29 Mai 2017
O Papa Francisco chamou a atenção para o fato de que o conceito utilizado pelo macrismo pode transformar-se na “legitimação ética da desigualdade”. Além disso, criticou o sistema político que “favorece a especulação”.
A reportagem é publicada por Página/12, 27-05-2017. A tradução é de André Langer.
Desta vez, o Papa Francisco não recebeu nem enviou carta a nenhuma liderança da Argentina, mas ratificou, no sábado, um posicionamento que bem pode ter leituras políticas fronteiras adentro do país. Ainda mais às vésperas das eleições legislativas, cujo resultado pode ser determinante para o aprofundamento ou o freio ao ajuste implementado pelo presidente Mauricio Macri: ele criticou a ideia da meritocracia e pronunciou-se contra aqueles que favorecem a especulação.
Francisco reiterou sua posição em um encontro com trabalhadores, no início de uma visita pastoral a Gênova, que se prolongou por todo o sábado. Nesse contexto, ele usou uma expressão que remete ao presente argentino: meritocracia. Criticou o conceito da cultura da “meritocracia, porque usa uma palavra bonita, o mérito, mas está se transformando em uma legitimação ética da desigualdade”. E foi categórico ao afirmar que “quem pensa em resolver os problemas de sua empresa demitindo trabalhadores não é um bom empresário; é um comerciante: hoje vende seus trabalhadores, amanhã vende sua própria dignidade”.
Justamente o governo do Mudemos instalou a ideia da “meritocracia” como valor em um contexto de demissões e diminuição do aparelho produtivo, e com taxas de juros altas que favorecem a especulação e a chamada “bicicleta financeira”. “Paradoxalmente, algumas vezes o sistema político parece favorecer aquele que especula com o trabalho e não aquele que investe e acredita no trabalho”, assegurou o Papa fazendo alusão aos governos que estimulam práticas especulativas.
Jorge Bergolio mostrou-se emocionado ao recordar que do porto de Gênova partiu seu pai, em 1929, rumo à Argentina, em um discurso em que reivindicou o trabalho e a produção acima da especulação financeira. “Quando uma economia é habitada por bons empresários, as empresas são amigas das pessoas e dos pobres. Quando, em vez disso, passam às mãos dos especuladores, tudo piora. Com eles a economia perde os rostos, é uma economia abstrata. Por trás das decisões não há pessoas e, portanto, não se veem as pessoas que são demitidas”, disse ao visitar a fábrica Ilva.
“O trabalho é o centro de cada contrato social, não um meio para consumir. Devemos amar o trabalho, é um amigo da oração, está presente na Eucaristia. Um mundo que não entende o trabalho, não entende a Eucaristia. O trabalho é dignidade e, por isso, todos devem tê-lo”, concluiu o Papa, que, em seguida, almoçou com 11 presos no Santuário de Nossa Senhora da Guarda.
Francisco seguiu demarcando sua linha econômica e advertiu que “uma doença da economia é a progressiva transformação dos empresários em especuladores. Não devemos confundi-los, são duas figuras diferentes. O especulador é uma figura similar àquela que Jesus, no Evangelho, chama de ‘mercenário’”. Considerou que “devemos ter medo dos especuladores e não dos empresários”.
Nota de IHU On-Line: Para ver a íntegra do encontro do Papa Francisco com os trabalhadores e as trabalhadoras em Gênova, em italiano, assista ao vídeo:
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Francisco em Gênova. Contra a especulação e a meritocracia - Instituto Humanitas Unisinos - IHU