22 Outubro 2019
Vivemos um momento muito difícil. Para muitos é de esperança, para outros é de luta e destruição: Que caia tudo! Outros estão angustiados ou assombrados com as imagens que a cada segundo nos chegam por celular.
O artigo é de Pedro Pablo Achondo Moya, teólogo e poeta, publicado por Reflexión y Liberación, 20-10-2019. A tradução é de Wagner Fernandes de Azevedo.
Sem estar nas ruas estamos aí; sem estar, talvez em Santiago, estamos correndo ou tocando nossa onda com raiva e alegria. Se leem declarações de tipos distintos, condenando a violência e mexendo a necessidade de mudanças estruturais. Não cabe dúvida que essas mudanças são urgentes. Há anos que estamos pedindo, exigindo, esperando. As causas são várias e de distinta ordem. Análises existem, literatura não sobra, mas tampouco falta. Nos surpreende porque o Chile teria se livrado de situações críticas, ao menos, como as destes dias. A Venezuela está longe, o Haiti mais longe ainda; o que dizer da Nicarágua ou El Salvador, então. Colômbia, por lá com seus problemas. Peru e Equador explodiram há pouco, por razões distintas. Brasil merece um capítulo inteiro, assim como o México. Nossos irmãos argentinos com frequência vivem em um morde e assopra de tensão. Agora chegou a nós. E aflora o trauma do medo, o trauma da violência, o trauma da ditadura cívico-militar que de a pouco, lentamente e não para todos, vai ficando para trás. Nos dói Chile. Nos dói muito. Algumas cenas parecem de quarenta anos atrás; outras, dignos sintomas de uma sociedade doente; de uma sociedade baseada na violência estrutural e no menosprezo do povo. Ninguém aguenta para sempre. A história, essa que não pode se esquecer nunca, nos rememora o horror das armas e da opressão; e a fragilidade das conquistas democráticas. Não é raro (mas sim muito triste) que alguns invoquem a repressão e as armas. Do mesmo modo que outros aplaudem roubos massivos e destruição de patrimônios públicos ou privados. É um momento de caos. E há toque de recolher.
O Governo totalmente desorientado e sem nada da sensibilidade “republicana”, como alguns gostam de dizer, é escandalosa. O Chile das autoridades emudece, enquanto o Chile do povo pisoteado se rebela. O Chile consciente – independentemente de onde seja – está preocupado e com expectativas. Esse Chile não dorme. O Chile que cresceu na ditadura teme o pior. O Chile dos memes e Instagram se move desafiante entre a relativização, a ousadia e a indiferença.
Como cristãos e seguidores do “Messias que chora” não podemos apoiar a violência gratuita, nem a violência das estruturas injustas. Nos encontramos nessa tensão entre ser promotores da paz, artesãos da compaixão; e viver sedentos de justiça e libertação. Apoiamos a não-violência ativa e o acompanhamento daqueles que nos atacam mais do que os quilômetros que espera. Quando for necessário, ofereçamos o outro lado do roso e perdoemos de frente quem nos arrebata a vida. E, com a mesma força e vontade, denunciamos os discursos de ódio, a repressão do ser humano e a destruição de nossa Casa Comum. O “Messias que chora” lamenta o horror do homem contra o homem. Chora por ter nos esquecido daquela pergunta do Criador: Onde está teu irmão? O Messias chora diante de Deus-Pai desde o dia de sua ressurreição. E, através desse misterioso dom de lágrimas, chora por nosso povo chileno. Chora os crimes contra os Direitos Humanos e as aposentadorias injustas. Chora que os rios tenham secado pelo egoísmo humano e que não possamos acolher nossos irmãos migrantes. Chora pelo Herodes violento de hoje e aqueles que vivem cheios de luxos, enquanto os pobres seguem rascunhando os dias. O Messias chora os abusos sexuais, de poder e consciência de seus irmãos e chora com raiva porque aqueles que se dizem seus seguidores enganam, profanam, roubam e mentem ao resto do povo. Jesus exige sensatez e razão, porém mais ainda, espera empatia, compreensão, escuta e diálogo; entre todos os humanos diferentes.
Os que se dizem crentes e seguidores do Messias Sofredor digam NÃO a toda violência e se aproximem, no silêncio e no grito, a secar as lágrimas daqueles que choram e, provavelmente, seguirão chorando.
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Chile. Toque de medo - Instituto Humanitas Unisinos - IHU