Por: Nicolas Nobrega, Guilherme Tenher e Marilene Maia | 29 Novembro 2019
O Dia Internacional de Combate à Violência Contra a Mulher foi mais uma vez lembrado no dia 25 de novembro. A violência de gênero é um fator ainda muito presente nos diferentes territórios e realidades do país e do mundo. No Rio Grande do Sul, entre janeiro e outubro deste ano, houve o registro de 49 mil casos de violência contra a mulher, sendo 19 mil localizados nos 34 municípios da Região Metropolitana de Porto Alegre - RMPA. Esta data e estes dados são importantes elementos de aprofundamento do debate sobre a urgência de formulação, de execução, de monitoramento e de avaliação de políticas públicas que respondam aos desafios desta realidade e de todos os seus determinantes.
Com o intuito de contribuir para este debate, O Observatório da realidade e das políticas públicas do Vale do Rio dos Sinos - ObservaSinos, programa do Instituto Humanitas Unisinos - IHU, acessou os indicadores de violência contra a mulher da Secretaria de Segurança Pública do estado do Rio Grande do Sul com informações de janeiro a outubro de 2019.
O estado registrou 49.277 ocorrências entre casos de ameaça, lesão corporal, estupro, feminicídio consumado e tentado nos meses de janeiro a outubro. Isto equivale a aproximadamente 4.928 casos por mês, 164 vítimas por dia e 7 mulheres violentadas por hora.
Deste total, 30.729 ou 62% das ocorrências estão relacionadas ao crime de ameaça, 16.828 ou 34% são de lesão corporal, 1.351 estupros (3%), 82 feminicídios consumados (0,2%) e 287 feminicídios tentados (0,6%).
Entre casos de ameaça, lesão corporal, estupro, feminicídio consumado e tentado, a Região Metropolitana de Porto Alegre registrou 19.046 ocorrências entre janeiro e outubro deste ano. Isto equivale a aproximadamente 1.905 casos por mês, 64 vítimas por dia e 3 mulheres que sofreram violência a cada hora.
Neste período a região metropolitana registrou 11.264 casos de ameaça envolvendo vítimas do sexo feminino. 6.280 ou 55,7% destas ocorrências estão contabilizadas entre maio e outubro. Porto Alegre se destaca por concentrar 30% dos casos da região, isto é, 3.370 casos até outubro deste ano.
Observa-se um aumento de 21% no número de ocorrências de lesão corporal entre os meses de maio e outubro, passando de 597 para 721 casos. Se somados os registros desta natureza para os dez meses em questão, obtêm-se 7.004 alertas. Alvorada (316), Gravataí (404), São Leopoldo (358) e Viamão (424) concentraram 21% dos casos da região, já Porto Alegre (2.862) e Canoas (608), sozinhos, contabilizaram 49,5% das ocorrências.
Aproximadamente 2 casos de estupro por dia foram registrados na região metropolitana. Em termos absolutos, foram 630 ocorrências desta natureza entre os meses de janeiro e outubro. 527 deste total ou 84% dos casos se aglomeraram em apenas 8 dos 34 municípios da região. São eles: Alvorada (55 casos), Canoas (74), Gravataí (39), Novo Hamburgo (38), Porto Alegre (207), São Leopoldo (31), Sapucaia do Sul (20) e Viamão (63 casos).
Por fim, observam-se 148 casos de feminicídio na região, sendo 17 deles classificados como feminicídio consumado e 131 como tentado. Em relação ao primeiro, 6 registros estão localizados em Porto Alegre e 2 em Gravataí. Concernente ao feminicídio tentado, 53 casos são provenientes da capital, 15 de Viamão e 13 de São Leopoldo.
