10 Julho 2024
A história de Alice Bianchi, como a história de toda mulher na Igreja, é uma história feita de entrelaçamentos. Em cada palavra dessa jovem estudiosa ressoa a forte conexão com as outras: não apenas as teólogas que a precederam ou com as quais ela mantém hoje um diálogo fértil, mas também com as muitas mulheres que emergem da Bíblia, às vezes claramente, às vezes nas entrelinhas.
A reportagem é de Federica Tourn, publicada por Jesus, 09-07-2024. A tradução é de Luisa Rabolini.
A sua presença, no entanto, é irrefutável, e Bianchi adora extraí-las das páginas como pedras preciosas, para transformá-las em saber compartilhado. Foi isso que ela fez em seu último livro, recém-publicado pelas edições Paulinas, Sconosciute: 50 donne della Bibbia (Desconhecidas: 50 mulheres da Bíblia, em tradução livre). "São retratos esboçados que devem ser postos em circulação para que as pessoas entendam que, no texto bíblico, as mulheres existem, agem, têm coragem e autoridade", explica. Na realidade, Bianchi coletou muito mais do que cinquenta, porque muitas delas se movem em pares ou trios: "Nesse caso também", explica ela, "estamos diante de uma história plural, com entrelaçamentos singulares”. Como no caso de Débora e Jael, um episódio que revela a vontade de Deus de forma inesperada: Jael, uma estrangeira, mata o cananeu Sísera, inimigo de Israel, que, portanto, morre pelas mãos de uma mulher, como havia sido profetizado por Débora; e o próprio Baraque, general dos israelitas, na batalha que precede a morte de Sísera, faz com que Débora o acompanhe na batalha, porque reconhece que ela é inspirada por Deus. "Aqui estamos diante de duas mulheres que se ajudam mutuamente, e também a um homem que se sente fraco sozinho, tanto que pede o apoio de uma mulher", explica Bianchi. "É uma história estranha, repleta de violência, mas que nos faz perceber que Deus pode passar por alianças inesperadas, mesmo com um estrangeiro ou com alguém que nos parece um inimigo”.
Sconosciute. 50 donne della Bibbi, de Alice Bianchi (Foto: Divulgação)
É um testemunho de autoridade compartilhada, que muitas vezes é encontrado no relato bíblico e que também é uma prática de pensamento de gênero: reconhecer as genealogias femininas como um compartilhamento de experiências, "um alargamento da comunidade", ressalta Bianchi. "Estou ciente de que o que faço vem do trabalho das gerações que me precederam e que o fato de poder estar na Igreja de uma determinada maneira é um privilégio que as mulheres do passado não tinham, mas para mim valorizar as genealogias, mais do que uma passagem de bastão, significa unir-me a uma conversa comum”.
Um exercício de liberdade e pensamento coletivo que Alice Bianchi experimentou na Coordenação das teólogas italianas, do qual faz parte desde 2014, primeiro como estudante e depois como membro. Criada em uma família de católicos praticantes, Alice começou a frequentar a Ação Católica muito cedo - "um grande ginásio de coparticipação", lembra ela hoje - e entrou na Faculdade de Teologia da Itália setentrional, em Milão, logo após o ensino médio. Com a força e a disposição de quem depositou sua confiança no Evangelho, a teóloga não se deixou desencorajar pelas dificuldades de reconhecimento que as mulheres ainda encontram na Igreja: "Tenho a consciência de que não somos um apêndice, mas que a Igreja é a nossa casa e temos a autoridade que nos é dada pelo batismo", afirma com confiança.
"O caminho da sinodalidade inaugurado pelo Papa Francisco também é um bom sinal, porque também trata de colocar-se na escuta", acrescenta ela. "O que cada um de nós faz é importante para moldar a Igreja: até mesmo os nossos pastores veem que as mulheres não podem mais ser colocadas entre parênteses”.
Certamente, alguns bispos, enrijecidos pelo clericalismo, sentem dificuldades para "ampliar as tendas" para acolher as mulheres e os leigos porque, explica a teóloga, estão convencidos de que sua visão da Igreja é a única possível. "É uma maneira de ver o mundo que eles absorveram", explica. "O patriarcado, afinal, é isto: uma estrutura na qual até mesmo os homens, incluindo os ministros, se encontram enredados, e na qual é difícil incluir as mulheres e as diferentes masculinidades." Bianchi não se deixa abater nem mesmo pelo último "não" do Papa ao ministério diaconal para as mulheres. "O caminho não é fácil, mas a Igreja, no entanto, nos mantém nela. Aliás, melhor: ela não pode deixar de nos manter nela”.
Para o futuro, Alice Bianchi gostaria de uma Igreja capaz de repensar as paróquias, tornando-as abertas e flexíveis, para responder às exigências de uma nova geração que se desloca com frequência e que experimenta mudanças constantes. “Trabalhar em rede também significa compartilhar as competências, enriquecendo as comunidades", ressalta a teóloga. Um desejo? "Sobre a carne das mulheres, a palavra libertadora do Espírito sempre foi mais clara: eu gostaria que todos pudessem experimentar essa liberdade", responde. Se soubermos nos deixar questionar pela originalidade do Evangelho, que nos impele a experimentar com audácia novos caminhos, essa coragem se traduz em um empenho também na sociedade", acrescenta.
E a recíproca também é verdadeira: a Igreja pode e deve se deixar questionar pelas instâncias da sociedade: "Lembremo-nos de que Jesus fala em todos os lugares e nos espera na Galileia". Nascida em Brescia em 1994, ela é doutoranda em Teologia Fundamental na Pontifícia Universidade Gregoriana de Roma e leciona religião nas escolas secundárias. Ela faz parte do conselho presidencial da Coordenação das teólogas italianas (Cti) para o período 2021-2025. Leciona Introdução à teologia na escola de teologia para leigos na diocese de Brescia. Publicou: Tecla. lo mi battezzo nell'ultimo giorno (2019); La differenza che tiene in sospeso il mondo. Donne, uomini, cristianesimo (2023) e Sconosciute. 50 donne della Bibbia (2024).
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Alice Bianchi. “Não somos um apêndice. A Igreja é a nossa casa em virtude do batismo” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU