10 Abril 2025
A China respondeu às novas tarifas dos Estados Unidos anunciando, nesta quarta-feira (9), sobretaxas de 84% aos produtos americanos. A medida passa a valer a partir de quinta-feira (10) e representa um novo capítulo da guerra comercial entre as duas principais economias globais.
A reportagem é publicada por RFI, 09-04-2025.
"A taxa de tarifas alfandegárias adicionais (...) será elevada de 34% para 84% a partir desta quinta-feira às 12h01" pelo horário local, (1h01 de Brasília), afirmou o Ministério do Comércio chinês em um comunicado.
A resposta veio poucas horas depois que os Estados Unidos impuseram novas tarifas a quase 60 países. No caso da China, a medida representa uma taxa acumulada de 104%. "A escalada tarifária dos Estados Unidos contra a China acumula erros sobre erros e infringe seriamente os direitos e interesses legítimos da China", disse o ministério. Também "prejudica o sistema de comércio multilateral baseado em normas", acrescentou.
A China quer proteger a sua economia das tarifas americanas de 104% com o estímulo do consumo e investimentos em setores cruciais. Porém, analistas afirmam que o país continua muito vulnerável ao reflexo das medidas anunciadas por Donald Trump.
Pequim prometeu lutar "até o fim" contra a campanha tarifária de Washington. Na terça-feira (8), o primeiro-ministro Li Qiang declarou que a China confia "plenamente" na resistência de seu crescimento econômico.
Na prática, a economia chinesa enfrenta problemas mesmo antes das tarifas americanas, com o elevado índice de desemprego entre os jovens e uma crise imobiliária persistente que freia o consumo.
"A economia chinesa é muito mais fraca do que era durante o primeiro mandato de Trump e realmente não pode absorver o impacto das tarifas adicionais", analisa Henry Gao, especialista em Direito Comercial da Universidade de Gestão de Singapura.
No ano passado, o comércio exterior foi um dos poucos indicadores positivos da economia chinesa, tendo os Estados Unidos como principal destino dos produtos chineses.
As exportações do país asiático para os Estados Unidos alcançaram quase U$ 440 bilhões (R$ 2,6 trilhões) em 2024, segundo o Departamento de Comércio americano, muito acima do registrado no sentido contrário de U$ 114,6 bilhões (R$ 688 bilhões).
A maior parte das exportações é representada por produtos eletrônicos, máquinas e bens de consumo (têxteis, móveis, brinquedos).
Uma das razões pelas quais a China poderá enfrentar problemas é que "alguns produtos são concebidos especificamente para os mercados americano e europeu", afirma Tang Yao, da Escola de Negócios Guanghua da Universidade de Pequim.
Para o regime de Pequim, a crise prevista não deve ser vista como algo totalmente negativo. O Diário do Povo, órgão oficial do Partido Comunista Chinês, descreveu recentemente as tarifas americanas como "oportunidade estratégica", especialmente para transformar o consumo no novo motor do crescimento chinês, ao invés das exportações.
A China pretende "utilizar as pressões estruturais externas como catalisador para implementar reformas planejadas há muito tempo", explica Lizzi Lee, especialista em economia chinesa do Asia Society Policy Institute, uma organização com sede nos Estados Unidos.
Além das novas tarifas sobre produtos americanos, Pequim também anunciou restrições à exportação de terras raras, incluindo algumas utilizadas para a captura de imagens magnéticas e para produtos eletrônicos de consumo.
Outro plano de ação poderia ser o reforço do apoio financeiro ao setor privado, no momento em que os empresários voltam a ter uma boa relação com o presidente Xi Jinping, analisa Raymond Yeung, economista do banco ANZ.
O governo chinês defende uma autonomia estratégica maior do país no setor de tecnologia, para torná-lo menos dependente das oscilações geopolíticas. Por isso, apoia setores cruciais, como a Inteligência Artificial (IA) e os semicondutores.
"Mas isso não significa que a economia chinesa possa superar facilmente os efeitos das sobretaxas proibitivas", destaca Frederic Neumann, economista para a Ásia do HSBC.
Para o analista, Pequim poderia compensar a queda da demanda americana de várias formas, como programas de recompra de eletrodomésticos ou incentivos para estimular os consumidores a adquirir produtos chineses, de aparelhos de TV a carros elétricos.
"Criando demanda e oportunidades comerciais para os parceiros asiáticos e europeus da China, o país poderia ajudar a salvar o que resta da ordem comercial liberal mundial", pontua Neumann. A China tem "a oportunidade de assumir as rédeas da ordem econômica mundial, mas isso só poderá acontecer se a demanda interna aumentar e se a liderança chinesa preencher o vazio deixado pelos Estados Unidos", acrescenta.