A violência de gênero se manifesta muito além das categorias elencadas pela Secretaria de Segurança Pública do Estado do Rio Grande do Sul. Em uma entrevista de Anna Moccia, republicada pela Revista IHU On-Line em outubro deste ano, as faces da violência contra a mulher também aparecem em práticas de abuso, de exploração, de escravidão e de tráfico. Segue um trecho da entrevista:
“Quando se trata do Brasil, devemos primeiro fazer uma distinção entre exploração sexual e prostituição, porque esta é legal a partir dos 18 anos. Mas acontece que muitas mulheres são enganadas pelas várias empresas que as atraem com falsas promessas de trabalho e, uma vez que chegam à sede dessas grandes empresas, são exploradas sexualmente. As ações do Estado geralmente se revelam ineficazes e ainda há muita impunidade. Fizemos muitas denúncias relacionadas principalmente às indústrias de mineração e garimpeiros, mas, apesar de nossos esforços, caem no vazio. Ao mesmo tempo, verifica-se um enfraquecimento das políticas públicas, principalmente dos comitês de luta contra o tráfico de pessoas.
Na maioria dos casos, as meninas vivem em cidades pequenas ou em localidades dispersas e já sofrem situações de violência dentro de suas famílias. Acontece que são as próprias jovens que fogem para ir às grandes cidades, na esperança de encontrar um futuro melhor. Mas, quando chegam, acabam entrando nessas redes de exploração e tráfico. Há também casos de garotas que se mudam para a cidade por motivos de estudo e são acolhidas por famílias locais, mas são justamente essas "novas famílias", que deveriam cuidar delas, que as exploram no plano de trabalho ou sexual. ”
O número de homicídios de pessoas do sexo feminino aumentou 31,8% entre 2000 e 2017 no Brasil, passando de 3.744 para 4.936 casos, segundo o IPEA.
“Existem inúmeras definições de gênero, mas, de uma maneira geral, ‘pode ser conceituado como uma pressão social para correspondermos aos ideais que as culturas e as sociedades têm sobre o que é ser homem ou mulher, dicotomizando o mundo em masculino e feminino’, explica a psicóloga e professora Marlene Strey, em entrevista concedida por e-mail à IHU On-Line em julho de 2017. As pessoas buscam corresponder ao que se espera delas, e esses processos são permeados “por questões de poder nem sempre visíveis, mas que atuam disfarçada e insistentemente empurrando as pessoas a tentarem se adequar às formas disponíveis”.
A maneira como a masculinidade é construída está na base da violência de gênero em que o homem é o agressor. “Historicamente os seres humanos do gênero masculino são educados, socializados e treinados para resolverem seus problemas por qualquer meio, a fim de preservarem sua virilidade”, ressalta Strey. Os homens procuram ser superiores às mulheres e, “além disso, também devem submeter outros homens, principalmente aqueles que não correspondem aos estereótipos de masculinidade vigentes”.
Violência contra mulheres no campo cresce 377% em 2018: casos incluem tentativas de assassinato e criminalização é o que explicita o título da reportagem de Julia Dolce, publicada pela Revista IHU On-Line em abril deste ano:
“Lançado na sexta-feira dia 12 de abril pela Comissão Pastoral da Terra (CPT), o relatório Conflitos no Campo Brasil 2018 traz dados alarmantes sobre o aumento da violência no contexto da luta pela terra. No último ano, foram registrados 964 conflitos agrários, que resultaram em 25 mortes de lideranças camponesas, indígenas e quilombolas.
Esse território sob disputa abarca uma área de 39 milhões de hectares, equivalente ao tamanho da Noruega, impactando as vidas de 590 mil brasileiros e brasileiras – sem levar em conta conflitos trabalhistas e pela água.
Mas os dados são ainda mais alarmantes em relação às mulheres do campo. Segundo o levantamento da CPT, no ano passado 482 mulheres foram vítimas de violência em decorrência de conflitos agrários, um aumento de 377% em relação a 2017. ”
Em junho deste ano, o Observasinos divulgou uma relação de instrumentos voltados para a proteção de mulheres vítimas de violência nos 34 municípios da Região Metropolitana.
Observa-se que os municípios ora se organizam por meio de secretarias, conselhos e coordenadorias, ora se articulam através de procuradorias e centros de referência. É importante mencionar que a pesquisa foi desenvolvida somente pelos sites. Sendo assim, segue o infográfico com as informações compiladas acerca da existência (ou não) de lugares que atendam mulheres vítimas de violência:
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Três mulheres sofrem violência a cada hora na Região Metropolitana de Porto Alegre - Instituto Humanitas Unisinos - IHU