Virada do islã sunita: "Praticar a poligamia é injusto para as mulheres"

Marido e suas esposas | Foto: Reprodução | Youtube

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07 Março 2019

O anúncio do Grande Imam, Ahmed al-Tayeb, no Egito: Ter várias esposas não respeita "o princípio da equidade".

A reportagem é de Giordano Stabile, publicada por La Stampa,  04-03-2019. A tradução é de Luisa Rabolini

A poligamia é "uma injustiça em relação às mulheres e aos filhos". Afirma o Grande Imam Ahmed al-Tayeb, da Universidade Al-Azhar, a mais alta autoridade religiosa sunita. Um repúdio aberto àquela que não é uma prática muito difundida do mundo muçulmano, mas até agora considerada irrepreensível. Para Al-Tayeb, no entanto, casar-se com "uma segunda, terceira e quarta esposa" não respeita "o princípio de equidade" que está no fundamento do islã. E assim, a não ser em casos excepcionais, é melhor evitá-lo.

O anúncio pela TV

A divulgação do posicionamento, em seu programa semanal de televisão, provocou um inflamado debate na mídia social, a ponto que, em seguida, o site da universidade Al-Azhar teve que explicar que o imam não queria "proibir" a poligamia, embora a tenha efetivamente desaconselhado.

No Egito também houve muitas reações positivas, especialmente por parte de associações de mulheres. Al-Tayeb assumiu uma posição cada vez mais moderada, especialmente após a subida ao poder do general Abdel Fattah al-Sisi, defensor de uma modernização em etapas forçadas do país, inclusive no âmbito religioso. O mesmo Al-Sisi, em janeiro de 2015, pediu aos religiosos de Al-Azhar uma "reforma do islã" porque não se podia mais tolerar que as interpretações extremistas colocassem "toda a comunidade muçulmana contra o resto do mundo".

Para o líder trata-se principalmente de isolar ideologicamente a Irmandade muçulmana, seus acérrimos inimigos, mas Al-Tayeb começou um percurso de diálogo inter-religioso que culminou com o encontro com o Papa Francisco em Abu Dhabi e um manifesto pela recíproca compreensão. As intervenções na TV têm uma função pedagógica interna. Al-Tayyib explicou que os versículos do Alcorão sobre a poligamia são lidos "de forma parcial" e que se esquece que o Profeta autoriza o casamento múltiplo apenas sob “algumas condições”, a mais importante das quais é a "equidade".

"Muitos - continuou ele – leem somente "duas, três, quatro" e não terminam todo o versículo, é preciso ir mais para a frente, quando se afirma: ‘se você não considera que pode ser justo com elas, então que tenha apenas uma’”. O muçulmano "está realmente livre para se casar com uma segunda, terceira ou quarta esposa?", questionou-se. "Essa liberdade - ele concluiu – existe apenas se a condição de justiça puder ser respeitada e, se não houver equidade, então é proibido ter mais esposas".

A interpretação

Al-Tayed já havia se expressado criticamente sobre a poligamia em 2010 e, depois, em 2016, imediatamente depois que Al-Sisi havia lançado a "reforma" do islã. Porém, é a primeira vez que se expressa de forma tão clara. E também o método acaba sendo importante. Um "novo discurso religioso" pressupõe uma leitura do Alcorão mais corajosa, capaz de contrastar a interpretação "literal" e muitas vezes parcial dos grupos salafitas e jihadistas, que citam apenas as partes que validam as teses extremistas, como a necessidade de combater os "infiéis”. O Conselho Nacional das Mulheres, próximo ao governo egípcio, acolheu com entusiasmo as teses de Al-Tayeb. "O islã honra as mulheres – destacou a presidente Maya Morsi - trouxe justiça e inúmeros direitos que antes não existiam." Também deve ser dito que a poligamia é legal em quase todos os países muçulmanos, mas é pouco comum. Na Tunísia e na Turquia é proibida. No Egito, como em muitos outros estados, o homem só pode se casar uma segunda vez apenas com o consentimento da primeira esposa.

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