15 Janeiro 2025
"O convite dirigido pelo governo polonês a Netanyahu para comemorar a libertação de Auschwitz, teatro e símbolo do genocídio judeu, constitui um insulto àquela parte do povo de Israel que condenou suas ações como criminosas, além de conscientemente mortífera em relação ao imperativo de salvar os parentes e concidadãos, ainda reféns do Hamas", escreve Antonio Gibelli, historiador italiano, em artigo publicado por Il Manifesto, 14-01-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.
Em 27 de janeiro Auschwitz não é território polonês. É território da humanidade. A presença do criminoso Netanyahu seria uma ofensa não apenas aos sobreviventes, mas também às vítimas do Holocausto, que veriam sua memória profanada.
Benjamin Netanyahu, chefe do governo israelense, tem em sua consciência o extermínio, desde 7 de outubro de 2023, de acordo com números oficiais, de cerca de 47.000 palestinos, a maioria civis. De acordo com estimativas da prestigiosa revista científica The Lancet, calculada com base em levantamentos feitos até 30 de junho de 2024 e suas projeções, a estimativa atual sobe para cerca de 70 mil.
Esses cálculos não incluem as deficiências físicas e mentais permanentes, nem as vítimas causadas por subnutridas, frio, falta de cuidados médicos e cirúrgicos devido à destruição de hospitais e à morte ou prisão de médicos e enfermeiros, bem como a proibição de organizações internacional de assistência. No inferno de Gaza, o cálculo da vida e da morte continua sendo um exercício improvável.
Uma comissão especial da ONU resumiu a situação em Gaza em 14 de novembro último, afirmando que as políticas e práticas de Israel são “coerentes com as características de genocídio” e listando em detalhes os fatos confirmados que justificam essa afirmação.
Por sua vez, em 21 de novembro, o Tribunal Penal Internacional de Haia, ao qual todos os países europeus e a maioria dos não europeus aderem, emitiu um mandado de prisão internacional para Netanyahu e seu ex-ministro da defesa, Gallant, sob a acusação de terem cometido e continuarem a cometer esses crimes.
O convite dirigido pelo governo polonês a Netanyahu para comemorar a libertação de Auschwitz, teatro e símbolo do genocídio judeu, constitui um insulto àquela parte do povo de Israel que condenou suas ações como criminosas, além de conscientemente mortífera em relação ao imperativo de salvar os parentes e concidadãos, ainda reféns do Hamas. Representa uma afronta à grande parte dos judeus da diáspora que se uniram a essa condenação, considerando-a como uma forma de “suicídio” de Israel, de sua reputação e identidade.
E para a grande parte da opinião pública mundial que se uniu à condenação em nome dos direitos humanos mais elementares. Também, e acima de tudo, os estudantes (italianos, europeus, estadunidenses) que foram insultados como antissemitas e expostos ao ridículo como ignorantes quando pediam a interrupção das relações acadêmicas com Israel em assuntos com possíveis recaídas militares.
Mas em tudo isso há algo mais dramático e irreversível. Auschwitz não é um território polonês. É um território da humanidade. Não é apenas um patrimônio judeu, mas patrimônio da humanidade.
A presença do criminoso Netanyahu em Auschwitz seria uma ofensa não apenas aos sobreviventes, mas às vítimas do Holocausto, que veriam sua memória profanada. É por isso que a Europa intimou que a Polônia parasse. É por isso que o papa tem repetidamente levantado sua voz em forte e clara.
A presença de Netanyahu em Auschwitz despojaria o local de toda sacralidade. Isso marcaria - uso conscientemente a expressão excessivamente usada - um ponto de virada histórico. Ou seja, o fim de uma época em que a memória de Auschwitz foi um dos paradigmas centrais, aquele resumido no lema: nunca mais.
Netanyahu no local símbolo do Holocausto? Não em meu nome. É isso que os governos e os povos devem gritar se quiserem esconjurar uma catástrofe da civilização que está às portas, para não dizer já consumada.
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A profanação de Auschwitz, patrimônio de todos. Artigo de Antonio Gibelli - Instituto Humanitas Unisinos - IHU