14 Janeiro 2019
"No momento em que desaparece no horizonte o intercâmbio entre esses macro-grupos sociais e se acentua a incomunicabilidade política, a cooperação social e cultural entre a "cúpula" e "base" da pirâmide social, a democracia representativa perde a possibilidade de funcionar adequadamente", escreve Francisco Antonelli, em artigo publicado por il manifesto, 10-01-2019. A tradução é de Luisa Rabolini.
Diante da ascensão dos movimentos e dos líderes neopopulistas do mundo, o debate das ciências sociais foi articulado em duas grandes posições: de um lado, aqueles que interpretaram esses novos atores como o produto em grande parte contingente das disfunções da democracia representativa; do outro, os que defendem o caráter estrutural e, portanto, tendencialmente permanente do neopopulismo. Dado de partida para ambos é a crise da globalização neoliberal, iniciada em 2007-2008.
O livro de Ferruccio Capelli Il futuro addosso. L’incertezza, la paura e il farmaco populista (O futuro incombente. A incerteza, o medo e o fármaco populista, em tradução livre, Guerinie Associates, p.214, € 19,50) tenta uma mediação entre estas duas posições, oferecendo uma leitura de longo prazo das raízes sociais do neopopulismo. Para Capelli, de fato, as mobilizações neopopulistas são produto estrutural da "grande transformação" trazida pela globalização, desde o seu aparecimento, após a queda do socialismo real. Em particular, em três níveis: aquele político e da esfera pública, com o aparecimento da "democracia desintermediada”. Uma forma político-comunicativa, alimentada principalmente pelas tecnologias digitais, em que os corpos intermédios (partidos, associações, sindicatos, mas também os meios de comunicação) estão em crise na sua função de mediação dos interesses e de representação em favor de um pluralismo político individualizado, desorganizado, dominado pelas conexões virtuais e diretas entre cidadãos e líderes (basta pensar na centralidade do Twitter no estilo político de Trump).
No nível social, com a evaporação dos vínculos de grupo e comunitários. Um processo que lança a maioria das pessoas em uma solidão involuntária, colocando-as em um nicho de insegurança, medo e ignorância crescente. Aquele cultural, com o declínio daquelas "grandes narrativas" do século XX ligadas a palavras-chave como progresso, que não permitem mais nem imaginar o futuro nem decodificar as mudanças em curso, produzindo uma sensação de desorientação e impotência generalizadas. Estes três processos confirmaram o diagnóstico que Christopher Lasch já havia formulado na década de 1990: um fosso crescente entre as elites políticas e econômicas beneficiadas pela globalização e as classes média e populares, sobre as quais foi despejado o custo da "grande transformação".
No momento em que desaparece no horizonte o intercâmbio entre esses macro-grupos sociais e se acentua a incomunicabilidade política, a cooperação social e cultural entre a "cúpula" e "base" da pirâmide social, a democracia representativa perde a possibilidade de funcionar adequadamente. Privada de uma classe dirigente real e de um público informado e participativo.
O neopopulismo é então um ator político, um estilo de comunicação e liderança, e uma narrativa que nasce como uma tentativa de oferecer, com os meios e as linguagens disponíveis (como os da democracia desintermediada), novas modalidades de representação, em particular para os mais afetados pela globalização: as classes populares.
Para Capelli, portanto, o neopopulismo seria principalmente um humor, um estilo, uma mentalidade política prevalecente que, em suas magmáticas e multiformes expressões, repropõe a centralidade o povo e constrói sua identidade e formas através do apelo direto do líder (agora pós-ideológico), a identificação de contínuos inimigos (primeiro, entre todos, as elites), culpados de causar a fome ou trair o próprio povo, através de vários, supostos, "complôs".
O neopopulismo é a resposta política regressiva à "retrotopia” contemporânea oposta ao espírito utópico da modernidade de que fala Bauman, que se afirma não pela crise da globalização, mas, ao contrário, por seu triunfo. O neopopulismo é, portanto, um fármaco no duplo sentido etimológico do termo: é o que cura, mas também o que envenena. O que traz à tona o problema já não mais adiável da representatividade popular e democrática dentro da globalização, e o que coloca em risco de mergulhar o mundo em uma nova era de fechamento, intolerância e até mesmo de guerra mundial. Capelli propõe uma nova batalha político-cultural como tentativa de construção de percursos de subtração das classes populares e médias das sereias do neopopulismo, através da transformação do modelo de desenvolvimento. Este deve ser menos desigual, mais sustentável e mais centrado no objetivo de promover o crescimento das competências e das chances de vida das pessoas, em todo o mundo.
Exatamente do jeito que Amartya Sen e Martha Nussbaum entendem tudo isso. Mas aqui está o ponto mais fraco da análise de Capelli: de fato, esses caminhos, junto com a política da identidade e da diversidade, têm inspirado tanto a prática quanto a teoria do reformismo de esquerda, liberal e radical, nos vinte anos precedentes. E, como testemunha a própria ascensão do neopopulismo, em determinado momento falharam ou perderam a legitimidade. Agora identificados aos olhos de muitos cidadãos como completamente orgânicos àquela globalização neoliberal que igualmente os teria prejudicado. O desafio é, portanto, lançar uma nova batalha político-cultural no país e em nível global, mas tentando identificar soluções e alternativas que ultrapassem os modelos já experimentados, inclusive no passado recente. Um trabalho de imaginação político-sociológica ainda todo a ser feito.
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As conexões virtuais do neopopulismo - Instituto Humanitas Unisinos - IHU