Lideranças irão acompanhar reunião sobre lei que a própria Corte já disse ser inconstitucional; Organizações de base preparam protestos em todo o país.
A reportagem é publicada por ClimaInfo, 05-08-2024.
Povos Indígenas estão mobilizados em todo o país para protestar contra a mesa de conciliação criada pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes para discutir a Lei 14.701/2023, que estabeleceu o marco temporal e vem sendo chamada de “Lei do Genocídio Indígena”. O primeiro encontro da mesa irá ocorrer nesta 2ª feira (5/8).
De acordo com a Associação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), um grupo irá acompanhar a reunião na Praça dos Três Poderes, em Brasília, a partir das 14h. As organizações de base também irão promover manifestações contra a proposta em várias partes do país. E um twitaço no X está previsto para às 10h.
O encontro terá participação de 6 representantes indicados pelo Congresso Nacional [3 de cada casa], 4 pelo governo federal, 2 pelos estados e 1 pelos municípios, detalha a Carta Capital. O Supremo concedeu apenas seis vagas para a APIB, apesar de a entidade ser composta por sete organizações regionais de base que representam mais de 200 Povos Indígenas do Brasil.
“Eles são maioria e não estão interessados em defender os nossos direitos, mas vamos nos mobilizar ao redor do país. Iremos nos manifestar em todos os territórios, cidades e redes sociais! Nossas bases, indigenistas, organizações dos movimentos sociais, celebridades e comunicadores estarão conosco”, diz Kleber Karipuna, representante da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB) na coordenação da APIB.
A mesa de “conciliação” sobre o marco temporal é dominada pela direita, destaca Rubens Valente na Agência Pública. Além disso, Gilmar decidiu que o Ministério Público Federal (MPF) somente poderia participar “na condição de observador”. Decisão que foi referendada pelo procurador-geral da República, Paulo Gonet, o que foi criticado pela APIB, relata ((o))eco.
“A Constituição reserva ao MPF uma função bem diferente. O artigo 232 diz que os indígenas ‘são partes legítimas para ingressar em juízo em defesa de seus direitos e interesses’ e que o Ministério Público deve ‘intervir’ em ‘todos os atos do processo’. Enquanto Gonet vira espectador, a direita não perde tempo e ocupa os espaços a fim de pautar os trabalhos da comissão. O Fórum Nacional dos Governadores indicou como membro titular o governador de Mato Grosso do Sul, Eduardo Riedel (PSDB), um apoiador declarado de Jair Bolsonaro. Para suplente, foi indicado um dos políticos mais bolsonaristas do país, o governador Jorginho Mello (PL-SC)”, detalha Valente.
O mais revoltante na “conciliação” é que o próprio STF já decidiu que o marco temporal é inconstitucional. Contudo, de forma monocrática, Gilmar decidiu “debater” a lei aprovada pelo Congresso, suspendendo todas as ações de inconstitucionalidade da legislação na corte.
Em artigo na Folha, Txai Suruí reitera que não há possibilidade nenhuma de negociação quando se trata de Direitos Humanos fundamentais, como é o caso do direito dos indígenas a seus territórios. “O aumento da violência contra as comunidades [ver nota a seguir] confirma que a manutenção da vigência da lei alimenta os conflitos”, destacou.
Para Conrado Hübner Mendes, professor de direito constitucional da USP, doutor em direito e ciência política e membro do Observatório Pesquisa, Ciência e Liberdade da SBPC, a “conciliação” proposta por Gilmar é inadmissível. Porque criou uma negociação compulsória entre violadores e violados, onde apenas uma parte tem autonomia da vontade.
“Quando um tribunal constitucional não aguenta o peso de aplicar a Constituição em favor do mais fraco, e monta mesa de ‘conciliação’ entre ‘partes’, deixa de ser participante do constitucionalismo e entra para o clube privê do ‘constitunegocialismo’. Juízes constitunegocialistas não vieram ao mundo para julgar. Vieram a negócios. Negociam o público para ganhos privados”, criticou ele, em artigo na Folha.
MidiaMax, Jornal GGN e CNN também repercutiram a “conciliação” de Gilmar e a mobilização dos indígenas.
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