23 Julho 2024
"É a primeira vez que um tribunal internacional afirma a ilegalidade da ocupação israelense como tal, com a consequência de que, para pôr fim ao ato ilícito, Israel deve se retirar dos territórios".
É assim que a jurista Alessandra Annoni, associada de direito internacional da Universidade de Ferrara, resume a historicidade do que foi ouvido ontem em Haia. Um parecer histórico, portanto.
A reportagem é de Chiara Cruciati, publicada por Il Manifesto, 20-07-2024.
O parecer de 2004 sobre o muro de separação israelense dizia respeito a uma questão específica: a legitimidade da construção do muro na Palestina. O Tribunal havia afirmado a sua ilegitimidade e, consequentemente, a obrigação de Israel de desmantelá-lo. No entanto, não definiu consequências sobre a ilegitimidade da ocupação como tal; não era o objeto da demanda da Assembleia Geral.
Desta vez, a pedido da Assembleia sobre um assunto muito mais amplo, o Tribunal enfrentou corajosamente todos os aspectos, avaliando a ocupação e as políticas israelenses à luz do conjunto das normas de direito internacional, concluindo que a ocupação é ilegítima.
O Tribunal reconstrói toda a estrutura administrativa, jurídica e militar da ocupação, junta as peças e fala de anexação de fato.
É muito específico e apresenta afirmações que não são de forma alguma óbvias, como a que diz respeito ao apartheid. O Tribunal reconhece a violação do Artigo 3 da Convenção contra a Discriminação Racial, que proíbe a segregação racial.
A anexação de fato se traduz automaticamente em apartheid quando priva de direitos uma parte da população presente no território?
As duas coisas não estão necessariamente conectadas, trata-se de violações distintas. A anexação de fato estende a aplicação da lei israelense a territórios que não fazem parte do Estado de Israel. Não se trata de uma anexação formal, como a da Rússia com o Donbass, para explicar melhor. A violação referente à discriminação contra os palestinos e à instauração de um regime de apartheid é distinta: depende da aplicação de medidas como as estradas separadas, o duplo padrão legal, o diferente reconhecimento da maioridade, etc. Medidas que são práticas discriminatórias.
Existe uma ocupação legítima para o direito internacional se ela for limitada no tempo e ditada por urgências específicas?
O direito internacional não define nenhuma ocupação militar como legítima ou ilegítima. O regime de ocupação regula uma situação de fato na qual, no decorrer de um conflito armado, uma parte ocupa o território da outra. As normas sobre a ocupação se preocupam em regular tal situação, mas não se pronunciam sobre sua legitimidade nem estabelecem limites de tempo. É verdade, entretanto, que uma ocupação particularmente prolongada como essa pode ser acompanhada pela adoção de medidas, práxis e práticas. O que o Tribunal explica é que o que torna a ocupação israelense ilegítima são todas as outras violações: colônias, transferimento da própria população, discriminação racial, confiscos.
Que obrigações têm os Estados terceiros?
As violações acarretam uma série de consequências não apenas para o Estado que as comete, mas também para Estados terceiros. Em primeiro lugar, a proibição de reconhecimento, ou seja, a proibição de reconhecer como lícita a modificação de território ou status de determinados territórios. Transferir a embaixada de Tel Aviv para Jerusalém, por exemplo, implica um reconhecimento implícito da legitimidade do poder israelense sobre Jerusalém Oriental. Em segundo lugar, a proibição de prestar assistência, militar, política ou de outra natureza, ou seja, de fornecer armas e instrumentos que possam ser utilizados para manter a ilegítima ocupação israelense. Por fim, a obrigação de cooperar para pôr fim à ocupação ilegítima, a mais difícil de ser concretizada. Nesse ponto, o Tribunal é muito clara ao afirmar que a responsabilidade em estabelecer quais sejam as melhores maneiras de chegar rapidamente ao fim da ocupação recai cobre a Assembleia Geral das Nações Unidas.
Entretanto, se trata de um parecer não vinculante. Mesmo assim, a Assembleia Geral tem a obrigação de intervir?
Foi a Assembleia que solicitou esse parecer e as avaliações de direito que o Tribunal Internacional de Justiça realiza são vinculantes para os órgãos das Nações Unidas. Se o seu órgão judicial lhe disser que isso é o direito, a Assembleia Geral e o Conselho de Segurança devem tirar as devidas consequências.
Em seis meses, testemunhamos a um novo protagonismo do direito internacional, primeiro a decisão sobre o genocídio plausível em Gaza e agora esse parecer sobre a ocupação. Terão efeitos concretos?
Os órgãos da justiça internacional estão fazendo a sua parte. O Tribunal Internacional de Justiça está analisando escrupulosamente as questões que lhe são apresentadas. Mas, como um dos juízes escreveu em uma das opiniões separadas sobre o caso da África do Sul contra Israel, "court is just a court", o tribunal é apenas um tribunal. A avaliação jurídica do conteúdo do direito internacional deve ser seguida por uma ação por parte dos Estados que têm a obrigação de traduzir essas avaliações em ações políticas sérias.
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"Agora ações políticas sérias: a bola passa para a ONU". Entrevista com Alessandra Annoni - Instituto Humanitas Unisinos - IHU