28 Abril 2017
"É possível afirmar que a difusão da denominada lista de Fachin é o início do fim – definitivo da “Nova República” – (para ver lista completa acesse http://migre.me/ww30h). Constatar desconfiança coletiva, 5% de aprovação para o governo do vice golpista e a celeridade na aprovação das leis regressivas nos fazem crer que a longevidade desta administração será curta. Será?", escreve Bruno Lima Rocha, professor de ciência política e de relações internacionais, em artigo publicado por GGN, 27-04-2017.
Eis o artigo.
Este debate, oscilando entre a análise de conjuntura e institucional e a predição política, começa a partir da seguinte constatação. Como pode um governo ilegítimo e suspeito de corrupção tomar medidas antipopulares e seguir governando?! Pode porque a relação do exercício do poder passa pela aparência de legalidade e o verniz de legitimidade. Na ausência de contraposição e capilaridade das mobilizações sociais mais profundas, acaba prevalecendo à versão hegemônica dos maiores conglomerados de mídia no Brasil.
Como o tom é dado pelos grupos produtores de bens simbólicos, vale observar que a Globo deu o recado através da manchete do Wall Street Journal logo que a lista foi anunciada. O periódico ultraliberal de Rupert Murdcoh afirmou: "A lista abala ainda mais o ambiente político e indica que o governo tem de aprovar as 'reformas' o mais rápido possível".
A "indignação" editorial da Globo é tão seletiva como o moralismo hipócrita dos paneleiros que sumiram das ruas. A Nave Mãe resolveu assumir que o sistema político (que consideramos falido há muito tempo) faliu. Para quem não é inocente na política, os “não-bobos”, sabem que sempre quando a Globo diz que deve haver uma mudança é para tudo ficar como está ou piorar. Tal piora é a pressão, direta, expressa, sobre o Poder Executivo com Temer à frente, indicando a consecução das leis que retiram direitos da maioria e aprofundam o abismo social. É isso ou nada.
Em consonância com os liberais do Ministério Público Federal, a sanha punitiva – em menor parte saudável, no sentido de justiça e em maior parcela nefasta, pelo abuso de poder e prerrogativas sem fim – o Jornal Nacional chegou ao ponto de colocar um promotor dando discurso e bronca em Emílio Odebrecht, fazendo discurso político e nomeando ministros de Estado. Sinceramente, não há como defender a ex-esquerda, menos ainda José Dirceu e Antonio Palocci, mas isso é demais!
Enquanto elogia sem pudor o udenismo visceral da “República de Curitiba”, as emissoras de TV, com a Globo à frente, redescobrem, finalmente, milagrosamente, que existe Lista de Furnas e Trensalão tucano de São Paulo. Obviamente, da Operação Zelotes os editores não se recordam, e por quê?
Estamos diante de uma liquidação das reservas estratégicas do país. Para quem julga ser exagero, sugiro ver o seguinte link, da revista Exame; também a previsão de alta na produção de petróleo no planeta, passando pelas reservas brasileiras. Em complemento ao entreguismo visceral, temos a agenda regressiva, como a “reforma” trabalhista, antes a lei das terceirizações selvagens, e a cruzada antipopular pela “reforma” da Previdência.
Simultaneamente, observamos que a tampa do bueiro está aberta e agora para 2018 temos duas agendas políticas profissionais paralelas. Uma, a corrida dos desesperados, onde quem não estiver na Lava Jato ou não se tornar inelegível tem alguma chance no ano que vem. Sim, eu penso que vai ter eleição e este Congresso até pode fazer uma saída de tipo lista fechada, mas não vai arriscar mudar o regime por decreto de Emenda Constitucional. Nesta corrida, hoje, Lula é o favorito e caso venha a se tornar inelegível, é o maior cabo eleitoral do país. Pela direita sem vergonha nenhuma, a cancha está aberta para aventureiros - tucano ou não - ou para a UDR, ou uma solução Berlusconi viralatista, talvez com o Partido Novo sendo o PRN do século XXI.
A inflexão do governo Temer é visivelmente liberal conservadora, mas podemos envergar para uma solução de tipo midiática, de cultura das celebridades, abrindo o país para algum tipo de “fascismo” (de linha chilena) ou espaço amplo para aventureiros. Tal possibilidade é corretamente aventada pelo implacável Bob Fernandes no seguinte link.
Outra corrida - e esta se disputa nas raias mais à esquerda - é contra as leis regressivas, hoje implantadas pelo governo usurpador, mas que constavam como agenda embrionária no segundo governo de Dilma, algumas inclusive já circulavam antes. Nesta segunda corrida, aí a acumulação é agora. Quanto mais se lutar ainda em 2017, quanto mais blindarmos a luta popular do eleitoralismo de tipo showmício, mais nos protegemos de virar moeda de troca eleitoral em 2018, ou vir a ser servido como “pato assado” para negociar algum Pacto de Governabilidade. O momento é muito, muito delicado e o abismo é abissal.
Pensemos em 2019. Vamos colocar a hipótese sob um parâmetro eleitoralista e de centro-esquerda. E caso Lula venha a concorrer e ganhe? Já imaginaram se Lula não puder disputar e ajuda a eleger Ciro Gomes? E então, eles vão governar como? Com que base parlamentar? Ou vão tentar um projeto nacional e conclamar as forças populares que restam para compor uma base de apoio? Arriscando uma predição, eu ainda creio que a ex-esquerda concorre, ganha e não governa com as esquerdas - ou seja, não irá para a esquerda por vontade própria - e tentará recompor o mal menor para o andar de cima. Mas, repito, ainda com essa intenção de novamente ser "bem comportada", ou a oligarquia que um dia foi vermelha se prepara para um contra golpe ou vai ter problema de novo. Ou seja, teremos todos, de alguma forma, uma enorme possibilidade de vermos um mínimo de programa reivindicativo não se realizar e receber vetos diante da impossibilidade de governar.
Concluo este texto arriscando uma previsão de comportamento político. Se bem escutei o que afirmou o presidente da República em entrevista ao Grupo Bandeirantes no sábado 16 de abril (ver a primeira parte) ele, Temer, não vai recuar um milímetro de seu programa de leis regressivas e não vai alterar absolutamente nada na relação com o Congresso. Quanto aos ministros suspeitos na Lava Jato, vai garantir a estabilidade da base, só afastando quem for denunciado pelo MPF. Simples assim.
Com isso, creio eu, Temer vai se fiar na relação com os caciques partidários, ou seja, vai se alinhar com o Listão de Fachin, a todo e qualquer custo. Não fez questão de afirmar a sua primeira opção de modelo eleitoral - o distritão, como é hoje - e pelo visto, o acórdão vai fazer vista grossa quanto à lista fechada e o fundo eleitoral mais gordo - para compensar a proibição de doações privadas. De qualquer maneira, entregou a “reforma” política - na prática, um ajuste na concorrência eleitoral – para os cardeais e caciques, e assim espera tanto cumprir seu mandato até o final como garantir a dimensão substantiva do golpe.
Temer repetiu a situação limite de Eduardo Cunha e Dilma Rousseff, onde Cunha só deu andamento ao processo de impeachment porque milagrosamente a base do PT e os deputados na Comissão de Ética não retiraram o apoio à cassação de Cunha. Resultado: impeachment de Dilma e Eduardo Cunha em cana em Curitiba.
As demais partes da entrevista, como na segunda (ver) e na terceira (ver) Temer fez uma manobra discursiva tentando dar uma abordagem "racional" e dentro da tecnicalidade do projeto da Terceirização, da MP do Ensino Médio e da Reforma da Previdência. Ao afirmar a técnica como função principal do exercício da razão de Estado, o ex-vicepresidente de Dilma Rousseff reforça a distopia neoliberal, onde um universo conceitual fechado por fantasias econométricas e princípios de pressuposição de comportamento humano (como a afirmação absoluta individualismo metodológico da escola de Chicago) recruta as oligarquias políticas ilegítimas, com suspeitas de ilegalidade como seus operadores de tipo clientela.
O presidente ilegítimo não pareceu nenhum pouco disposto a deixar o cargo e menos ainda entrar no clima de desespero. Se sair um acórdão com PT e PSDB, ele estará no meio. Mas, ao que tudo indica, o acórdão vai ser da base do governo Temer, onde os fisiológicos que davam suporte aos governos de Lula e Dilma a contragosto, agora o fazem por convicção, somados com a oposição ao lulismo.
Por fim, o protagonismo na política agora me parece estar com a Globo - batendo mais que de costume e sem blindar cem por cento ao governo Temer - e com alguma divergência entre as redes menores, estando a Bandeirantes mais alinhada. Os vínculos de São Paulo aparentam falar mais alto (tanto este como com os demais conglomerados midiáticos eletrônicos paulistas), nunca esquecendo que o padrinho político de Michel Temer, o ex-governador Adhemar de Barros, era sogro de João Jorge Saad, pioneiro do grupo Bandeirantes, sendo que a emissora antes pertencia ao próprio Adhemar. Os vínculos da garoa não se rompem tão facilmente. Já a relação com a família Marinho é sempre mais dura, sendo que no alto do Jardim Botânico, os herdeiros de Roberto Marinho reforçam a mensagem: "fazem a maré subir e baixar". Agora, é maré alta para os membros da Força Tarefa, e maré brava, ressaca, para as oligarquias políticas. No andar de baixo, a resistência à perda dos direitos sociais e trabalhistas fazem da mobilização de forças uma exigência para as correntes e tendências existirem na política de massas e reivindicativa.
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As distintas agendas da política: o fim da Nova República e a consecução das leis regressivas através de um governo ilegítimo - Instituto Humanitas Unisinos - IHU