06 Dezembro 2016
“Há muito mais qualidades nos princípios religiosos do que os que são unicamente políticos, apesar de que estes se referem aos ideais materiais e físicos da vida. Também muitas das obras artísticas mais inspiradas nasceram de pessoas religiosas, um fenômeno de caráter universal”. A quem lhe ocorreria pensar que o líder máximo da revolução cubana, Fidel Castro, seria capaz de falar deste modo? O homem que simbolizou o socialismo real na América Latina, que abandonou a fé cristã para abraçar o ateísmo marxista retornou, de alguma maneira, sobre seus passos. Mas não com uma verdadeira conversão, disse ao Vatican Insider o dominicano Frei Betto, teólogo brasileiro muito próximo a Castro, com quem o presidente cubano escreveu um livro dedicado à sua relação com a religião.
A reportagem é de Andrea Tornielli e publicada por Vatican Insider, 02-12-2016. A tradução é de André Langer.
“A última vez que encontrei Fidel foi em agosto, por ocasião do aniversário dos seus 90 anos – disse-nos –, e manifestava curiosidade e interesse pela religião, embora não estivesse em ação, conforme pude constatar, nenhuma conversão. Posso excluir que na última fase da sua vida tenha desejado contar com a assistência de um sacerdote”. Depois de deixar claro esta questão, para que não haja equívocos, Frei Betto explicou que a atenção de Fidel pela religião tem uma origem antiga. “Ele estudou com os jesuítas e com os irmãos lassalistas – acrescentou –, como quis recordar em seu último artigo, que é quase um testamento. Quando era jovem ia à missa, mas depois abandonou o cristianismo porque a Igreja dessa época apoiava as ditaduras de Salazar em Portugal e de Franco na Espanha”.
Depois de se tornar ateu e ter incluído o ateísmo no estatuto do Partido Comunista Cubano, “Fidel, pouco a pouco foi se transformando em um agnóstico – disse Frei Betto. Assim, o ateísmo caiu do estatuto e o Partido agora é laico. Nos últimos anos, Castro estava muito interessado na cosmologia e na astrofísica. Um dia lhe contei a frase que ouvi em um filme sobre o astrofísico britânico Stephen Hawking. O futuro cientista, na universidade, encontra-se com uma moça que depois se converteu em sua esposa e a ela, que lhe pergunta o que era a cosmologia, lhe respondeu: ‘uma religião para ateus inteligentes’. Perguntei a Fidel se era isso também para ele. Ele sorriu e não disse nada”.
A verdade é que surpreendem as palavras do artigo que o jornal Granma publicou em 9 de outubro passado, com esse elogio “dos princípios religiosos”. É o último artigo que Castro escreveu em vida, embora no texto, imediatamente após citar a religião e especificamente o cristianismo, o autor prometia transmitir “em outro momento mais algumas ideias sobre este singular problema”.
Fidel expressa surpresa e encanto diante da possibilidade de ver a luz de estrelas que viajaram 12 bilhões de anos a uma velocidade de 300 quilômetros por segundo, antes de chegar à Terra. “Uma insólita medalha de ouro! Como se pode explicar isso?”, pergunta-se, relacionando este olhar sobre o espaço e o mistério do universo com a religião. “Para além desses limites – termina o último artigo de Castro –, o que se conhece tem sabor de antigas tradições que distintos grupos humanos foram forjando. De Cristo conheço bastante pelo que li e me ensinaram nas escolas dirigidas por jesuítas ou pelos irmãos lassalistas, dos quais escutei muitas histórias sobre Adão e Eva, Caim e Abel, Noé e o dilúvio universal e o maná que caía do céu quando, por causa da seca ou outras causas, havia falta de alimentos”.
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As perguntas de Fidel sobre o universo e a fé - Instituto Humanitas Unisinos - IHU