28 Março 2025
“Você já ouviu o que os sábios dizem? Todo o futuro existe no passado”.
O artigo é de Gianfranco Ravasi, ex-prefeito do Pontifício Conselho para a Cultura, em artigo publicado por em Il Sole 24 Ore, 24-03-2025. A tradução de Luisa Rabolini.
Estudar o antigo. A Rivista di Archeologia Cristiana comemora seu centenário com uma edição especial que acompanha toda a diacronia dos eventos vividos. Era 06-01-1852 que Pio IX instituía a Pontifícia Comissão de Arqueologia Sacra “para salvaguardar os antigos cemitérios sagrados, para cuidar de sua conservação, as exploração, investigação e estudo, para proteger as memórias mais antigas dos primeiros séculos cristãos”. Com Pio XI nos Pactos de Latrão (art. 33 da Concordata) de 1929, era confirmada essa pertinência ao cuidado da Santa Sé das mais de cem catacumbas cristãs que existiam no território italiano, da Toscana à Sicília e especialmente em Roma, uma atribuição confirmada na revisão da Concordata em 1984 (art. 12).
Na raiz da identificação científica desse imenso patrimônio arqueológico de extraordinária grandeza (às vezes mais de 12 quilômetros de corredores com túmulos em cinco/sete andares) no âmago do território romano havia se distinguido o jovem arqueólogo Giovanni Battista de Rossi (1822-1894), responsável pela redescoberta de uma espécie de arquétipo, a Tricora da catacumba de São Calisto na Via Ápia, e autor de uma fundamental Roma subterrânea cristã (1844). Mais tarde, em 11-12-1925, Pio XI criava o Pontifício Instituto de Arqueologia Cristã, um órgão acadêmico dedicado ao estudo e ao ensino dos primeiros monumentos cristãos. Um ano antes (1924) nascia a Rivista di Archeologia Cristiana, o órgão científico oficial da Pontifícia Comissão de Arqueologia Sagrada e do Instituto de Arqueologia Cristã.
Por ocasião do centenário dessa revista, que desfruta de prestígio internacional entre os estudiosos, decidiu-se preparar uma edição comemorativa que acompanhasse toda a diacronia dos eventos vividos por aquelas páginas, mas também elaborando alguns ensaios emblemáticos. Deles emergem cenários surpreendentes, como a interlocução com aquele imenso depósito de memórias arqueológicas que é a Terra Santa, a epigrafia, a arquitetura, a hagiografia, as basílicas subterrâneas, as comparações com o patrimônio arqueológico cristão do Mediterrâneo e até mesmo uma curiosa pesquisa iconográfica sobre o “anjo vermelho e o anjo turquesa”... É claro que tudo isso é acompanhado por notas gerais sobre as restaurações realizadas com uma instrumentação tecnológica cada vez mais sofisticada (especialmente com o uso de lasers) ou sobre a topografia que cresceu progressivamente com as várias prospecções. A paixão que alguns pontífices reservaram a essa disciplina é bem conhecida, e os Museus Vaticanos são um extraordinário testemunho disso. Eles foram idealmente gerados em uma fria manhã de 14 de janeiro de 1506, quando, de um pedaço de terra na colina Oppio, entre a basílica de Santa Maria Maior e o Coliseu, despontou o impressionante grupo marmóreo de Laocoonte que o Papa Júlio II quis adquirir e colocar no Vaticano, após a calorosa sugestão de Michelangelo e do arquiteto Giuliano di Sangallo. Ele ainda pode ser visto hoje em toda sua dramaticidade no Pátio Octogonal do Museu Pio-Clementino.
Em alguns casos, o diálogo entre a nova religião e o classicismo se manifestava nos afrescos das catacumbas, como no caso de Cristo representado de acordo com a iconografia de Orfeu, que atrai as almas com o som de sua cítara, uma imagem que retomei em 2010 para a comunicação do meu cardinalato. Como se dizia, algumas seções dos Museus Vaticanos testemunham a paixão arqueológica de alguns pontífices: o Museu Chiaramonti (Pio VII) é uma espécie de “floresta” estatuária greco-romana e a Galeria Lapidária é uma incrível “biblioteca” de pedra com 3.614 epígrafes do século I a.C. ao século VI d.C., sem mencionar a tríade de museus criada pelo Papa Gregório XVI, o Gregoriano Egípcio, o Gregoriano Etrusco e o Gregoriano Profano. Mais tarde, o interesse se expandiu, especialmente com a presença dos missionários, para civilizações distantes, como a latino-americana, a australiana, a asiática, a africana e assim por diante.
Nascia assim um sugestivo e riquíssimo Museu Etnológico Vaticano, que foi reformado nos últimos anos pelo padre Nicola Mapelli. A ele devemos agora, com um título emblemático – que é também o título atribuído ao Museu – o fascinante livro Anima mundi, dotado de uma iconografia emocionante. Trata-se de uma espécie de visita panorâmica àquelas salas cheias de surpresas.
De fato, nelas desfilam estátuas de divindades, homens e animais, máscaras cerimoniais, pinturas, cetros, discos, textos com iluminuras, vestimentas rituais, instrumentos de sacrifício, relicários, ornamentos diversos e muito mais. É uma experiência que confirma o forte entrelaçamento entre arqueologia, antropologia cultural, etnologia, ciências humanas em geral e os próprios processos históricos e culturais, conforme proposto a esse respeito pela Nova Arqueologia de Lewis R. Binford.
Além disso, como é bem sabido, com Michel Foucault e sua Arqueologia do Saber (1969), a pesquisa e a metodologia arqueológicas tornaram-se um paradigma hermenêutico-simbólico para outras disciplinas (basta pensar também em Georges Dumézil e Marc Bloch). Para concluir, talvez caiba uma frase do primeiro romance de Truman Capote, Outras vozes, outras salas (1948): “Você já ouviu o que os sábios dizem? Todo o futuro existe no passado”.