18 Junho 2020
Os efeitos do coronavírus na Amazônia ameaçam cada vez mais uma das regiões cuja importância é vital para o futuro do planeta. Segundo dados coletados pela Rede Eclesial Pan-Amazônica, que toda segunda, quarta e sexta-feira elabora um relatório com números oficiais, fornecidos pelas autoridades de cada um dos nove países, em 17 de junho já existem 315.349 infectados, com saldo de 11.580 falecidos.
A reportagem é de Luis Miguel Modino.
Entre eles, 8.733 casos confirmados e 696 mortes de 127 povos indígenas, o que representa uma ameaça crescente de etnocídio, que pode levar ao desaparecimento de algum dos aproximadamente 390 povos indígenas da Pan-Amazônia, junto com quase 130 povos em isolamento voluntário, que são na verdade aqueles que sofrem o risco mais sério.
A região pan-amazônica tem uma população de cerca de 33 milhões, dos quais aproximadamente 3 milhões são indígenas. Se fosse um país, estaríamos falando sobre o 5º com o maior número de contágios e o 9º em número de mortes. Tudo isso em uma região onde a logística é dificultada por uma orografia que só possibilita o deslocamento fluvial e aéreo em grandes áreas da região. Soma-se a isso o abandono no campo da saúde ao qual a Pan-Amazônia é tradicionalmente sujeita, à qual quem chegou de fora quase sempre foi apenas para obter recursos.
O número de casos dobrou em menos de três semanas, pois em 29 de maio houve 155.592 casos confirmados, com 7.449 mortes. Soma-se a isso a grande subnotificação existente nos diferentes países e a falta de confirmação de mortes como casos de Covid-19. Serve como exemplo o que aconteceu na província de Loreto, Peru, onde os dados desta terça-feira, 16 de junho, falaram de 475 mortes confirmadas, que são as que aparecem nos relatórios da REPAM, e 1.345 suspeitos, que não são oficialmente considerados como mortes causadas pelo coronavírus, o que agrava ainda mais a situação, já que estaríamos falando de um total de 1.820 mortes. Junto com isso, a Diretoria Regional de Saúde, DIRESA-Loreto, passou mais de 15 dias sem emitir nenhuma declaração com números oficiais.
Como afirmou Dom Edson Damian, bispo de São Gabriel da Cachoeira, um dos municípios com maior percentual de casos em todo o Brasil, “nas aldeias há muitos infectados, mas têm medo de ir ao hospital. Então eles resistem até que possam aguentar. Além disso, não realizam testes nas aldeias”, o que é mais uma prova da subnotificação presente na região amazônica.
Ter ultrapassado os 315 mil infectados oficialmente "é uma fonte de profunda dor e indignação", segundo Mauricio López, que denuncia que "existe um evidente sub-registro e, em alguns casos, cumplicidade das instâncias do governo em esconder os números, que não são de perto, o número real de infectados". Para o Secretário Executivo da REPAM, “isso gera uma enorme preocupação, especialmente no caso dos povos indígenas, historicamente discriminados, impactados por uma situação voraz de retirada de recursos, que impactou seus territórios, culturas e, evidentemente, também sua saúde e agora são atingidos pela pandemia, onde não há elementos de infraestrutura, higiene ou saúde adequada, o que gera grande preocupação".
Mauricio López alerta que "o auge dessa pandemia ainda não foi atingido, mesmo com 315.000 casos registrados, e nos povos indígenas é apenas agora que estamos passando pela fase mais cruel do contágio nas comunidades e do aumento exponencial". Nessa situação, como a REPAM já denunciou em várias ocasiões, “mesmo assim, os governos não conseguem estabelecer protocolos de resposta adequados, mobilizar os elementos necessários, nem mesmo os mínimos, de biossegurança e infraestrutura médica, para sua atenção". Algo que também foi anunciado repetidamente, insiste o secretário executivo da REPAM, pelos povos indígenas, que denunciam que "estamos diante de um verdadeiro etnocídio por omissão".
A realidade que está sendo vivida na Pan-Amazônia exige uma reação na opinião de Mauricio López, que afirma acreditar que “não podemos permanecer calados e é preciso ter uma posição e uma voz como Igreja, aliar-nos aos povos originários, como o próprio caminho sinodal estabeleceu. e denunciar esta situação”. Omitir-se diante dessa situação pode causar que, "e sem exageros", enfatiza o secretário executivo da REPAM, "estaremos vendo um grande número de povos indígenas que serão impactados, especialmente comunidades frágeis, dizimadas e muitas delas até em risco de desaparecer. Temos que levantar nossas vozes agora”.
Isso é algo que a Igreja Católica e as organizações indígenas, desde o início da pandemia, não deixaram de fazer, exigindo maior atenção dos diferentes governos, denunciando as graves situações pelas quais os povos amazônicos estão passando. Nesse sentido, em 17 de junho, o Conselho Indigenista Missionário – CIMI, emitiu uma nova nota na qual denunciou a morte de muitos líderes indígenas, "baluartes da história e cultura viva de seus povos". Ao mesmo tempo, exigia um plano urgente de “ação governamental para conter o avanço do coronavírus nos territórios indígenas, que contemple o combate às invasões e a estruturação das equipes multidisciplinares com profissionais, equipamentos e insumos para a devida assistência às comunidades indígenas que clamam por socorro”.
Podemos dizer que a ajuda da Igreja está se mostrando decisiva na região, uma vez que a pressão que está exercendo contra os diferentes governos é acompanhada pela ajuda inestimável em alimentos e higiene pessoal, equipamentos de proteção e até plantas de oxigênio, algo que está salvando muitas vidas, especialmente na Amazônia peruana, onde, se não fosse pelo esforço da Igreja Católica, o número de mortes por falta de oxigênio teria disparado ainda mais.
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Mais de 315 mil infectados pelo Covid-19 na Pan-Amazônia: a caminho do etnocídio por omissão? - Instituto Humanitas Unisinos - IHU