27 Mai 2025
"Acabo de voltar da Argentina, de uma conferência internacional na Universidade Católica de Buenos Aires sobre o décimo aniversário da Laudato Si’, a encíclica do Papa Francisco que abre novos caminhos para os temas da proteção ambiental. Há um interesse extraordinário na Igreja”. Fala D. Vincenzo Paglia, presidente da Pontifícia Academia para a Vida, ao telefone entre um voo aéreo e uma conferência.
A entrevista com Vincenzo Paglia, é de Domenico Agasso, publicada por no La Stampa, 26-05-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.
Fale-nos sobre a Argentina, como a encontrou após a morte do Papa Francisco?
Foi uma viagem curta, mas intensa. Pesa, é claro, a morte do Papa Francisco. Mas há uma grande receptividade por Leão XIV. Falei de bioética (sim à defesa da vida em todos os contextos, em todas as fases e em todas as idades) e de 'humanismo planetário', ou seja, da urgência, em um mundo que está desmoronando, de que todos nós nos encaminhemos para realizar uma efetiva fraternidade tanto entre os povos quanto com a criação. É a ‘visão’ de que precisamos e que o Papa Francisco delineou com duas encíclicas, Laudato si' e Fratelli tutti.
Faz poucos dias, por indicação do Papa Leão, que o senhor deixou de ser Grão-Chanceler do Pontifício Instituto Teológico João Paulo II. Por quê?
É uma práxis normal na Cúria Romana: quando você completa 80 anos, todos os encargos expiram. Eu fiz 80 anos no dia em que o Papa Francisco morreu e a situação atrasou a notificação. Obviamente também termina, o mandato como presidente da Pontifícia Academia para a Vida. Na realidade, já aos 75 anos, como todo mundo, eu já havia apresentado minha renúncia ao Papa Francisco, que me disse para continuar até os 80 anos. Só isso.
Falando da Pontifícia Academia para a Vida, que horizonte é necessário para a conjuntura atual, no alvorecer da era da inteligência artificial?
Em primeiro lugar, a perspectiva de uma Bioética Global, com letras maiúsculas. A ciência e as tecnologias abrem novos e promissores campos, que são insidiados por implicações involutivas e dramáticas. A colaboração entre cientistas e pesquisadores abre novas dimensões para a duração da vida, as técnicas cirúrgicas e a inteligência artificial mudam toda a percepção do tempo e do sentido da vida, tanto individual quanto coletiva. Os novos problemas éticos têm uma dimensão de evidência global, que transcende as diferentes culturas e os níveis de desenvolvimento: porque tocam os fundamentos do aspecto humano, que é comum a todos: a configuração psíquica, a identidade sexual, a dignidade individual, o acesso a recursos, as liberdades essenciais. Essas maravilhas estarão disponíveis para poucos ou para muitos? Viveremos melhor, graças às novas tecnologias de aumento das potencialidades, ou nos eliminaremos mais facilmente, com o aumento da sofisticação dos aparatos militares de eliminação de resíduos?
O que fará agora?
Nesse sentido, não deixarei de continuar a cooperar de bom grado, aproveitando minha experiência e de acordo com minhas forças para o empenho com o qual todos nós - inclusive os 'idosos' - somos hoje chamados a responder. O Papa Leão já se mostrou decididamente sensível ao impacto profundo das novas tecnologias, cujo salto de qualidade exige uma mudança de ritmo correspondente do empenho cultural dos crentes. Nas formas que me forem possíveis, não me furtarei ao chamado.
Como o senhor vê o Papa Leão XIV? Fala-se muito sobre a continuidade entre um pontificado e o outro.
Sempre há continuidade na Igreja, mesmo na diferença. Há, de fato, uma linha de aprofundamento progressivo de temas, de acordo com a experiência e a época histórica, mas em continuidade. A partir de João XXIII, por exemplo, depois do Concílio, vemos claramente uma Igreja que quer estar presente no mundo; uma Igreja que se preocupa em escutar e recolher as alegrias e as tristezas, e que responde em nome do Evangelho, indicando a toda a humanidade o caminho do diálogo, da paz e do desenvolvimento integral das sociedades e das pessoas. As respostas não devem ser buscadas na afirmação dos egoísmos e de tornar alguém ou algum país maior do que os outros.
Que contribuição Leão XIV pode dar à relação entre a Igreja e a humanidade?
Ele fortalecerá o 'novo humanismo', que é exatamente o que precisamos. Precisamos abrir uma época na qual os conhecimentos são chamados a colaborar com vistas a um desenvolvimento sustentável para toda a humanidade. Precisamos de uma ‘visão’ que una os povos, respeitando suas diversidades. Parece-me que os primeiros passos de Leão XIV estão exatamente nessa linha: a Igreja pode ajudar a humanidade desorientada a redescobrir o sentido da vida e do destino comum. Como estava desorientada na época da Rerum Novarum de Leão XIII, no final do século XIX. Há uma necessidade urgente de nos perguntarmos como enfrentar os ‘novos desafios’ que temos pela frente.
Em que sentido?
Estamos em uma terceira guerra mundial 'em pedaços', como dizia o Papa Francisco, travada com extraordinária crueldade; contra civis, contra os inocentes como as crianças, as mulheres, os idosos. Mata-se e se deixa morrer de fome sem piedade. O futuro da humanidade está sendo fagocitado, hipotecando a coexistência pacífica; estamos deixando escombros em um rastro de horrores e erros que se repercutirão por décadas, hipotecando as relações entre os povos. E estamos perdidos. Não acredito em proclamações políticas de soluções fáceis para crises e dramas que não se quis prevenir quando era possível. Estamos perdidos, decepcionados; permitam-me dizer: indignados com a incapacidade da política e da diplomacia de resolver problemas. Precisamos de uma visão da humanidade pacificada. Um novo humanismo. O caminho existe: uma paz desarmada, desarmante, humilde e perseverante. Essas são palavras proferidas em 8 de maio pelo Papa Leão XIV. Que possam servir de guia e inspiração.