06 Agosto 2025
"Análises críticas da realidade que não apontam nenhum caminho ou frestas que geram esperanças atuantes não são críticas, e podem ser apenas um desabafo que pode nos levar desespero. E o desespero por muito tempo é insuportável e as pessoas preferem uma ilusão, de preferência religiosa, do que um discurso repetitivo e desesperador", escreve Jung Mo Sung, teólogo católico e cientista da religião.
Em 04-08-2015, o Instituto Humanitas Unisinos – IHU publicou uma entrevista do famoso antropólogo Tim Ingold em que ele diz: “tenho a esperança de que a trajetória atual da sociedade se desmorone, que entre em colapso. Então, teremos a oportunidade de construir sobre outros alicerces e, talvez, nesse momento, este tipo de pensamento ajude a guiar as pessoas sobre como realizar a reconstrução. No entanto, não seremos capazes de instaurar esta forma de pensar dentro do tipo de sociedade atual”.
A esperança de que tudo o que conhecemos entre em colapso e que, de uma forma que não sabemos, possa surgir algo novo e bom é um desejo muito antigo na história da humanidade. Tão antigo e novo, novo no sentido de que se usa terminologias ou teorias novas para justificar uma esperança marcada pelo desespero.
Essa relação estranha entre uma esperança radical – que criaria algo totalmente novo e, portanto, aquilo que não somos nem capazes de “instaurar esta forma de pensar dentro do tipo de sociedade atual” (como diz Ingold, nessa citação) – e o desespero de reconhecer que não somos capazes nem de expressar o que desejamos nessa esperança. Assim, a única esperança seria o colapso, o fim, do mundo que vivemos e conhecemos. É uma lógica racionalmente estranha, mas compreensível e muito comum nas culturas antigas e religiosas.
Nos meados do século XIX, por exemplo, tivemos nos Estados Unidos vários movimentos de comunidades que buscaram um sentido de futuro na história em uma situação em que lhes parecia estar contra e de frente a uma parede intransponível. O impacto da revolução industrial e de novas teorias científicas e teológicas na sua vida cotidiana lhes parecia o fim do mundo, que era o seu mundo. Uma das respostas foi a esperança desesperada de que Jesus estava voltando e, com a sua volta do Messias, eles veriam a destruição do velho mundo e a instauração do novo mundo.
Eu não quero debater aqui as teorias de Tim Ingold ou dos cristãos que ainda estão discutindo os detalhes da segunda vinda de Jesus no mundo, mas apontar que estamos vivendo de novo um tempo em que muitos de nós somos “tocados” pelo desespero, o mal-estar de não termos esperança que nos aponte para um caminho possível. Para pessoas de fé religiosa ou para teólogos/as parece que há uma saída: a noção de fé de que para Deus tudo é possível e, portanto, “no fim, tudo vai dar certo”; ou teorias teológicas que narram que o Espírito de Deus está agindo no universo (seja na linha de Teilhard de Chardin ou de ecoteologias processuais...). Mas, se levarmos a sério essa linha de argumentação, então chegaremos à conclusão lógica de que não há necessidade de nos preocuparmos e, portanto, não lutarmos, porque no fundo “tudo vai dar certo”.
Para os que já se superaram linguagem religiosa tradicional, há possibilidade da aposta de que a esperança (desesperadora) de que saída se encontra na destruição do mundo que conhecemos e algo novo, do qual não sabemos nada, surgirá e será bom.
Quando se elabora um discurso de esperança em que não sabemos o que e como podemos agir, temos uma esperança expectante, uma que espera, mas não sabe o que fazer; enquanto que o que precisamos é uma esperança atuante, aquela que nasce de ações concretas possíveis e nos leva a agir com perseverança. A esperança expectante, em uma situação de injustiça e de destruição, leva as pessoas à solução pedida pelos discípulos a Jesus, quando eles não conseguiram convencer os samaritanos: “Senhor, queres que digamos que desça fogo do céu e os consuma, como Elias também fez?” (Lc 9,52) E a resposta de Jesus foi: não foi para destruir que o Filho do Homem veio ao mundo, mas para salvar a vida das pessoas.
Teologias e/ou teorias sociais, assim como linguagens religiosas e/ou sociais, precisam ser capazes de mostrar, de revelar, caminhos ainda não bem conhecidos, mas que podem ser geradores de lutas humanizadoras e libertadoras. Análises críticas da realidade que não apontam nenhum caminho ou frestas que geram esperanças atuantes não são críticas, e podem ser apenas um desabafo que pode nos levar desespero. E o desespero por muito tempo é insuportável e as pessoas preferem uma ilusão, de preferência religiosa, do que um discurso repetitivo e desesperador.