25 Agosto 2023
Dois caciques vinculados à Frente Sandinista de Libertação Nacional (FSLN), o seu secretário nacional Fidel Antonio Moreno Briones, e o neto do todo poderoso presidente Daniel Ortega e Rosario Murillo, comandam o futebol nicaraguense. Fidel Moreno, ex-presidente do Real Estelí, é considerado o czar desse esporte. De outro lado aparece Rafael “Payo” Ortega, eminência parda do clube Cacique Diriangén, da cidade de Diriamba.
A reportagem é de Edelberto Behs, jornalista.
As duas equipes disputaram o título nacional em 20 de maio passado e o Real Estelí venceu o adversário por 3 x 0. Fidel Moreno é também o secretário da Prefeitura de Manágua desde 2009, e detém mais poder, dizem, que a prefeita da cidade, Reyna Rueda.
Moreno é natural de Estelí, daí seu amor pelo time local. Presidiu o clube por 14 anos, desde 2004. Em 2018, foi condenado nos Estados Unidos pela Lei Global Magnitsky, quando decidiu demitir-se da instituição esportiva.
Mesmo fora da presidência, nenhuma decisão é tomada sem o seu aval. Sob sua presidência, o Real Estelí foi o time hegemônico no campeonato nicaraguense de futebol. Enquanto isso, o Cacique Diriangén passava por uma crise que ameaçou fechar o clube. Fidel Moreno, pasmem, apoiou o clube adversário “porque necessitava um oponente de categoria para que seus títulos tivessem sentido”, disse um ex-diretor do Cacique, que agora vive no exílio, ouvido pela reportagem do site Connection.
O centenário Dirigangén FC passou 12 anos sem levantar um título, quando, em 2014, Payo e empresários decidiram apoiar o clube. Entre eles, o ex-prefeito sandinista Fernando Baltodano. Em 2018, o time conquistou o título nacional.
Embora nunca presidisse o clube, Payo inovou o futebol nicaraguense, ao conseguir que atletas do Dirigangén desfilassem para mostrar a coleção “Cacique” nas passarelas de Nicarágua Diseña, plataforma de moda de sua tia Camila Ortega. Pela primeira vez, informa o portal Connectas, se viu jogadores profissionais de futebol convertidos em modelos.
O futebol não é o principal desporto na Nicarágua, mas conta com aficionados nas cidades que têm clubes disputando o campeonato nacional. As dez equipes da Primeira Liga recebem recursos públicos das respetivas prefeituras ou da polícia.
O futebol passou a ser usado pelos políticos. Em conquistas do Dirigangén, Payo recorreu ao mote do avô no governo: “Vamos para mais vitórias!” Empresas públicas estatais – a Empresa Portuária Nacional e a Empresa Nicaraguense de Eletricidade - apoiam financeiramente o clube.
Entrevistado por Connectas, o ex-dirigente do Cacique não acredita que Fidel Moreno e Payo Ortega façam investimentos milionários sem a vênia dos ditadores Daniel e Rosario. “Nesse país não se move uma folha sem a vontade deles. E a eles convém que haja espetáculos, fiéis à máxima romana de dar ao povo pão e circo para que se esqueçam da carestia de vida, das perseguições políticas e das violações dos direitos humanos”, disse o entrevistado.
A manutenção do plantel do clube de Payo, o mais caro da liga, custa 950 mil euros por ano (cerca de 5,10 milhões de reais). Mesmo com todo esse interesse político, a seleção nacional foi expulsa da Copa Ouro, campeonato entre países do Norte e América Central, por ter incluído o jogador uruguaio Richard Rodríguez na equipe, naturalizado de forma irregular pelo Real Estelí, clube de Moreno. O time caiu para a série B.
O cronista Miguel Mendoza, expatriado nos Estados Unidos depois de expulso da Nicarágua junto com outros 221 presos políticos pelo regime ditatorial de Ortega, responsabilizou Fidel Moreno pela expulsão da Nicarágua da Concacaf, “há anos usando dinheiro corrupto para nacionalizar jogadores”, que sequer entende o regulamento “ou talvez esteja acostumado a fazê-lo sem respeitar as regras”.
Fidel Moreno e Payo não são as únicas fichas do sandinismo envolvidos no futebol nicaraguense, mas os que contam com mais recursos e, consequentemente, maior poder nos clubes.
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O futebol entra em campo na arena política nicaraguense: pão e circo! - Instituto Humanitas Unisinos - IHU