Por que a Igreja louva Maria, mas deixa as mulheres no banco? Artigo de Fabrizio Mastrofini

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21 Agosto 2025

"Hoje, aqueles mitos fortes dos primeiros séculos não servem. Fazem parte da história, da história da teologia, da história da devoção, da história do culto. Hoje, serve a plena igualdade entre mulheres e homens. Nem precisa mais ser lembrado. Deve ser feito abrindo o acesso às mulheres para todos os papéis reservados aos homens por um pesado legado cultural", escreve Fabrizio Mastrofini, jornalista e ensaísta italiano, em artigo publicado por l'Unità, 20-08-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.

Eis o artigo.

D. Paglia atualiza a Festa da Assunção e nos fornece um exemplo extraordinário de como o gênero literário da homilética pode se tornar interessante. "Hoje, Festa da Assunção, significa que Deus derrubou os poderosos de seus tronos e elevou as mulheres humildes e desconhecidas, mandou de volta os ricos e fortes de mãos vazias e saciou de bens as mulheres famintas de pão e amor, amizade e ternura".

Belíssimo. É uma página de Dom Vincenzo que deve ser lida e relida. Para entender onde a Igreja falha sem "se" nem "mas". Vítima do peso de seu próprio desejo de valorizar as mulheres. Mas se as mulheres são realmente tão importantes, e são, por que estamos discutindo? Por que não tornar efetiva uma igualdade, não mais adiável? As aporias das quais Dom Vincenzo é vítima inconsciente são as mesmas da Igreja como um todo. Usamos as mesmas palavras do nosso monsenhor quando escreve: "Maria foi elevada ao céu com seu corpo. Na realidade, essa convicção tem suas raízes nos primeiros séculos da Igreja".

Eis a questão: nos primeiros séculos, isto é, quando a teologia do cristianismo estava sendo definida. Convicções fruto da época, de juízos, de preconceitos, de conhecimento do período histórico específico e contextos culturais. Portanto, a "coisa" poderia também ser mudada, e sem medo. Vou expressar isso com as palavras do então teólogo Joseph Ratzinger, antes de se tornar cardeal e papa. Em seu livro Introdução ao cristianismo (edição alemã de 1968, edição brasileira de 1970, Herder) – um verdadeiro clássico da teologia, continuamente reimpresso e traduzido – encontramos uma afirmação surpreendente que nunca foi desmentida. Ratzinger escreveu: “De acordo com a fé eclesiástica, a filiação divina de Jesus não se funda no fato de não haver ele tido um pai humano; a divindade de Jesus não ficaria abalada se ele tivesse nascido de um matrimônio humano normal. A filiação divina, de que nos fala a fé, não é, com efeito, um fato biológico, mas ontológico; não um acontecimento no tempo, mas na eternidade de Deus” (p. 130).

Portanto, não é herético afirmar que Jesus seria filho de Deus mesmo dentro de um casamento humano normal. Certamente, muitos fiéis se escandalizam ao saber que o futuro papa levantou a hipótese da não virgindade perpétua de Maria. A suspensão das leis biológicas e físicas permite à Igreja afirmar que Jesus ressuscitou dos mortos e Maria foi elevada ao céu viva, em corpo e alma.

Mas essas são afirmações ontológicas, não biológicas.

Claro? São maneiras de narrar outra realidade, de dar esperança a pessoas de todos os tempos e culturas. E então, se assim for, se a história de uma mulher se tornar o paradigma de uma jornada de "libertação", primeiramente interior e depois exterior, que toda a Igreja tenha a coragem de se libertar do peso dos condicionamentos históricos. Sem rodeios, Monsenhor Paglia nos diga que a libertação de todas as formas de escravidão, antigas e modernas, diz respeito a mulheres e homens. E que as primeiras passem a ter plena cidadania em todos os lugares, a começar pela Igreja. Hoje, aqueles mitos fortes dos primeiros séculos não servem. Fazem parte da história, da história da teologia, da história da devoção, da história do culto.

Hoje, serve a plena igualdade entre mulheres e homens. Nem precisa mais ser lembrado. Deve ser feito abrindo o acesso às mulheres para todos os papéis reservados aos homens por um pesado legado cultural. Essa será a Igreja Católica do futuro. E deixemos a Assunção em paz no céu, para quem pensa que ela está lá.

Nós, na Terra, precisamos de caminhos a seguir, lendo e relendo o Evangelho.

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