10 Outubro 2018
De acordo com o vigário episcopal da Arquidiocese de Managua, situação beira a perseguição.
A reportagem é de Renaud Risi, publicada por La Croix International, 09-10-2018. A tradução é de Victor D. Thiesen.
A Nicarágua sofre uma grave crise política e social. Os defensores do regime sandinista que estão no poder multiplicaram seus ataques à Igreja Católica local, acusando-a de ser “golpista”.
Quando o padre Edwin Roman começou a celebrar a missa no início do segundo domingo de setembro, música alta e cantos se elevaram da praça em frente à Igreja de San Miguel, em Masaya, a 30 quilômetros de Managua.
Depois de alguns momentos de perplexidade, o padre Edwin reconheceu a melodia como aquela que os partidários do presidente Daniel Ortega vêm cantando nas últimas semanas: “Daniel se queda, Daniel se queda”, (Fica Daniel, fica Daniel, em português).
Recusando-se recuar frente às trombetas, o padre deixou a Igreja por vários minutos para conversar com o grupo do lado de fora.
"Simplesmente saí para pedir aos ativistas que baixassem o volume de seus alto-falantes para que as pessoas pudessem assistir à missa", disse ele mais tarde.
No entanto, os homens e mulheres liderados pelo comissário Ramon Avellan, ex-chefe de polícia da cidade, que desde então se tornou vice-diretor da polícia nacional, se recusaram a ceder.
"Eles me empurraram e me bateram várias vezes", disse o padre Edwin.
Cansados, os sandinistas acabaram deixando o local após cumprirem sua missão de transmitir uma ameaça do tipo: “tenha cuidado, estamos de olho em você!”
Desde que o Padre Edwin abriu as portas da paróquia às vítimas da violência policial no início da repressão, se tornou um símbolo do compromisso de que a Igreja está do lado do povo, condenando o autoritarismo do regime.
O conflito sócio-político que tem se dado desde então já causou quase 500 mortes, de acordo com várias ONGs locais de direitos humanos.
Preocupada com o incidente em Masaya, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos, uma ramificação da Organização dos Estados Americanos, respondeu imediatamente com uma exigência de que o governo protegesse “a vida e a integridade pessoal” do Padre Edwin.
Tal incidente não foi uma ocorrência isolada. Enquanto os ativistas perturbavam a missa em Masaya, outros erguiam a bandeira vermelha e preta da FSLN (Frente Sandinista de Libertação Nacional), entrando em uma Igreja em Granada, a vários quilômetros dali.
Algumas semanas antes, um evento semelhante ocorreu noutra Igreja em Masaya.
"Isso equivale a uma perseguição", disse mons. Cantão Carlos Avilés, vigário episcopal de Managua.
"O governo reprime e nos condena como 'golpistas', mas o que estamos fazendo é expressar a mensagem do povo nicaraguense", disse Avilés.
“Nosso dever é dobrado. Por um lado, precisamos pedir paz, verdade e justiça, mas, por outro lado, também precisamos defender a dignidade humana quando os manifestantes são violentamente reprimidos e deixados de lado, sem ajuda médica ou qualquer outra”, disse mons. Canton.
Muitos dos médicos que abriram suas clínicas e hospitais para os manifestantes feridos, mais tarde receberam cartas de demissão.
"No auge da crise, minha paróquia se tornou um pequeno hospital, graças a estudantes de medicina e a doações", disse o padre Edwin.
"As pessoas não tinham mais para onde ir porque os hospitais estavam sob vigilância", acrescentou.
Os estudantes cuidaram das vítimas em um pequeno pátio da Igreja até que se recuperassem. Muitos outros, no entanto, não tiveram essa oportunidade.
O governo criticou a Igreja por defender as demandas dos manifestantes, embora seja reconhecida como mediadora no diálogo nacional pelo governo e pela oposição.
"Nosso papel é promover o diálogo, bem como representar o povo. Muitos pessoas pediram eleições antecipadas e uma comissão eleitoral independente", explicou mons. Canton, conselheiro dos cinco bispos responsáveis pela mediação.
"Não temos medo. Quando eu ando na rua, as pessoas me agradecem pelo que estamos fazendo", disse Canton.
As pesquisas dizem que atualmente a Igreja é de longe a instituição mais popular da Nicarágua, com um índice de aprovação de mais de 60%.
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Nicarágua. Igreja sob ataque - Instituto Humanitas Unisinos - IHU