05 Julho 2018
"Durante a viagem no navio a menina ficou coma febre, uma febre cada vez mais alta, eu ficava com ela dia e noite, não sabia o que fazer. Uma noite a ouvi gemer, estava suando frio, tremendo; tentei aquecê-la e segurá-la perto de mim, mas de repente ela parou de tremer. Estava morta. Morta. Talvez porque não havia remédios, talvez porque não havia nenhum médico por perto; não sei. Talvez ela tivesse contraído uma febre mortal”.
"Arrancaram ela dos meus braços, a enfaixaram bem apertado da cabeça aos pés e amarraram uma grande pedra ao pescoço; durante a noite, às duas horas da madrugada, com aquelas ondas tão negras, baixaram-na ao mar. Eu gritava, gritava, não queria me afastar dela, queria me afogar com minha filhinha; alguns braços me seguraram, homens eu creio. Eu não queria que minha filhinha tão pequenina acabasse naquele mar tão frio, tão escuro, certamente devorada pelos peixes. Eu queria ser enterrada com ela, protegê-la de alguma forma, defendê-la, para que não a devorassem. Eu não queria deixá-la sozinha, pobre criança, mas eles me seguraram enquanto a jogavam ao mar. Aquele baque na água, nunca mais consegui esquecer”.
A reportagem é de Gian Antonio Stella, publicada por Corriere della Sera, 04-07-2018. A tradução é de Luisa Rabolini.
A mãe emigrante que lembra a agonia de perder uma filha na travessia para o continente mil vezes sonhado enquanto esperava a partida, nos longos meses passados vendendo tudo para juntar o dinheiro e pagar o navio não é eritreia, não é senegalesa, não é nigeriana: é Amalia Pasin, uma mulher do Vêneto que, partindo com seu marido Giovanni de Villafranca Padovana em 1923, teria tantos anos depois contado a sua tragédia a Francesca Massarotto Raouik, autora de um belo livro de testemunhos, "Brasil sempre. Mulheres do Vêneto no Rio Grande do Sul”. Mulheres todas movidas pela mesma esperança: "catàr fortuna". Lá, no "Brasil taliàn" cheio de nossos imigrantes e evocado uma comovente canção "Itália bela, mostre-se gentil/ não abandone teus filhos/ senão todos irão para o Brasil /e não mais se lembrarão de retornar ..." . Alguns fizeram fortuna. Outros não. Em agosto, às vezes, eles ainda festejam cantando um "forró" brasileiro em dialeto vêneto lembrando a ricota, a polenta e o bacalhau: “Oh puina bela puina/la polentina con el bacalao" (oh, ricota, bela ricota, a polenta com o bacalhau). No entanto, seus filhos que morreram nas travessias nunca foram esquecidos E quando veem na TV as imagens de crianças jogados nas praias italianas, ainda sentem um aperto no peito. Não escrevem no facebook "bom apetite aos peixes" ...
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Aquelas crianças mortas de imigrantes italianos - Instituto Humanitas Unisinos - IHU