19 Julho 2023
"Nunca é demais lembrar que a remediação dos solos e das águas é complexa e pode custar caro, como por exemplo, as extensas áreas contaminadas por mercúrio pela atividade predatória, ilegal e criminosa, como vem ocorrendo na Amazônia e invadindo território Yanomani", escreve Heraldo Campos, graduado em geologia (1976) pelo Instituto de Geociências e Ciências Exatas da Universidade Estadual Paulista – UNESP, mestre em Geologia Geral e de Aplicação (1987) e doutor em Ciências (1993) pelo Instituto de Geociências da Universidade de São Paulo – USP. É pós-doutor (2000) pelo Departamento de Ingeniería del Terreno y Cartográfica, Universidad Politécnica de Cataluña – UPC e pelo Departamento de Hidráulica e Saneamento, Escola de Engenharia de São Carlos, USP (2010).
“Lá vem o homem da gravata florida / Meu Deus do céu, que gravata mais linda / Que gravata sensacional / Olha os detalhes da gravata / Que combinação de cores / Que perfeição tropical” [1]
Lamentavelmente, essa “perfeição tropical”, da divertida e esperançosa canção de Jorge Ben dos anos 70 do século passado, é difícil de ser atingida em nosso país na vital área do meio ambiente porque esteve no comando, de 2019 a 2022, um governo fascista e destruidor. Todavia, a restauração dos ecossistemas não é impossível, pode demorar, mas requer atenção 24 horas por dia do poder público, para que não ocorram retrocessos. Só para lembrar, desse nosso triste passado recente, uma pergunta: “Quem deu a senha que iria abrir as pernas para a grilagem de terras? Aí aconteceram as queimadas criminosas na Amazônia. Foi por acaso?” [2]
Para completar, as outras perguntas que se faziam nessa época nefasta, diante das avalanches de fake news que rolavam pelo noticiário, promovidas pelo governo de plantão, eram: “[...] quem é que está querendo tirar a água da Amazônia, se é o próprio governo que patrocina, descaradamente, o desmatamento e a queimada da vegetação para a grilagem de terras da indefesa floresta? É muita cara de pau dessa gente de verde, de branco e de azul, vir com um discurso patriótico sem entender que a aniquilação da Amazônia, como eles vêm fazendo, vai acabar também com os “rios aéreos” ou os “rios voadores” que são as imensas massas de vapor água que se deslocam para a região sudeste e vão recarregar o Aquífero Guarani. Será que adianta, mais uma vez, os cientistas explicarem isso para essa gente dos quartéis e seus associados ou essa política ambiental predatória vai terminar matando a Amazônia?” [3]
“Nunca é demais lembrar que a remediação dos solos e das águas é complexa e pode custar caro, como por exemplo, as extensas áreas contaminadas por mercúrio pela atividade predatória, ilegal e criminosa, como vem ocorrendo na Amazônia e invadindo território Yanomani. Então, como devemos proceder diante dessa agressão ao meio ambiente? Espera-se que esses invasores da Amazônia que há tempos vêm desmatando, queimando, grilando, garimpando e contaminando seus solos e águas sejam devidamente identificados, responsabilizados e punidos de acordo com a lei. Mesmo que a legislação permita a destruição do maquinário para extração do ouro em território Yanomami, sob a alegação de que a retirada dessas áreas invadidas seria “inviável do ponto de vista logístico”, será que uma vez identificados os responsáveis não caberia a eles a responsabilização pela retirada desses equipamentos?
Não seria uma solução razoável a transferência para outras áreas mais distantes da região Amazônica desses equipamentos (motores e bombas), onde poderiam sofrer adaptações e reaproveitados na captação de água, como em regiões mais carentes desse recurso? O Semiárido Brasileiro, que se estende por nove estados da região Nordeste e também pelo norte de Minas Gerais, poderia ser uma dessas áreas de transferência. Outros equipamentos, como tratores e escavadeiras poderiam ser confiscados e utilizados na etapa de escavação para remediação das áreas contaminadas, por exemplo. Uma vez que esses equipamentos entraram na floresta Amazônica, por terra, água ou ar devem, pela lógica, conseguir sair do mesmo jeito e a conta com esses custos deve ser debitada aos invasores além, obviamente, da recuperação das áreas degradadas com a descontaminação do mercúrio nos solos e nas águas, incluindo a recuperação da floresta com árvores nativas.
Por outro lado, como existe a preocupação social com o grande contingente de garimpeiros que atuaram no garimpo ilegal e predatório - que de certa forma ficaram “deslocados do mercado de trabalho” - aqueles que não são os mandantes e sem antecedentes com a justiça poderiam ser reaproveitados como mão de obra no replantio da vegetação retirada, desde que devidamente cadastrados junto aos órgãos fiscalizadores e monitorados, controlados e vigiados nessa importante etapa de recuperação das áreas degradadas.” [4] Porém, parece que as coisas estão começando a mudar e, ao mesmo tempo, trazendo a esperança de que uma política ambiental voltada para a maioria da população prevaleça, com a recente notícia: “Depois de quatro anos, o governo federal voltou a usar imagens de satélites para suspender – à distância – atividades que causam danos ao meio ambiente. São os chamados embargos ambientais. Imagens de satélite revelaram quase dois mil hectares desmatados sem autorização, no ano passado, desrespeitando a reserva legal. Os agentes do Ibama embargaram a área no fim de junho e multaram o proprietário em mais de R$ 9 milhões.” [5]
“Desistir? Eu já pensei seriamente nisso, mas nunca me levei realmente a sério. É que tem mais chão nos meus olhos do que cansaço nas minhas pernas, mais esperança nos meus passos do que tristeza nos meus ombros, mais estrada no meu coração do que medo na minha cabeça” - Cora Coralina.
[1] Trecho da canção “O homem da gravata florida” de Jorge Ben do disco “A Tábua de Esmeralda” de 1974.
[2] Trecho do artigo “Estilingues do amor”.
[3] Trecho do artigo “Matando a Amazônia”.
[4] Trecho do artigo “Mercúrio que mata”.
[5] Trecho da matéria “Embargos ambientais: governo federal volta a usar imagens de satélites para suspender atividades de impacto ambiental”.
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Gravata florida. Artigo de Heraldo Campos - Instituto Humanitas Unisinos - IHU