04 Outubro 2023
"A repercussão do anúncio da paralisação da usina parece não ter provocado uma reação à altura da gravidade do problema, se ele continuar a se agravar", alerta o jornalista Lúcio Flávio Pinto, em artigo publicado por Amazônia Real, 02-10-2023.
Lúcio Flávio Pinto é jornalista desde 1966. Sociólogo formado pela Escola de Sociologia e Política de São Paulo, em 1973. Editor do Jornal Pessoal, publicação alternativa que circula em Belém (PA) desde 1987. Autor de mais de 20 livros sobre a Amazônia, entre eles, Guerra Amazônica, Jornalismo na linha de tiro e Contra o Poder. Por seu trabalho em defesa da verdade e contra as injustiças sociais, recebeu em Roma, em 1997, o prêmio Colombe d’oro per La Pace. Em 2005 recebeu o prêmio anual do Comittee for Jornalists Protection (CPJ), em Nova York, pela defesa da Amazônia e dos direitos humanos. Lúcio Flávio é o único jornalista brasileiro eleito entre os 100 heróis da liberdade de imprensa, pela organização internacional Repórteres Sem Fronteiras em 2014.
A hidrelétrica de Santo Antônio, em Rondônia, a quarta maior do Brasil e a 20ª do mundo, deixou de funcionar hoje de manhã. Ao dar a informação, a empresa concessionária explicou que a paralisação da usina se devia aos baixos níveis de vazão do rio Madeira, 50% abaixo da média histórica para o período. Mas tentou minimizar os efeitos da situação, dizendo que a usina está em alinhamento com o Operador Nacional do Sistema Elétrico.
“Embora a usina tenha relevante importância para o sistema elétrico, no período de baixas vazões no rio Madeira opera com geração reduzida, podendo ser paralisada, caso os limites operativos das unidades geradoras sejam atingidos. Neste cenário, o ONS operará o sistema de forma a manter suas condições sistêmicas adequadas atuando junto aos demais agentes”, afirma o comunicado da Santo Antônio Energia enviado à Comissão de Valores Mobiliários.
Como a usina está conectada ao SIN, sua saída do sistema poderia ser compensada com outras unidades que não estejam com problemas de geração neste momento. Mesmo nesta condição, garante a Santo Antônio Energia, “o rio Madeira permanecerá seguindo seu curso natural, com passagem da vazão concentrada pelo vertedouro principal da usina, sem qualquer impacto em seu fluxo normal. Igualmente, durante este período de restrição hídrica as receitas dos contratos de venda não serão impactadas”. Mas a empresa não fornece os números que sustentam essa certeza.
Das 50 turbinas instaladas na casa de força, com potência instalada de 3.568 megawatts, 44 fornecem energia para a região sudeste do Brasil. Com extensão de 2.375 quilômetros, a mais longa do mundo, e seis para Rondônia e o Acre.
Com a força máxima, Santo Antônio pode gerar essa carga, considerada suficiente para atender 45 milhões de consumidores. Mas ao longo do ano, incluindo os meses de vazão menor, no verão, a média é de 2.424 MW. Por esse critério, é a terceira maior do país.
Essa perda menor e energia é uma das vantagens do projeto de motorização da hidrelétrica, que opera “a fio d’água”. Suas turbinas são do tipo bulbo, que funcionam mesmo com vazão menor do rio, necessitando, por isso, de reservatório muito menor do que os exigidos por hidrelétricas convencionais. Funcionam na horizontal, enquanto as grandes turbinas operam na vertical.
Em Santo Antônio, as máquinas podem funcionar até com o desnível de 9 metros. Abaixo desse limite da tomada d’água, as máquinas ficam expostas a problemas mecânicos. A hidrelétrica de Tucuruí, no Pará, precisa de uma queda pelo menos três vezes maior. Seu lago artificial, com no máximo 422 hectares, corresponde à área inundada normalmente pelo rio Madeira nos meses de maior descarga (o lago de Tucuruí possui 300 mil hectares). A relação entre área alagada e geração de energia é d as melhores em Santo Antônio: 19 MW por cada quilômetro quadrado de água no reservatório.
Desde 2021, a Santo Antônio reivindica do governo a ampliação do volume de água em seu reservatório, para elevar o nível do rio a mais de 9 metros. Só assim seria possível prevenir a redução de geração ou mesmo a paralisação completa da usina em período de estiagem mais rigorosa, como agora. O problema é que a ampliação do reservatório elevaria o nível do Madeira acima da barragem, inundando uma área adicional, alagando margens ocupadas do rio.
A queda da linha d’água, por outro lado, além de afetar a circulação de energia pelo país, eventualmente exigindo a entrada em operação de usinas térmicas, de custo maior, causarão impactos sobre a própria estrutura da barragem. No entanto, a repercussão do anúncio da paralisação da usina parece não ter provocado uma reação à altura da gravidade do problema, se ele continuar a se agravar.
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A 4ª maior hidrelétrica do Brasil deixa de gerar - Instituto Humanitas Unisinos - IHU