04 Dezembro 2024
O bispo franciscano da metrópole: “Tememos que o conflito se espalhe. Os rebeldes nos disseram que não nos farão mal, mas o número de vítimas está aumentando”.
A entrevista é de Domenico Agasso, publicado por La Stampa, 03-12-2024. A tradução é de Luisa Rabolini.
“Estamos vivendo há treze anos em um maldito conflito interminável. Agora, de repente e em apenas dois dias, Aleppo caiu nas mãos dos rebeldes: uma velocidade nunca vista na história. Há muito medo, o abismo está muito próximo, mas nós, como Igrejas, permanecemos aqui, com o nosso povo”.
Ao telefone, da cidade síria conquistada pelos jihadistas, o bispo franciscano Monsenhor Hanna Jallouf, Vigário Apostólico para os católicos de rito latino, nos fala da situação com voz cansada, mas não resignada.
Excelência, qual é a atmosfera nessas horas?
Precária. Espectral. A cidade está paralisada pela confusão, pelo terror e pela incerteza, com o abismo muito próximo. De repente, em apenas dois dias, caiu nas mãos dos rebeldes. É incrível, nunca na história uma cidade tão grande foi tomada tão rapidamente. É algo impensável.
Como se explica isso?
É possível que tenha havido acordos entre a Turquia e os rebeldes para pressionar o presidente Bashar Al-Assad a realizar novas negociações de paz no Oriente Médio. Além disso, a incursão, na verdade, foi facilitada pelo afastamento dos iranianos dos postos estratégicos por causa das tensões com as autoridades sírias. E os russos não estão aqui no terreno com os fuzis, eles só intervêm com os aviões. Assim, os rebeldes encontraram o caminho livre e se aproveitaram.
Como as pessoas estão vivendo neste momento?
A maioria das pessoas está trancada em suas casas. Anteontem, foi imposto um toque de recolher de quase 24 horas, mas ontem foi reduzido para 12 horas. Algumas pessoas estão começando a sair, mas apenas para comprar alimentos e itens de primeira necessidade. As ruas, no entanto, estão praticamente desertas.
Há escassez de alimentos?
A água corrente foi religada em algumas áreas e a eletricidade está funcionando, às vezes de forma intermitente. Os alimentos estão começando a chegar, e o pão está sendo distribuído em vários lugares. Esperamos que, pouco a pouco, a situação, do ponto de vista humanitário, melhore.
Alguém conseguiu se refugiar em Damasco?
Sim, muitos foram embora. Com o agravamento dos combates, as famílias ficaram com medo, e aqueles que tiveram a chance decidiram fugir.
E as igrejas?
Optamos por ficar com nossos fiéis aqui em Aleppo. É nossa tarefa apoiá-los, acompanhá-los em seu sofrimento e compartilhar esse momento dramático com eles. A luta da vida, pela vida, continua, e queremos enfrentá-la juntos.
Como vocês, franciscanos, estão após o ataque que atingiu o Colégio Terra Santa, o instituto dentro do complexo do Convento, perto da igreja?
Um avião russo bombardeou a área e um míssil caiu bem dentro do Colégio. Os danos foram grandes, especialmente em dois prédios. Graças a Deus, porém, ninguém ficou ferido ou morreu, nem os trabalhadores nem os frades. Foi um milagre, porque o Colégio é um ponto de encontro para todos os cristãos de Aleppo: considerando que todos os domingos mais de 2.000 pessoas se reúnem aqui, se isso tivesse acontecido em um dia normal, e não sob toque de recolher, teria sido um massacre.
Estão prevendo agora uma contraofensiva das forças do governo?
Fontes do governo falam de um contra-ataque iminente, mas não sabemos o quanto isso é verdade. A rapidez com que os rebeldes assumiram o controle de Aleppo e das cidades vizinhas sugere que também houve erros ou acordos por debaixo dos panos. Agora, os aliados do presidente Assad, Irã e Rússia, estão manifestando seu apoio. Veremos o que acontecerá. Nestas horas, reina a confusão.
Houve derramamento de sangue...
Sim, infelizmente. Por exemplo, em frente à Universidade de Aleppo, pelo menos 30 pessoas perderam a vida, além de haver muitos feridos. Também houve mortes em outras áreas da cidade, atingidas tanto pelos rebeldes quanto pelos mísseis russos.
E quanto aos civis?
Quando os rebeldes chegaram a Aleppo, adotaram uma atitude cautelosa, tranquilizando-nos com mensagens como: 'Não estamos aqui para causar nenhum mal'. Até agora, eles têm demonstrado respeito para conosco. Entre os cristãos, não há vítimas no momento. Mas, entre os muçulmanos, sim.
Qual é o seu maior medo?
Tememos que o conflito continue e que o número de vítimas aumente, com bombas e mísseis caindo sobre nossas cabeças. Estamos preocupados pela população civil. Preocupa-nos o futuro das pessoas em uma região cada vez mais instável que já está de joelhos. Além disso, é angustiante a incerteza causada por algumas questões cruciais: a estratégia dos rebeldes é dominar toda a Síria? Como o governo e os aliados reagirão? E o restante da comunidade internacional? Quais serão as relações entre cristãos e muçulmanos?
No Angelus, o Papa rezou pela Síria, “onde, infelizmente, a guerra voltou”.
É isso mesmo, o conflito voltou a explodir depois de uma aparente parada. Esperamos que não haja uma escalada, porque já houve derramamento de sangue demais. Estamos cansados dessa maldita guerra civil que vem se arrastando desde 2011. E, como se não bastasse, o recente terremoto de 2023 agravou ainda mais as emergências humanitárias, causando enormes problemas novamente em Aleppo. Agora, com essa nova onda de violência, as feridas continuam a sangrar ou se reabrem, em um contexto de grande pobreza e insegurança.
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“Cansados de uma guerra maldita, Aleppo está paralisada pelo terror”. Entrevista com Hanna Jallouf - Instituto Humanitas Unisinos - IHU