03 Dezembro 2020
Na audiência geral, o Pontífice explica o valor da bênção. Lembra as 4 missionárias estadunidenses assassinadas em El Salvador em 1980 e os camponeses assassinados por jihadistas na Nigéria: “Grave ofensa a Deus”.
A reportagem é de Iacopo Scaramuzzi, publicada por La Stampa, 02-12-2020. A tradução é de Luisa Rabolini.
Papa Francisco deu o exemplo das mães que, quando era arcebispo de Buenos Aires, via na fila em frente ao presídio ir visitar um filho na prisão, desafiando a vergonha dos transeuntes, para explicar, na audiência geral, o significado da “bênção”: “Deus é como um bom pai, é um bom pai, e como uma boa mãe, ele também é uma boa mãe: nunca deixam de amar o filho, por mais que ele possa errar”.
“Não há pecado que possa apagar completamente a imagem de Cristo presente em cada um de nós, aquela imagem que Deus nos deu. Pode desfigurá-la, mas não pode afastá-la da misericórdia de Deus”, disse o Papa da Biblioteca do Palácio Apostólico. “Um pecador pode permanecer muito tempo em seus erros, mas Deus é paciente até o fim, esperando que no fim esse coração se abra e mude. Deus é como um bom pai, ele é um bom pai, e como uma boa mãe, ele também é uma boa mãe: eles nunca deixam de amar seu filho, por mais errado que ele possa estar".
“Vem à minha lembrança - continuou Jorge Mario Bergoglio - tantas vezes que vi gente fazendo fila para entrar na prisão, e muitas mães que faziam fila para ver seu filho preso, não deixam de amar seu filho, e elas sabem que as pessoas que passam no ônibus, ‘ah essa é a mãe do cara que está preso, não têm vergonha”, sim, elas têm vergonha mas continuam, o filho é mais importante que a vergonha. Da mesma forma, nós somos mais importantes para Deus do que todos os pecados que podemos cometer: ele é pai, ele é mãe, ele é puro amor, ele nos abençoou para sempre e nunca deixará de nos abençoar".
“Uma experiência forte - disse Francisco - é a leitura desses textos bíblicos de bênção numa prisão ou numa comunidade de recuperação. Fazer com que aquelas pessoas sintam que são abençoadas apesar de seus graves erros, que o Pai celestial continua a gostar delas e a ter esperança de que finalmente se abram para o bem. Se até os parentes mais próximos os abandonaram - muitos vão embora, não são como as mães que fazem fila - porque já os julgam irrecuperáveis, para Deus são sempre filhos. Deus não pode apagar em nós a imagem de filho, cada um de nós é filho, é filha. Às vezes, milagres acontecem: homens e mulheres que renascem. Porque encontram esta bênção que os ungiu como filhos, porque a graça de Deus muda a vida: ele nos pega como somos, mas nunca nos deixa como somos”.
O Papa abordou o tema da bênção no quadro de um ciclo de catequese sobre a oração: “Deus abençoa, mas os homens também abençoam, e logo se percebe que a bênção possui uma força especial, que acompanha quem a recebe por toda a vida, e dispõe o coração do homem a se deixar mudar por Deus: no início do mundo, portanto, há Deus que ‘fala – bem’. Ele vê que toda obra de suas mãos é boa e bela, e quando se trata do homem, e a criação se cumpre, ele reconhece que é "muito bom". Logo depois, aquela beleza que Deus imprimiu em sua obra se alterará, e o ser humano se tornará uma criatura em degeneração, capaz de espalhar o mal e a morte no mundo; mas nada jamais poderá apagar a primeira marca de bondade que Deus colocou no mundo, na natureza humana de todos nós: a capacidade de abençoar e o fato de sermos abençoados”.
Deus "continua a nos amar, Ele é o primeiro, como diz o poeta Péguy, a continuar a esperar pelo nosso bem", disse o Papa Francisco, que citou um exemplo de que muito gosta, de Zaqueu, figura do pecador no Evangelho que Jesus vai visitar: “Todos viam nele o mal; Jesus, por outro lado, viu ali um lampejo de bem, e a partir daí, pela curiosidade em ver Jesus, deixa passar a misericórdia que salva. Assim, primeiro mudou o coração de Zaqueu e depois a sua vida. Nas pessoas marginalizadas e rejeitadas, Jesus via a indelével benção do Pai: ‘Este é um pecador público, ele fez tantas coisas más’, mas Jesus viu a marca indelével da benção do Pai, e teve compaixão, e aquela compaixão o leva a ajudá-lo e mudar o coração”.
A oração, continuou o Papa, “é alegria e gratidão. Deus não esperou que nos convertêssemos para começar a nos amar, mas o fez muito antes, quando ainda estávamos no pecado. Não podemos abençoar apenas este Deus que nos abençoa, devemos abençoar tudo Nele, todas as pessoas, abençoar a Deus e aos irmãos, o mundo: esta é a raiz da brandura cristã, a capacidade de se sentir abençoado e de abençoar: e se todos nós fizéssemos isso, então certamente não haveria guerras”, disse Francisco, que reservou um último pensamento para as pessoas “que sempre trazem na boca e no coração uma palavra ruim, uma maldição: cada um de nós pode pensar eu tenho esse hábito de praguejar assim? E pedir ao Senhor a graça de mudar esse hábito, porque temos um coração abençoado e de um coração abençoado não pode sair a maldição. Que o Senhor nos ensine a nunca amaldiçoar, mas a abençoar”.
No final da catequese, o Papa enviou suas orações pela Nigéria, "infelizmente ainda ensanguentada por um massacre terrorista", em referência ao atentado jihadista ocorrido na aldeia de Koshobe. “No último sábado, no nordeste do país, mais de 100 agricultores que trabalhavam foram brutalmente assassinados. Que Deus os acolha na sua paz e conforte as suas famílias e converta o coração daqueles que cometem semelhantes horrores que ofendem gravemente o seu nome”.
Finalmente, hoje "é o 40º aniversário da morte de quatro missionárias norte-americanas assassinadas em El Salvador, as irmãs de Maryknoll, Ita Ford e Maura Clarke, a irmã ursulina Dorothy Kasel e a voluntária Jean Donovan", recordou o Papa Francisco. “Em 2 de dezembro de 1980 foram sequestradas, estupradas e assassinadas por um grupo de paramilitares. Elas prestavam seu serviço em El Salvador no contexto da guerra civil. Com empenho evangélico e correndo grandes riscos, levavam alimentos e remédios aos deslocados e ajudavam as famílias mais pobres. Essas mulheres viveram sua fé com grande generosidade. Elas são um exemplo para que todos se tornem fiéis discípulos missionários”.
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Papa Francisco: “Deus é como uma mãe que visita seu filho na prisão” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU