13 Dezembro 2025
Fundos de pensão da Suíça consideram estratégia de exploração de combustíveis fósseis da estatal “inconsistente” com transição energética.
A informação é publicada por ClimaInfo, 12-12-2025.
Há quase dois meses a Petrobras recebeu do Ibama a licença para perfurar um poço de petróleo e gás no bloco FZA-M-59, na Foz do Amazonas. E um mês antes, a empresa levantou US$ 2 bilhões em títulos de dívida, distribuídos por seis grandes bancos: Bilbao Vizcaya Argentaria (BBVA), Citigroup, Deutsche Bank Securities, Itaú BBA, Santander e o suíço UBS Investment Bank.
Este último é parceiro de investimentos do Banco do Brasil e financiador da Petrobras via instrumentos financeiros desde 2021. E garantiu a distribuição de títulos no valor de US$ 333 milhões do total captado pela emissão.
No entanto, os riscos ambientais e climáticos da nova atividade da petrolífera na Amazônia e possíveis restrições para o uso desse capital não são mencionados no prospecto da emissão, como ocorre com outras operações do mesmo tipo de instrumento financeiro. Assim, a Petrobras pode utilizar os recursos como quiser – inclusive na Foz, mostram O Joio e o Trigo e o WAV.
Os US$ 2 bilhões levantados com a emissão poderão financiar dois terços do que a estatal prevê aplicar na exploração de combustíveis fósseis na Margem Equatorial – recursos que serão majoritariamente aplicados na Foz do Amazonas. O Plano de Negócios 2026-2030 da petrolífera projeta cerca de US$ 3 bilhões para explorar petróleo e gás na região nos próximos cinco anos.
Quanto ao bloco 59, os custos de implantação da atividade e do licenciamento ambiental foram declarados pela Petrobras em cerca de R$ 800 milhões, quase US$ 150 milhões. Ou menos de 10% do crédito viabilizado pelo título.
Quanto ao UBS, a política de sustentabilidade e risco climático do banco descreve que “transações diretamente relacionadas a ativos de perfuração em águas ultraprofundas estão sujeitas a uma maior diligência em matéria de sustentabilidade e risco climático”. As operações financeiras devem levar em consideração planos de prevenção e “resposta a derramamentos”, assim como o histórico socioambiental da empresa que recebe o investimento.
O banco suíço também se compromete a usar diretrizes do Banco Mundial para garantir que as operações financeiras não violem os Direitos dos Povos Indígenas – o que ocorreu no Bloco 59, lembra Luene Karipuna, coordenadora executiva da Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Amapá e Norte do Pará (Apoianp). Entre as práticas a serem seguidas pelos financiadores dos projetos estão a consulta prévia às comunidades e à garantia da manutenção de seus “meios de subsistência baseados em recursos naturais”. Nada disso, porém, aconteceu no licenciamento na Foz do Amazonas.
Um estudo da consultoria financeira holandesa Ortec Finance mostra que os fundos de pensão suíços correm o risco de perdas de lucros relacionadas ao clima de mais de 30% até 2050. No entanto, a demanda pelos títulos da Petrobras em setembro foi mais de três vezes superior à oferta.
Os investidores dos títulos cocoordenados pelo banco suíço em favor da Petrobras permanecem desconhecidos, pela falta de transparência de documentos financeiros. No caso do UBS, a lógica é que eles pertençam a sua base de clientes. Isso inclui não apenas os super-ricos nos EUA, Brasil ou Suíça, mas também grandes investidores institucionais, como fundos de pensão.
Diretora financeira do fundo de pensão de Genebra, o CPEG, um dos maiores da Suíça, Alessia Torricelli afirma que exclui empresas não alinhadas com uma transição de baixo carbono. Ela acrescenta que a atividade da Petrobras na Foz sinaliza ao fundo que “a direção estratégica já está clara e inconsistente com a trajetória de transição que esperamos das empresas de energia”.
Por causa do risco climático, também não estão investindo na Petrobras os fundos de pensão Basel-Stadt e Basel-Landschaft. O segundo afirma que empresas com classificações de governança muito baixas sob sua metodologia prestam atenção insuficiente aos riscos de transição, e é o caso da estatal.
Já a Publica – o maior fundo de pensão da Suíça – afirma que não compra títulos da Petrobras porque “em mercados emergentes, investe em títulos do governo, mas não em títulos corporativos”.
Diante das negativas, fica a pergunta: se ninguém “compra” a Petrobras, como pode a demanda pelo recente título da estatal ter sido três vezes maior que a oferta? Como a compra é sigilosa, a resposta é difícil. Mas sabe-se que mentir e disfarçar não são práticas incomuns quando se trata de ganhar dinheiro no “amorfo” mercado financeiro.
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