24 Julho 2025
"Por conjectura, também é lícito seguir dizendo que a cultura capitalista, inclinada a favorecer o crescimento como instrumento capaz de organizar a vida moderna, nos obriga a viver no mundo insustentável de agora", escreve Marcus Eduardo de Oliveira, economista e ativista ambiental, autor de Civilização em desajuste com os limites planetários (CRV, 2018) e A civilização em risco (Jaguatirica, 2024), entre outros.
Enquanto a Terra grita, a degradação ambiental puxada pelas atividades humanas e pela expansão [suicida] do capitalismo mundial, deixa profundas marcas. Enquanto a temperatura global da atmosfera continua batendo recorde e as concentrações atmosféricas de CO2 continuam a subir, os ciclos naturais da Terra, indispensáveis ao projeto civilizatório, são severamente afetados. Isso é tão grave que a habitabilidade de regeneração do planeta, agora mesmo, está em risco.
Tal e qual, dentro da mesma lógica predatória própria do capitalismo devorador de recursos, a ideia de progresso conhecida, como não é difícil supor, se torna incompatível com a preservação do equilíbrio ecológico do planeta.
Nesse caso em particular, bem se vê que a sociedade de hiperprodução e hiperconsumo, capaz de evidenciar a escalada do consumo planetário, conseguiu produzir em escala mundial o que se chama de overshoot [sobrecarga] ecológica.
Quer dizer, a humanidade utiliza a natureza 1,8 vezes mais depressa do que os ecossistemas conseguem se regenerar. Em outras palavras, em apenas 7 meses, nós, os modernos, já consumimos (exploração de recursos talvez seja mais apropriado) tudo o que a Terra conseguiria repor ao longo de 2025.
Na conta desses abusos ecológicos, portanto, a constatação é uma só: estamos esgotando “o capital natural da Terra”, conforme consta em comunicado do Global Footprint Network, organização internacional responsável pelos cálculos da pegada ecológica da humanidade.
Efetivamente, na lista disso tudo, muito mais desmatamento, perda de biodiversidade, erosão do solo, fragmentação e habitats, acumulação de dióxido de carbono.
Em termos gerais, por conta de nosso pesado antropocentrismo central, influenciado pela corrida em busca de crescimento econômico transformador do meio ambiente, o conjunto de elementos e processos biológicos, químicos e físicos responsáveis pela vida na Terra são solapados.
Daí em diante, vendo a questão assim, precisamos refletir seriamente sobre o impacto do nosso consumo no planeta. Precisamos repensar nossas ações nas cidades, a forma como usamos a energia, como produzimos os alimentos e quais as possibilidades que temos para reduzir as emissões de carbono.
Parece certo dizer que, enquanto não mudarmos a tecnologia que cria coisas novas à base de destruir o planeta, tudo indica que seguiremos fingindo não acreditar que “nosso problema é o crescimento físico em um mundo finito”, como sentenciou tempos atrás Dennis Meadows, cientista americano.
Por conjectura, também é lícito seguir dizendo que a cultura capitalista, inclinada a favorecer o crescimento como instrumento capaz de organizar a vida moderna, nos obriga a viver no mundo insustentável de agora.
O detalhe mais relevante, seguindo de perto os especialistas, é que só sairemos desse buraco mediante uma radical intervenção, que necessariamente deve começar pela: 1) transição para fontes de energia renovável; 2) promoção da agricultura sustentável; 3) redução de desperdícios; 4) conscientização ecológica; 5) prática de consumo consciente.
Assim sendo, se faz parte da “fórmula” desse capitalismo-devorador de recursos naturais colocar em xeque o desempenho da vida humana e não humana, resta claro que precisamos imaginar outra economia, comprometida, antes de qualquer coisa, com a saúde do planeta, com a qualidade do sistema vida, com o nossos futuro comum e com a sustentabilidade.
Por sinal, sendo rigoroso na análise, já passou da hora de inaugurarmos a “economia do conhecimento da natureza” que Berta Becker [1930-2013] falava com propriedade.
Se o mundo está cada vez mais complexo, não surpreende perceber em linhas gerais que as chagas ambientais abertas pelo capitalismo voraz estão cada vez mais doloridas; que a capacidade biofísica do mundo natural está delicadamente comprometida e que as mudanças ecológicas e climáticas que estamos passando refletem no desequilíbrio da cadeia ecológica que rege o que mais importa, a vida na Terra.