreto sobre os leigos, Apostolicam actuositatem.
A verdadeira novidade do Vaticano II é constituída mais pela insistência com que os Padres conciliares pretenderam propiciar aos fiéis leigos a consciência de terem que sair de uma condição de efetiva minoria em relação aos ministros ordenados e àqueles que abraçaram a vida religiosa: por um lado, de fato, com o Concílio, assiste-se a uma reintegração de cada batizado dentro do quadro de uma pertença eclesiástica mais igualitária e participativa; por outro, em cada momento e situação da vida comum – no plano das relações familiares, profissionais, civis e políticas –, os fiéis comuns são chamados a redescobrir a qualidade espiritual da experiência de fé.
Coerentemente, é preciso se perguntar se uma autêntica hermenêutica da lição conciliar – cujo núcleo é o ensinamento do caráter histórico da revelação, da dimensão experiencial do crer, do processo de inculturação que distingue a realidade da fé cristã e da Igreja como povo (histórico) de Deus – não solicita que a consciência crente abandone as vestes daquela representação essencialista, fixista, intelectualista do dado cristão, dentro do qual se origina a ilusão de quase poder isolar in vitro a “quintessência” do leigo.
Então, você propõe superar a temporada da “teologia do laicato” e “arquivar” a expressão leigo?
Precisamente! Basta pensar apenas que, a partir da pesquisa etimológica sobre os primeiros séculos do cristianismo, emerge que o termo laikos não designa, de fato, o “membro do povo de Deus”, mas sim o súdito, aquele que é submetido à hierarquia. A novidade do meu estudo – que eu certamente gostaria que pudesse se tornar objeto de discussão não apenas por parte do estreito círculo dos especialistas, mas também no âmbito da Ação Católica, da qual eu me orgulho de aderir desde sempre – está na proposta de “historicizar” o termo e a figura do leigo, para desencadear um repensamento radical da questão, em vista de uma reorganização factual da sistemática teológica e da teologia prática, deixando florescer um promissor e sugestivo relançamento na noção teológico-fundamental de cristão-testemunha.
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Leigo? Não, cristão testemunha. Entrevista com Marco Vergottini - Instituto Humanitas Unisinos - IHU