10 Janeiro 2025
"Hoje em dia, Esperança é uma palavra usada em excesso, não mais uma deusa, mas uma divindade menor da vida cotidiana, a oração que fazemos a nós mesmos. Se a ansiedade é a representação mental das nossas angústias, a esperança é o seu oposto, um lavacro de água morna e tranquila onde o medo pode ser posto para descansar e imaginar um final diferente", escreve Viola Ardone, em artigo publicado por La Stampa, 05-01-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.
Para os clássicos, é o bem residual, a arma secreta daqueles que não têm mais nada. Para os cristãos, é uma virtude teologal, a expectativa de uma verdadeira salvação. Hoje é uma mulher que, em uma cela distante, prefigura sua própria liberdade.
Hesíodo nos conta que Prometeu, aquele que vê longe, tinha um irmão de visão curta, que de fato se chamava Epimeteu, o tolo. E para punir o primeiro, que havia dado o fogo para os homens, o pai dos deuses ordenou a Hefesto que criasse uma mulher belíssima, digna de todos os dons divinos e mortais, a quem justamente foi dado o nome de Pandora (do grego pan + doron, ou seja, “todo dom”).
Epimeteu quis se casar com ela, apesar da opinião contrária do irmão clarividente. A Pandora havia sido confiado uma caixa preciosa no qual Zeus havia trancado todos os males, recomendando, naturalmente, para que nunca a abrisse. Como sabemos desde Adão e Eva, toda proibição é feita para ser traída.
Também sabemos que, desde Adão e Eva, em virtude daquele robusto fio vermelho de misoginia que liga a História, é sempre uma mulher que trai, emblema do vício da curiosidade incoercível, mas também da suma virtude da desobediência e, em última análise, o primeiro motor da liberdade dos seres humanos: aquela da escolha. Eva colhe a maçã e dá início ao tempo e à história. Pandora abre a caixa e traz à Terra o livre-arbítrio e a responsabilidade de escolher entre o bem e o mal. Deve-se dizer, no entanto, que aquele vaso teria sido melhor ser mantido fechado: dele saíram, em rápida sucessão, os vícios, os medos, a dor, a maldade, as doenças e a morte. Mas, no final, Pandora percebe que algo ainda se agita em seu interior, um dom extremo: é a Esperança. E é justamente graças a ela, nos lembra Hesíodo, que os homens são capazes de suportar o resto.
Graças à “elpìs”, em grego antigo, ou “spes”, a palavra latina que etimologicamente chega até nós.
A Esperança é, portanto, o bem residual, o que resta quando tudo acaba, a arma secreta de quem não tem mais nada. Talvez seja por essa razão que os latinos a veneravam sob a forma de uma jovem com uma flor na mão direita e lhe conferiam o epíteto de “Spes última deusa”.
Para o mundo antigo e para nós hoje, a Esperança é dotada de uma natureza dupla, a de uma possibilidade de salvação que, no entanto, não é garantida e pode se revelar enganosa, frágil como a flor que a “última deusa” carrega na mão, remédio e veneno ao mesmo tempo, princípio tóxico e antídoto.
Com a pregação de Cristo, a esperança se tornará “bem-aventurada”, expectativa de uma salvação que é real e garantida para aqueles que creem, única alternativa verdadeira à mediocridade do mundo, aos desenganos terrenos. É a mais teleológica das virtudes cristãs - Fé, Esperança, Caridade - porque tem interface imediata com a vida eterna, e é por isso que os primeiros cristãos a representavam como uma âncora firmemente presa na vida após a morte.
Hoje em dia, Esperança é uma palavra usada em excesso, não mais uma deusa, mas uma divindade menor da vida cotidiana, a oração que fazemos a nós mesmos. Se a ansiedade é a representação mental das nossas angústias, a esperança é o seu oposto, um lavacro de água morna e tranquila onde o medo pode ser posto para descansar e imaginar um final diferente. A Esperança é o oposto da resignação, o sentimento do amanhã, um recurso extremo da imaginação e, ao mesmo tempo, um bem muito concreto e material a ser compartilhado com aqueles que o perderam totalmente. É também o movimento inverso da nostalgia, não o desejo de retornar a um belo passado, mas um impulso visceral em direção a um futuro melhor. E não é coincidência que o presidente Mattarella tenha decidido concluir seu discurso de fim de ano justamente com um hino à “deusa florida”. “A esperança não pode se traduzir apenas em uma espera ociosa. A esperança somos nós. O nosso empenho. A nossa liberdade. As nossas escolhas.”
A Esperança hoje também é uma mulher que, em uma cela distante, prefigura sua própria liberdade, porque sabe que seguiu o exemplo de Pandora, que deixa aberto o vaso enfeitiçado de onde vem o mal, e não o fecha, para si mesma e para os outros.
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Esperança, última deusa. Artigo de Viola Ardone - Instituto Humanitas Unisinos - IHU